No Brasil, 41% da população com mais de 18 anos está inadimplente, segundo dados do Serasa Experian. Ou seja, 60 milhões de brasileiros têm contas em atraso. Mas o que acontece com as dívidas se o devedor morre?
Apesar do sofrimento causado pela perda de um parente, as questões burocráticas decorrentes da morte não podem ser deixadas de lado. Por isso, é importante saber que os herdeiros têm a obrigação de quitar as dívidas deixadas pelo falecido. A “herança de dívida”, contudo, tem limites, pois o herdeiro nunca vai precisar mexer no próprio bolso para pagar as contas do falecido (“de cujus”, no Direito). Ficou confuso? Não é difícil entender.
Advogado especializado em direito civil, Leopoldo Santana Luz explica que assim que a pessoa morre inicia-se, automaticamente, o espólio. A figura nada mais é que o conjunto de bens, direitos e obrigações do falecido, como se fosse uma “empresa” com patrimônio próprio, principalmente porque os deveres de uma pessoa não acabam, simplesmente, após a morte. Se a pessoa tem dívidas, é o espólio que vai responder por elas.
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E, por mais que os herdeiros façam a gestão do espólio, como se fossem “sócios”, eles ainda não possuem total direito sobre os bens deixados. Isso só acontece no momento da partilha, que extingue o espólio e é realizada ao final do processo de inventário. O inventário é a relação do patrimônio do falecido. A divisão do patrimônio, aliás, só pode ser feita após o pagamento de todos os credores daquele que morreu, sendo necessário, na petição inicial de inventário, declarar não somente os bens do de cujus, mas as dívidas e demais obrigações deixadas.
Santana Luz salienta, porém, que o pagamento deve respeitar o limite do espólio, conforme prevê o Código Civil. Por exemplo, se o patrimônio deixado foi de R$ 500 mil e havia R$ 300 mil em dívidas, o valor da conta será retirado diretamente do espólio e os R$ 200 mil restantes serão divididos entre os herdeiros. Agora, se o valor em dívidas for superior ao patrimônio deixado pelo falecido, quem sairá no prejuízo são os credores, pois não é possível fazer partilha de dívida.
“Enquanto o espólio for positivo em termos de bens, as dívidas devem ser honradas. Se chegou a um estado de iliquidez – ou seja, gastou tudo –, o espólio é considerado insolvente, e essa insolvência não alcança os herdeiros”, explica o advogado.
Mas, como o direito não é uma ciência exata, existem situações excepcionais em que uma dívida poderia ser cobrada diretamente dos herdeiros, após a partilha. Por mais que os juízes tomem o cuidado de realizar a partilha somente quando não há mais dívida, é possível que após a distribuição dos bens apareça um credor do falecido que não era conhecido dos herdeiros. Aqui, o credor pode se voltar contra os herdeiros na cobrança da conta.
Como o espólio paga as dívidas?
É o gestor do espólio que vai realizar o pagamento das dívidas do falecido. Trata-se do inventariante, herdeiro nomeado para administrar os bens da herança. E essa gestão não pode ser feita de “qualquer jeito”, uma vez que os outros herdeiros, caso o inventariante não cumpra com todas as suas obrigações, podem responsabilizá-lo em uma ação própria. Isso porque o inventariante é responsável civil e criminalmente por todas as declarações que disser.
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Para que não corram juros, o inventariante deve pagar as dívidas do falecido antes mesmo de concluído o processo de inventário, na ordem do vencimento. Para tanto, é preciso conseguir uma autorização do juiz, após ser ouvido pelo Ministério Público.
“O inventariante deve pedir uma autorização antecipadamente e prestar explicações [à Justiça e aos outros herdeiros]. Cabe ao juiz deferir um alvará para que o herdeiro retire o dinheiro ou venda um bem visando ao pagamento do credor, após constatar que a situação não é contrária à lei, tampouco prejudica os outros herdeiros ou terceiros”, esclarece Santana Luz.
Dívidas que se extinguem com a morte
É possível, contudo, que algumas dívidas se extingam com a morte do devedor, desde que haja previsão em contrato. O advogado conta que isso é muito comum nos financiamentos de imóveis, pois geralmente envolvem um seguro, que pagará o órgão de financiamento no caso de morte do comprador. Nesse caso, o imóvel será quitado automaticamente e poderá entrar na partilha de bens.
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Em relação ao empréstimo consignado, aquele cujas parcelas são deduzidas diretamente da folha de pagamento, a jurisprudência entende que também se extingue com a morte do mutuário. Muito porque os juízes consideram que se mantém em vigor o que previa a Lei 1.046/50, já que a legislação mais recente que trata do crédito consignado, a Lei n. 10.820/03, não regulou a hipótese de falecimento daquele que recebe o empréstimo.
Esse cenário, no entanto, refere-se a funcionários regidos pela CLT. No caso de funcionários públicos, a Justiça tem entendido que o consignado não se extingue com a morte do servidor, a não ser que o contrato tenha sido firmado com seguro que faça menção explicita a casos de falecimento. Saiba mais aqui.
Conheça a lei
Código Civil
Art. 1.792. O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança; incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se houver inventário que a escuse, demonstrado o valor dos bens herdados.
Lei n. 1.046/50
Art. 16. Ocorrido o falecimento do consignante, ficará extinta a dívida do empréstimo feito mediante simples garantia da consignação em folha.
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Colaborou: Mariana Balan
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