É fácil escrever um textão na internet após sentir-se maltratado por uma empresa ou serviço. Mas antes de deixar-se levar por instintos viscerais, é melhor respirar fundo e colocar a inteligência em ação: exagerar na reclamação, com requintes de ironia e detalhes mal contados e sem provas, pode custar uma indenização por danos morais ou outros tipos de sanções. Se o consumidor falar a verdade, por outro lado, e puder comprovar a afirmação, só será condenado se extrapolar na linguagem e abusar do direito.
“Quando alguém alerta os outros consumidores que um determinado fornecedor comete práticas irregulares está cumprindo uma obrigação cidadã e não pode ser censurado por isso”, afirma Antonio Carlos Efing, presidente da comissão de consumidor da OAB-PR e professor da PUCPR. “Agora, é preciso ter a cautela de divulgar apenas aquilo que é passível de ser provado, melhor não comunicar aquilo que não se tem certeza”, alerta.
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Se o post ou mensagem não forem verdadeiros, os consumidores podem ser processados por diferentes leis, dependendo do conteúdo. Uma das responsabilidades previstas é a ofensa objetiva à honra da empresa, ao fazer afirmações sem poder comprovar. Isso porque o Código Civil, no artigo 52, prevê a possibilidade de aplicar às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos de personalidade.
“Em um excesso na reclamação de um consumidor, o que pode ser afetado na pessoa jurídica é a honra objetiva, como ela é vista no mercado de consumo, porque dependendo do ‘meme’ que se faz, da foto que se publica, a imagem da empresa pode ser afetada injustamente”, explica Fernanda Schaefer, professora de Direito do Consumidor no Unicuritiba. Caso algum funcionário seja injustamente citado, o consumidor poderá ser condenado ainda a pagar indenização por danos morais.
Em alguns casos, a partir do que foi escrito, os consumidores também podem sofrer um processo penal, pelos crimes de calúnia, difamação ou injúria (artigos 138, 139 e 140 do Código Penal).
Como reclamar sem correr risco
Para evitar problemas futuros com a Justiça, sem deixar de alertar outros consumidores sobre um péssimo serviço, é preciso ater-se aos fatos, evitando subjetivismos, hipérboles, insultos ou zombarias. “É melhor apenas relatar a situação, ‘comprei tal coisa e não foi entregue um mês depois do prazo’”, ensina Schaefer. “O que extrapola seria generalizar, dizer mentiras ou frases do gênero ‘nesse local só tem pilantra’ ou são ‘um bando de ladrões’”, exemplifica.
E a mentira tem mesmo pernas curtas: muitas vezes é fácil mostrar que o consumidor não tem razão, apenas se confundiu ou age de má-fé. “Há várias condenações na Justiça porque o consumidor é desmascarado agindo de má-fé”, afirma Schaefer. “Então, por mais que situações de consumo sejam constrangedoras ou difíceis, existem limites para a liberdade de expressão e manifestação do pensamento, direitos tão importantes quanto os outros, nem sempre o cliente tem razão”.
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Em relação às provas de um fato, se no direito do consumidor elas recaem sobre o fornecedor – que deve demonstrar a culpa exclusiva da vítima, a não existência do serviço ou da contratação, etc. –, com relação às ofensas o ônus da comprovação muda de lado. “Se alguém afirma que outro cometeu um fato criminoso, terá de provar; se não pode provar, pode ser condenado”.
Na era da pós-verdade e da rapidez na divulgação de notícias, é sempre bom lembrar que quem espalha informações falsas ou boatos é facilmente encontrado. Além disso, uma simples cópia da tela do computador ou do celular já comprova a ação. E, para quem lê, sempre é bom olhar com juízo crítico já que, algumas vezes, um post ácido pode ser fruto de chantagem ou de um concorrente.
Todas essas precauções, por outro lado, não devem coibir o consumidor divulgar uma informação de interesse público. “Temos um mercado de consumo altamente competitivo e o que distingue um fornecedor de outro, às vezes, são pequenas medidas, como essa, responsabilidade com seus clientes, com o meio ambiente, com a sociedade. Quando alguém se organiza para punir um mau fornecedor, agindo de boa fé, ao contrário de ser censurável, é muito elogiável”, insiste Efing.
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