A criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) vinculada à presidência da República fere a autonomia e a independência funcional, dizem especialistas. A Medida Provisória 869 que cria o órgão e a altera a Lei nº 13.709/2018 avançou no Congresso.
O principal ponto de debate está relacionado ao art. 55-A . O texto define a ANPD como órgão da administração pública federal. De acordo com a proposta, que foi alterada por emenda parlamentar, “a vinculação da ANPD à presidência da República é transitória e terá sua natureza reavaliada pelo Poder Executivo” – o que pode tornar a ANDP em uma autarquia, no prazo de dois anos, a critério do Executivo.
A alteração, incluindo a vinculação transitória, foi feita após a apresentação de sete emendas apresentadas pelos parlamentares. Outras sete emendas sugeriram vincular o órgão ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, de Sérgio Moro, ou da Economia.
Para o professor de direito eletrônico do Centro Universitário Curitiba (Unicuritiba) Charles Emmanuel Parchen, a vinculação da ANPD à presidência da República precisa ser revista para garantir a efetividade da lei.
“É uma questão que preocupa bastante, na medida em que a ANPD precisa ter seus próprios poderes. A grande questão é como garantir a independência e a autonomia do órgão, ser livre de nomeações a cargo da presidência. Entendo que ela [ANPD] deve ser composta por técnicos, não por indicações políticas”, afirma.
Parchen revela que nos próximos anos deve haver embate da ANPD com empresas que operam na internet e que a independência vai ser fundamental. “Como que a autoridade vai exigir das grandes corporações, como Google, Facebook, Whatsapp, que se comportem como a norma manda”, questiona.
Proteção de dados no âmbito internacional
Para a advogada e especialista em Privacidade e Proteção de Dados Marcela Joelsons, quanto menor a influência política e maior independência à ANPD, melhor para o Brasil perante outros países.
“Não vai haver segurança igual temos em outros países. A legislação europeia exige que a legislação tenha o mesmo nível de segurança para negócios, e isso pode afetar questões econômicas. Se considerar que o Brasil não tem essa segurança, a lei pode se tornar inócua”, explica.
A advogada reforça que alterações devem ser feitas para que a lei seja, de fato, reconhecida no âmbito internacional, com mais autonomia envolvendo o Brasil.
“Da forma como ficou, não está satisfatória, principalmente para os empresários. A lei é extremamente técnica, complexa. Não dá total independência, e isso vai contra as legislações internacionais. É importante que realmente tenha autonomia para atuar no setor público e no privado, para fiscalizar, sem vinculações políticas”, alerta.
A MP 869, retirada da pauta da Câmara dos Deputados no dia 22 de maio, tem prazo para deliberação até 3 de junho. Para ser aprovada, a MP precisa de maioria simples. Depois, segue para o Senado para ser analisada. Se não for alterada, é encaminhada direto para sanção do presidente Jair Bolsonaro.
O presidente tem a prerrogativa de vetar o texto parcial ou integralmente, caso discorde de eventuais alterações feitas no Congresso. Pela Constituição, a MP é competência exclusiva do chefe do Executivo.
Direito fundamental
A proteção de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, pode ser considerada como direito fundamental a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no país. A CCJ (comissão de Constituição e Justiça) do Senado aprovou uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que altera o Art. 5º. A matéria aguarda votação em plenário.
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