Está nas mãos da Suprema Corte nos EUA uma ação que é considerada a maior investida contra os sindicatos públicos no país no último século.
Servidores públicos do estado de Illinois, encabeçados por Mark Janus e financiados por entidades “antissindicais”, pedem à Corte que considere inconstitucional uma decisão dada em 1977 (no caso Abood vs. Detroit Federation of Teachers) que permite a sindicatos públicos cobrar taxas mensais a não associados, desde que a quantia arrecadada seja utilizada para o pagamento de gastos com negociações coletivas. Para Janus, a medida fere a Primeira Emenda da Constituição dos EUA que protege a liberdade de expressão e também a de um cidadão não ser forçado a apoiar algum grupo ou instituição. Como os sindicatos desempenham um poderoso papel cívico e político ao gerenciar acordos coletivos, argumenta Janus, esse trabalho seria inseparável a de outras atividades políticas ou ideológicas – como a de palestras favoráveis à candidatura de Hillary Clinton em convenção sindical, em 2016.
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Atualmente, fundamentados na decisão de 1977, 22 estados norte-americanos permitem a cobrança de taxas sindicais a trabalhadores públicos. A chamada “taxa de agência” cobrada dessas pessoas é quase idêntica às taxas sindicais de funcionários associados às organizações trabalhistas. Caso a taxa seja considerada inconstitucional, segundo o The Washington Post, em editorial do último dia 11 de fevereiro, esses sindicatos públicos e os políticos (geralmente democratas) que recebem apoio dessas agremiações devem sofrer um grande revés financeiro.
O julgamento da ação Janus vs. AFSCME (sigla para a Federação Americana de Empregados Estaduais, do Condado e Municipais, em tradução livre) será no próximo dia 26 de fevereiro, segunda-feira. Pelas decisões dadas em julgamentos semelhantes, a Suprema Corte tende a aproveitar esse caso para proibir as taxas obrigatórias. Um processo semelhante, de professores do estado da Califórnia contra seu sindicato, terminou em um empate de 4-4, após a morte do juiz Antonin Scalia, em 2016. Como o substituto de Scalia, Neil M. Gorsuch, nomeado por Donald Trump, tende a votar contra os sindicatos, o julgamento do próximo dia 26 pode terminar em 5-4 pelo fim da obrigatoriedade da taxa.
Servidores “aproveitadores” e Martin Luther King
Em sua defesa, os sindicatos lembram que os funcionários não associados às organizações trabalhistas recebem benefícios com as negociações coletivas e, portanto, é justo que paguem por elas e não apenas se aproveitam do trabalho realizado. Ao mesmo tempo, dizem que uma decisão contrária traria uma queda nas receitas utilizadas para defender os trabalhadores.
No próximo dia 24 de fevereiro, sábado, dois dias antes do julgamento, as agremiações sindicais prometeram levar milhares de pessoas às ruas para protestar contra o fim da taxa compulsória de não sindicalizados para negociações coletivas. Para sensibilizar a opinião pública, elas vão utilizar imagens e discursos de Martin Luther King, especialmente os adotados em 1968, poucos meses antes de morrer, em uma greve em Memphis, Tennessee. Baxter Leach, 78 anos, sindicalista da AFSCME que participou da paralisação de 1968, fará um discurso na Foley Square, em Manhattan. A movimentação terá o apoio de sindicatos privados.
Solução intermediária
O The Washington Post lembra, ainda em seu editorial, que uma solução intermediária ao dilema foi apresentada pelos professores de Direito Charles Fried da Universidade de Harvard (ex-procurador-geral dos Estados Unidos) e Robert C. Post, da Yale Law School.
Como desde a decisão do tribunal de 1977 os sindicatos conseguiram relacionar quase tudo o que fazem - convenções anuais, publicações internas - à negociação coletiva, a solução seria o tribunal esclarecer que as taxas da agência devem ser arrecadadas e utilizadas exclusivamente para pagar os direitos de negociação coletiva, tal como definidos de forma restrita pela lei estadual.
Com isso, os sindicatos teriam verbas suficientes para os acordos coletivos, mas sem utilizar esses recursos para outras ações – como as de cunho político-partidário.