| Foto: Flickr/Kate Ter Haar/Reprodução

Na última segunda-feira (12), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli, relator do Recurso Extraordinário (RE) 1.010.606, que trata do direito ao esquecimento,  ouviu a exposição de diversos especialistas no tema. Ou caso, sobre o qual o tribunal vai analisar a possibilidade de aplicação do direito ao esquecimento à esfera cível, levou à realização de uma audiência pública. Representantes da imprensa, acompanhados por advogados do Google e do Yahoo, foram unânimes em condenar o reconhecimento de um direito ao esquecimento que afete o direito à informação (entenda o caso). Outros especialistas defenderam a existência desse direito, com base na proteção da dignidade humana, da honra e da vedação a penas perpétuas. 

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A advogada Taís Borja Gasparian, representante da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), que é amicus curiae (amigo da corte) no processo, afirmou que o caso diz respeito à liberdade de informação. “Entendo a dor da família, mas há valores maiores que devem ser defendidos pelo STF. A pretensão no recurso é censura”, disse na audiência. 

Gustavo Binenbojm, professor da Faculdade de Direito da Universidade do Rio de Janeiro (UERJ) e representante da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), afirmou que a Constituição Federal não reconhece um direito ao esquecimento como se fosse “uma espécie de direito à amnesia coletiva, o direito à queima dos arquivos da sociedade”. 

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“O direito à informação envolve também fatos pretéritos. A veiculação, a discussão, a crítica sobre fatos passados é matéria essencial para a construção da memória coletiva e da historiografia social, como aliás assegurada também na Constituição nos artigos 215 e 216”, disse ainda. 

O representante da Associação Nacional de Jornais (ANJ) e da Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner), Daniel Sarmento, que é professor de Direito Constitucional, disse que “o reconhecimento do direito ao esquecimento é um limite à liberdade de expressão, de informação e de imprensa” e que o STF precisa estabelecer um “parâmetro claro, impedindo que um suposto direito ao esquecimento seja invocado para impedir divulgação e discussão de fatos verídicos, apenas porque acontecidos no passado”. 

Google e Yahoo 

O representante da Google Brasil, Marcelo Leonardi, afirmou que o direito ao esquecimento é desnecessário no Brasil, porque o Judiciário já tem à disposição os parâmetros adequados para lidar com colisões entre direitos fundamentais, como privacidade e liberdade de expressão. Para Leonardi, o reconhecimento de um “suposto” direito ao esquecimento seria abrir as portas para a censura. 

“Afastar esse sopesamento entre direitos fundamentais e defender uma preponderância presumida da privacidade de modo genérico, que me parece ser o objetivo aqui, é utilizar esse direito ao esquecimento como pretexto para todo pedido de remoção”, afirmou Leonardi. 

O representante do Yahoo do Brasil, André Zonaro Giacchetta, lembrou ainda que a questão discutida não abrange somente conteúdos jornalísticos, mas a liberdade de expressão do cidadão comum, que pode querer fazer menção a fatos pretéritos quando fala ou opina. 

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Outro lado 

A OAB-SP, representada pelo advogado Coriolano Aurélio de Camargo Santos, presidente da Comissão de Direito Digital e Compliance da entidade, afirmou que a OAB paulista reconhece o direito ao esquecimento como um direito constitucional que precisa ser defendido pelo STF. O advogado defendeu ainda que materiais que provoquem angústias e aflições nas famílias, atingindo sua esfera íntima, precisam ser retirados das redes sociais. 

Cíntia Rosa Pereira de Lima, professora da Faculdade de Direito da USP de Ribeirão Preto, que fez seu pós-doutorado na Itália sobre o tema, afirmou que o direito ao esquecimento “é um direito autônomo de personalidade por meio do qual o indivíduo pode excluir ou fazer com que essas informações não sejam acessadas de forma trivial” e que sua aplicação deve ser feita caso a caso pelo STF, evitando-se um entendimento “amplo” e “vago”. 

“Também não se pode pretender com o direito ao esquecimento reescrever a história ou alterar a verdade dos fatos, não é isso que se busca”, disse ainda. Para a professora, o objetivo do reconhecimento desse direito é “não ter a identidade de um determinado indivíduo estigmatizada por fatos ocorridos no passado e que deixaram de ter uma relevância pública”. 

Representando o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), o advogado Gustavo Mascarenhas Lacerda Pedrina afirmou que o direito à informação não pode sobrepor-se aos demais direitos constitucionais, como a intimidade, a honra e a dignidade. Além disso, o advogado defendeu a ideia de que, cumprida a pena, o fato criminoso precisa ser esquecido pela sociedade, já que a Constituição Federal veda penas de caráter perpétuo. 

“Passados cincos anos do cumprimento ou extinção da pena, os agentes envolvidos, quer sejam vítimas, familiares, ou os próprios ofensores, desde que manifesta vontade, não podem ser alvos de novas reportagens jornalísticas ou documentais ligadas aos fatos, devendo os buscadores de internet e motores de busca verem-se obrigados a deixar de indexar novos links quando atingido esse marco temporal”, afirmou Pedrina. 

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Entenda o caso

A ação que chegou ao STF foi ajuizada pelos irmãos de Aida Curi -- assassinada no Rio de Janeiro em 1958 -- contra a Rede Globo de Televisão, pela reconstrução do crime no programa “Linha Direta”, em 2004.

Nos idos de 1958, o brutal assassinato despertou muita curiosidade e cobertura da imprensa brasileira, inclusive porque um dos assassinos era menor de 18 anos e acabou inocentado. Os outros dois acusados, um dos quais porteiro do prédio para onde Aida foi arrastada à força, foram condenados por um júri popular. 

Aida foi violentada pelos três homens dentro do edifício Rio Nobre e jogada de cima do prédio, que fica na famosa Avenida Atlântica, no bairro de Copacabana, no Rio de Janeiro. Os criminosos tentaram simular seu suicídio.

Com informações da assessoria de imprensa do STF

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