Enquanto as pesquisas não chegam a um consenso se o porte de armas aumenta ou não a violência, cresce no Brasil a pressão para que o Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/2010) seja revogado. E dificilmente os políticos poderão escapar desse tema na campanha eleitoral de 2018. Tanto no Senado quanto na Câmara tramitam dezenas de propostas, com grande apoio popular, que têm como objetivo mudanças significativas na norma. Três delas avançam com mais força: o fim do Estatuto, proposto pelo deputado federal Rogério Peninha Mendonça (PMDB-SC); a liberação da venda de armas para proprietários rurais com mais de 21 anos, do deputado Afonso Hamm (PP-RS); e a realização de um plebiscito com as eleições de 2018 para decidir sobre a lei, do senador Wilder Morais (PP-GO).
Entenda o que propõe cada um dos projetos
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Se dependesse apenas da opinião da maioria, provavelmente a população votaria por facilitar a compra e uso de armas de fogo. Pesquisa divulgada em setembro apontou que 52,7% são favoráveis ao acesso facilitado a armas de fogo, enquanto que outros 13,9% acreditam que as restrições atuais deveriam ser menores. O resultado não é muito diferente do referendo realizado em 2005, quando 63% da população se posicionou contra a proibição da venda de armas – e, depois, ficou desapontada com os entraves criados pela lei para um cidadão obter a posse e o porte de armas. E também está de acordo com as últimas manifestações populares sobre o tema, principalmente nas consultas públicas realizadas nos sites das casas legislativas: no início desse ano, mais de 60 mil pessoas apoiaram a sugestão popular que pedia o fim do Estatuto do Desarmamento enquanto que, em uma segunda consulta, 230 mil internautas, com números computados até esta quarta-feira (4), concordaram com a realização do plebiscito.
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Desde dezembro de 2016, uma série de decretos presidenciais e portarias ministeriais vêm alterando a regulamentação do Estatuto do Desarmamento. A medida que causou mais polêmica foi a Portaria nº 28 do Comando Logístico do Exército, de 14 de março deste ano, que passou a permitir a atiradores transitarem, em direção a clube de tiro ou competição, com uma arma municiada – decisão que afeta cerca de 90 mil pessoas no Brasil. Outra iniciativa criticada por entidades da sociedade civil favoráveis ao controle de armas foi o Decreto 8935, de 19 de dezembro de 2016, que alterou a periodicidade da renovação do Certificado de Registro de Arma de Fogo. O prazo, que antes era a cada três anos, passou para cinco. Além disso, o atestado de capacidade técnico tinha de ser apresentado a cada renovação e, agora, é requerido apenas a cada duas renovações, isto é, a cada dez anos.
As iniciativas no Congresso
A principal proposta em tramitação na Câmara dos Deputados sobre o tema é o Projeto de Lei 3.722/2012, de autoria do deputado federal Rogério Peninha Mendonça (PMDB-SC). O texto prevê a revogação do Estatuto do Desarmamento, reduz a idade para a compra de armas para 21 anos e libera o porte de arma para quem tiver emprego e residência fixa, apresentar certidão de antecedentes criminais, atestado psicológico e comprovar ter capacidade técnica atestada por instrutor de tiro. Caso seja aprovado, apenas investigados por crimes com dolo contra a vida não poderão adquirir armas.
Em sua justificativa, o deputado Peninha afirma que o Estatuto do Desarmamento “é uma norma ideológica”. “Com a sociedade desarmada”, escreveu, “os jornais e noticiários hoje estampam diariamente o crescimento na criminalidade geral, com roubos indiscriminados, arrastões em restaurantes e invasões a residências, demonstrando que a certeza de que a vítima estará desarmada somente torna o criminoso mais ousado”.
A segunda, e a mais bem-sucedida em relação à liberação de armas no campo, é o Projeto de Lei 6.717/2016, do deputado Afonso Hamm (PP-RS), que permite a concessão de licença para o porte de arma de fogo para proprietários e trabalhadores rurais maiores de 21 anos. O documento acaba de ser aprovado na Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural, em caráter conclusivo, e será analisado pelas comissões de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.
A terceira proposta com grandes chances de aprovação, do senador Wilder Morais (PP-GO), é a de realizar um plebiscito sobre o Estatuto com as eleições de 2018. O Projeto de Decreto Legislativo 175/2017 propõe que a consulta à população seja feita com as eleições de 2018, em que o eleitorado seria chamado a responder “sim” ou “não” a três perguntas: se deve ser assegurado o porte de armas a cidadãos com bons antecedentes em área rural, sem restrições; se o Estatuto do Desarmamento deve ser revogado e substituído por uma nova lei que assegure o porte de armas a quaisquer cidadãos que preencham requisitos objetivamente definidos em lei; se o Estatuto do Desarmamento deve ser revogado e substituído por uma nova lei que assegure a posse de armas a quaisquer cidadãos que preencham requisitos objetivamente definidos em lei.
Armas? Democracia não é apenas a opinião da maioria
O tema é complexo e os limites do poder do Estado estão em jogo nesse debate. A democracia não é relativa e nem se fundamenta na opinião da maioria – não se pode decidir matar um inocente por número de votos, por exemplo. O Estado Democrático de Direito tem a difícil tarefa de tentar garantir os direitos fundamentais de todos e o bem comum. O problema está em que, nesse caso, não há consenso se o porte de armas é um direito fundamental – principalmente relacionado ao direito de defender-se da crescente onda de violência registrada no país, aliada à incompetência do Estado em resolver esse cenário –, ou se apresenta um risco grande, de mais homicídios e, por isso, deveria ser coibido por lei.
A comparação com outros países também não costuma dar certo. Os dados, na maioria das vezes, não são confiáveis e, além disso, a taxa de criminalidade depende ainda de outros fatores, como economia e educação. Sendo assim, sempre é possível selecionar uma comparação que fará o argumento preferido soar melhor.
Os efeitos sobre o Estatuto do Desarmamento no Brasil também são controversos: não há pesquisas definitivas sobre a relação entre a lei e os índices de criminalidade.
Atualmente, apenas pessoas maiores de 25 anos podem comprar armas no país, e o porte – direito a poder transitar com a arma – só é permitido a civis em casos excepcionais, com comprovação de necessidade. Quem pretende comprar uma arma, não pode ter nenhum antecedente criminal, nem estar sendo investigado por crimes. Um civil pode ter até seis armas, mas, a cada compra, precisa justificar o motivo. E o registro da arma precisa ser renovado a cada três anos.
Linha editorial
Conheça melhor o posicionamento da Gazeta do Povo sobre o uso de armas de fogo e as políticas de desarmamento:
“Não é saudável, em lugar nenhum, ter uma sociedade armada. É bom que haja restrições, tomando-se apenas o cuidado de não cair no extremo oposto [...] O direito à legítima defesa é essencial e, quando é clara a dificuldade do poder público em coibir os crimes, elucidar os já cometidos e manter criminosos condenados longe da sociedade, desarmar a população apenas serviria para deixar a porta aberta aos bandidos.” [Leia mais]
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