Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) retomam nesta quinta-feira (23) o julgamento sobre a criminalização da homofobia. A última vez que o Supremo esteve reunido para discutir o assunto foi no dia 21 de fevereiro.
Na ocasião, o julgamento foi encerrado com quatro votos reconhecendo a omissão do Poder Legislativo em criar legislação que proteja a população LGBT e favoráveis à equiparação da homofobia e da transfobia ao conceito jurídico de racismo.
Em resposta a uma notificação do Senado Federal endereçada ao tribunal, os ministros do STF aproveitaram para reagir aos pedidos de impeachment contra membros da corte. Celso de Mello, Edson Fachin, Roberto Barroso e Alexandre de Moraes foram alvo de um pedido de impeachment coletivo em fevereiro, por terem votado a favor da criminalização da homofobia. O presidente do tribunal, Dias Toffoli, chegou a dizer que estava inclinado a sugerir a retirada de pauta das ações, mas mudou de ideia quando foi lembrado do fato por Celso de Mello.
Mello lembrou que os quatro ministros foram denunciados por “suposto” crime de responsabilidade. “Falta de decoro não tem aplicação ao caso”, afirmou. “Na independência dos juízes reside a independência da magistratura, e sem juízes independentes não há cidadãos livres […] A intolerância foi ‘processualizada’ perante o Senado Federal por essa absurda denúncia, simplesmente por quatro juízes exercerem seu dever jurisdicional”, disse ainda.
O ministro Fux também foi duro na resposta. “É um ato atentatório à dignidade da jurisdição. Se, por esse motivo [criminalizar a homofobia], a corte tiver que sofrer algum tipo de retaliação, que soframos todos nós”, disse o ministro. “Se esse requerimento não tivesse sido precedido desse episódio, eu confesso que ponderaria que nós deveríamos ponderar um critério de prudência política […] Não se trata de retaliação, trata-se de postura judicial: ou o Judiciário é independente, ou o Judiciário é subserviente”, completou. Somente Marco Aurélio e Dias Toffoli votaram pela suspensão do julgamento.
A retomada do julgamento começou com a apreciação de uma notificação dos advogados do Senado sobre a aprovação dos projetos de lei 672/2019 e 191/2017 pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, nesta quarta-feira (22). O primeiro projeto inclui a discriminação de sexo, orientação sexual e identidade de gênero na lei contra o racismo. O segundo inclui na Lei Maria da Penha a identidade de gênero para proteger pessoas transgênero que se identifiquem com o sexo feminino.
Os projetos serão votados em turno suplementar na CCJ e, se não houver recurso, seguirão direto para a Câmara, sem passar pelo plenário do Senado. O pedido de notificação foi feito pela presidente da CCJ, Simone Tebet (MDB-MT) ao presidente da casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e Celso de Mello sugeriu votar se o tribunal deveria tirar de pauta as ações. A decisão da maioria, contudo, foi manter o julgamento.
Como a Gazeta do Povo registrou, membros da Frente Parlamentar Evangélica (FPE) avaliam que o projeto não tem chances de ser aprovado na Câmara com a atual redação do Senado e preparam um texto de consenso. Os parlamentares tiveram reunião com o presidente do Supremo na tarde de ontem (23). Na véspera do início do julgamento, em 12 de fevereiro, a FPE pediu que o tema fosse retirado de pauta, mas Toffoli negou.
“A mera existência de proposição legislativa em tramitação no Congresso Nacional não tem o condão de afastar, só por si, a configuração, na espécie, de inércia por parte do Poder Legislativo”, opinou Mello. O ministro lembrou que, no passado, o STF chegou a entender que a existência de processo legislativo sobre um tema afastaria a acusação de atraso do Poder Legislativo, mas o tribunal mudou sua posição em 2007, seguindo a orientação do ministro Gilmar Mendes.
“Conquanto não se desconheça a complexidade de determinados projetos legislativos, as peculiaridades e dificuldades da atividade parlamentar não justificam a inércia demasiadamente longa diante de imposição ditadas pelo texto constitucional”, afirmou Mello, citando um precedente do tribunal.
O ministro argumentou ainda que não há garantia de que os projetos de lei aprovados pela CCJ sejam de fato aprovados pelo Senado, uma vez que recurso pode ser apresentado por ao menos nove senadores para que os projetos sejam remetidos ao plenário.
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