O substitutivo do senador José Pimentel (PT-CE) ao Projeto de Lei do Senado (PLS) 219/2013, de Aécio Neves (PSDB-MG), que prevê o aumento no período de internação do menor infrator, foi aprovado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal na última quarta-feira (3).
Atualmente, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê que a internação do menor não pode ultrapassar os três anos, ocorrendo a liberação compulsória do infrator aos 21 anos de idade. Pelo projeto, a internação poderia ser de até oito anos, com liberação compulsória aos 26 anos de idade. A aplicação valeria para condutas previstas na lei 8.072/1990, conhecida como Lei dos Crimes Hediondos.
Para o advogado e professor de processo penal do Centro Universitário Curitiba (Unicuritiba) Alexandre Knopfholz, soa “esquizofrênico” pensar em aplicar o ECA, dispositivo pensado para crianças e adolescentes, a pessoas de 26 anos. Knopfholz explica que o limite de 21 anos da redação atual do estatuto existe porque, quando a lei foi promulgada, em 1990, ainda estava em vigor o Código Civil de 1916, que previa que o indivíduo só estaria habilitado para todos os atos da vida civil aos 21 anos de idade.
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Ao professor também parece que a proposta é uma tentativa de se desvencilhar da questão da maioridade penal, que, na visão de Knopfholz, é mais complicada. “Isso [o projeto] é uma tentativa de driblar essa discussão sem colocar o dedo na ferida, sem dizer ‘vamos discutir a maioridade’”. Para o advogado, aumentar, simplesmente, o prazo de duração de um internamento previsto em uma legislação feita para adolescentes não resolve o problema.
Mayta Lobo, professora de Direito da Infância e Juventude do Centro Universitário Unibrasil e do Curso Professor Luiz Carlos, considera que o projeto de lei é uma resposta ao grupo da sociedade que clama por mais punição por meio da redução da maioridade penal. Ela não descarta o aumento do período de internação como alternativa, mas, ressalta que a questão das medidas socioeducativas é mais qualitativa do que quantitativa. Além disso, a professora aponta que, hoje, dificilmente jovens ficam três anos nas unidades de internação devido à falta de estrutura; com a superlotação, é preciso ter rotatividade diante da grande demanda.
Segundo Mayta, o grande desafio é que as medidas devem ter caráter pedagógico e não punitivo. “Na prática não se tem programas que pensam em mudança de comportamento e aprimoramento pedagógico e social”, diz Mayta. Na dela, o ECA é muito adequado e pertinente para lidar com menores infratores, “especialmente no que diz respeito a peculiar a fase de desenvolvimento”. O problema é a falta de resposta da sociedade e do Estado. “O ECA é tão bom que não condiz com a realidade”. Para que o Estatuto tivesse efetividade, ela defende que existam realmente atividades que preparem os jovens infratores para a reinserção na sociedade.
Outro ponto que poderia ser discutido do novo projeto é que, com a mudança, o ECA poderia se tornar mais duro que o próprio Código Penal, uma vez que alguns dos crimes hediondos, como o estupro, têm pena mínima inferior a oito anos. O projeto, porém, prevê que o adolescente infrator não poderá receber pena maior do que a conferida a adulto.
Knopfholz, avalia com bons olhos outra parte da proposta, que prevê penas mais duras a quem aliciar menores para cometer crime. Também legislado pelo ECA, o crime de corrupção de menores tem pena de reclusão que varia de um a quatro anos. Já o projeto que tramita no Senado estabelece pena de três a oito anos, podendo dobrar para quem corromper menor de idade nos casos de crimes hediondos.
O professor do Unicuritiba acredita que essa modificação está dentro do viés constitucional de proteção integral à criança e ao adolescente. Na visão do advogado, quando um criminoso usa uma criança para se proteger de uma possível condenação criminal, a ideia de proteção prevista na Constituição Federal é totalmente desvirtuada. “Acho que podemos dizer até que a culpabilidade de um indivíduo desses é mais elevada”, opina.
Mayta também vê essa medida como positiva, pois o aumento da pena, na opinião dela, seria um desestímulo aos corruptores.
O senador Aécio Neves (PSDB-MG), ao defender a aprovação do projeto em nota, afirma que a iniciativa “traz uma conexão com a contemporaneidade”, pois a criminalidade é crescente no Brasil. “O que buscamos é agravar de forma dura, clara, os crimes para aqueles que utilizam menores de idade para o cometimento dessas infrações”, disse o parlamentar.
O projeto ainda estabelece que adolescentes internados tenham garantidos o ensino fundamental, médio e profissionalizante, e que o jovem possa trabalhar em locais externos, desde que a Justiça autorize.
O texto também garante defesa técnica às crianças e adolescentes por defensor público em todas as fases do procedimento de apuração do crime e durante o cumprimento da internação, e dá prioridade de tramitação a inquéritos policiais e ações penais que tenham criança ou adolescente como vítima de homicídio.
Já quem facilitar a fuga de adolescente ou jovem em cumprimento de medida socioeducativa poderá ter como pena prisão um a quatro anos.
Colaborou: Mariana Balan.
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