Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceram a constitucionalidade da Lei 12.990/2014, que regula as cotas para negros no serviço público. O julgamento teve início em maio, quando cinco dos 11 ministros votaram a favor da medida, mas foi suspenso porque o relator, Luís Roberto Barroso, precisou se retirar da sessão.
Com o debate retomado nesta quinta-feira (8), manifestaram-se de forma favorável os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Cármen Lúcia. Gilmar Mendes não participou da sessão por causa do julgamento da chapa Dilma-Temer, que acontece no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), onde é presidente.
A Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 41 foi ajuizada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), com o objetivo de sanar a controvérsia jurídica que existe em outras instâncias da Justiça sobre a validade constitucional da Lei 12.990/2014. O texto reserva aos negros 20% das vagas ofertadas em concursos públicos no âmbito da administração pública federal, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista controladas pela União.
Os ministros decidiram que a regra vale para os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, no âmbito federal. Quando se manifestou em maio, Barroso afirmou que órgãos estaduais e municipais podem seguir o entendimento, sem obrigatoriedade.
Outro ponto analisado no julgamento da ADC foi a autodeclaração de que se é negro ou pardo, no momento da inscrição no concurso. Há quem alegue que o ato estaria sujeito a fraudes. Barroso afirmou que a questão é bastante complexa, mas que é preciso respeitar como as pessoas se auto percebem. “Pode ser que eu não perceba uma pessoa como negra, mas que ela se enxergue como tal”.
Entretanto, entendeu que são válidas comprovações da cor de pele que vão além da autodeclaração, desde que garantida a dignidade do indivíduo, bem como o direito ao contraditório e à ampla defesa. Caso seja constatada a falsidade da declaração, o candidato poderá ser eliminado do concurso – se a constatação da fraude for posterior à nomeação, existe a possibilidade de demissão.
Em seu voto, rebatendo o argumento de quebra da igualdade pelas cotas, Barroso disse que é permitido ao legislador estabelecer diferenciação entre as pessoas, desde que o fim visado seja razoável e compatível com o que traz a Constituição Federal (CF). Para justificar sua visão, o ministro citou a dívida histórica que se tem com os negros, que após o fim da escravidão não puderam contar com nenhum tipo de planejamento para ser integrados à sociedade. O juiz também falou sobre o racismo estrutural que acontece no Brasil.
“Aqui, diferentemente do que se passou nos Estados Unidos [com a segregação racial que perdurou até meados do século XX], não foram necessárias leis discriminatórias, do estilo vagões e banheiros só para negros ou só para brancos. Aqui, o racismo era tão estruturalmente arraigado que isso já acontecia naturalmente”, apontou. Para Barroso, os brasileiros se acostumaram com uma sociedade estratificada, em que os negros ocupavam cargos que podem ser considerados inferiores, como porteiros e empregadas domésticas.
Meritocracia ferida
Em entrevista à Gazeta do Povo, em maio, o advogado e professor de Direito Constitucional Dircêo Torrecilhas Ramos disse que o sistema de cotas fere a meritocracia. “Eu sou contra o sistema de cotas do jeito que está sendo feito. Sou a favor da meritocracia. Entendo que existem pessoas em condições inferiores, mas não apenas em relação a gênero e raças. E não é através de cotas que se deve responder. No sentido geral, isso deve ser resolvido por oferta de condições às pessoas, e não só com base em gênero e raça”, afirmou ao repórter Renan Barbosa.
Colaborou: Mariana Balan.
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