O órgão de gestão de pessoas do STF (Supremo Tribunal Federal) contrariou uma medida provisória do presidente Jair Bolsonaro (PSL) e recomendou o desconto de taxas sindicais nos salários dos servidores da corte.
Desde 1º de março, a MP, também assinada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, proíbe descontos em contracheques em favor de sindicatos. A regra tem força de lei. A medida obriga o pagamento de mensalidades e contribuições aprovadas em assembleias por boleto bancário. Um despacho do STF de 14 de março afirma, porém, que o recolhimento poderá ser feito na folha de pagamento.
A recomendação é administrativa. Judicialmente, a MP é questionada por ADIs (Ações Diretas de Inconstitucionalidade) no próprio Supremo. Sob relatoria do ministro Luiz Fux, a matéria ainda aguarda julgamento.O documento do STF é assinado por Valmi Alves de Sousa Ferreira, gerente substituto da Assessoria de Legislação de Pessoal; Valcicles Geraldo Guerra, coordenador de Registros Funcionais e Pagamento; e Alda Mitie Kamada, secretária de Gestão de Pessoas.
Na recomendação feita à Direção-Geral do STF, os gestores afirmam que sindicatos e associações terão de arcar com os custos do processamento da cobrança feita em folha de pagamento.
A MP de Bolsonaro e Guedes, além de alterar a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), revogou um dispositivo do Estatuto do Servidor Público Civil Federal que autorizava descontos sem ônus para as entidades. O objetivo, segundo o governo, é diminuir a judicialização e retomar o caráter voluntário da contribuição. O imposto sindical deixou de ser obrigatório com a reforma trabalhista de Michel Temer (MDB).
Segundo Ferreira, Guerra e Kamada, outro artigo do mesmo estatuto permite o recolhimento de mensalidades e contribuições desde que o servidor concorde e o sindicato arque com os custos do processamento da cobrança. "Mediante autorização do servidor, poderá haver consignação [desconto] em folha de pagamento em favor de terceiros, a critério da administração e com reposição de custos, na forma definida em regulamento", diz o parágrafo 1º do artigo 45 do estatuto.
Questionada pela reportagem desde quinta-feira (28), a Direção-Geral da corte não informou se vai acatar a recomendação. Em nota, o órgão apenas afirmou que "a orientação administrativa no STF é no sentido da cobrança das entidades sindicais e associativas pela consignação [desconto] das contribuições no contracheque" do servidor.
O documento de Ferreira, Guerra e Kamada diz que serão beneficiados pela medida o Sindjus/DF (Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário e do Ministério Público da União no Distrito Federal) e a Astrife (Associação dos Servidores do Supremo Tribunal Federal). As entidades terão de firmar contratos com a empresa responsável pelo processamento da folha. "Tal procedimento cessará o ônus para o STF com o custo de processamento de consignações", afirmam os gestores.
Ferreira, Guerra e Kamada ainda sugerem que a cobrança seja implementada a partir de abril. Não haveria, segundo eles, tempo hábil para efetuar as mudanças em março, pois a folha fechou no dia 18. De acordo com eles, o custo para "março de 2019 é irrisório". "O processamento passa a ser automático nos meses seguintes, não se vislumbrando prejuízo para o Tribunal com não cobrança neste mês", afirmam. O Supremo tem mais de 1.700 servidores.
Com essa recomendação, a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), autora de uma das ADIs contra a MP, pede que Fux conceda liminar. A entidade quer suspender o efeito de toda a medida provisória.Para virar lei, a MP precisa ser votada em até 120 dias no Congresso Nacional. Por mês, sindicatos de servidores federais perderão R$ 65,5 milhões.
Uma nota informativa do Ministério da Economia de 13 de março mostra que a medida provisória de Jair Bolsonaro (PSL) e de Paulo Guedes, titular da pasta, implicará o corte do repasse de R$ 65,5 milhões por mês para sindicatos e associações. As informações são referentes a janeiro deste ano. Segundo dados cadastrados no Siape (Sistema Integrado de Administração de Pessoal), são 546 entidades que hoje recolhem mensalidades sindicais diretamente da folha de pagamento, sem ônus.
De acordo com a nota informativa assinada por Samuel Farias Milanez, coordenador-geral substituto de Acompanhamento da Folha, e César Marmore Rios Mota, diretor substituto de Remuneração e Benefícios, os órgãos federais devem atender a MP e cortar os repasses às entidades. O ministério determinou ainda que o Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados) "deverá providenciar, de imediato, a notificação dos sindicatos informando sobre a realização dos distratos dos contratos vigentes, no prazo de 30 dias a contar do recebimento dos correspondentes expedientes, em observância a cláusula contratual".
O Serpro irá romper os contratos que garantem o desconto de mensalidades de servidores públicos filiados a sindicatos ou associações a partir do dia 18 de abril. Essa informação consta de notificação de rescisão contratual expedida pelo órgão federal encaminhada aos sindicatos representantes de servidores civis federais de todo o país. O documento é de 18 de março. Com a medida, os sindicatos terão de adotar o recolhimento das mensalidades e das contribuições gerais definidas em assembleias por boleto ou outro equivalente eletrônico.