No escritório do advogado trabalhista Felipe Vidigal de Oliveira, no centro de Brasília, a reforma trabalhista não diminuiu a demanda de ações. Pelo contrário. A expectativa do advogado é de ajuizar mais processos em 2018 do que no ano passado. “Como as convenções coletivas agora estão acima da lei, vão se multiplicar os questionamentos sobre o respeito a elas”, prevê Oliveira.
ENTREVISTA: Ações antigas não devem entrar na reforma trabalhista, diz ministro do TST
Os clientes não desistem das ações mesmo quando informados do risco de pagarem as custas processuais e os honorários dos advogados em caso de derrota, uma medida da nova lei para frear a multiplicação das ações na Justiça. “Nenhum deles desistiu. Mas sempre alerto sobre os riscos e não aceito o caso se avaliar que não há chance de vitória”, completa o advogado, em meio à insegurança jurídica trazida pela nova lei trabalhista.
O Tribunal Superior do Trabalho (TST) ainda não chegou a um consenso sobre nenhum dos mais de cem pontos da Consolidação das Leis do trabalho (CLT) alterados pela reforma. O mais perto disso é a proposta de resolução apresentada há duas semanas por uma comissão especial formada por nove ministros, ou seja, um terço da composição do TST. O texto restringe-se a sugerir que as mudanças da lei tenham validade apenas para os processos ajuizados depois da vigência da reforma, a partir de 11 de novembro de 2017.
O presidente do TST, João Batista Brito Pereira, vai submeter a proposta ao pleno do tribunal. A expectativa era de que a resolução fosse aprovada na semana passada. Mas o tema ainda não está na pauta. “O presidente quer ouvir todos os ministros, para que cada um possa apresentar suas sugestões. Uma vez apresentadas, vamos ao pleno para decidir”, disse à Gazeta do Povo o ministro Aloysio Corrêa da Veiga, presidente da comissão de regulamentação da reforma trabalhista (leia entrevista).
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A medida é aguardada por trazer possivelmente o primeiro consenso da maior instância da justiça trabalhista sobre a reforma, em meio às incertezas trazidas pelas alterações na CLT. “Essa decisão tem que ser tomada o quanto antes, seria bom para acalmar a tormenta. E tudo o mais, como os contratos de trabalho em vigência, além das ações em trâmite, tem que levar em conta o patamar anterior, para garantir o mínimo de segurança jurídica”, defende o procurador do Ministério Público do Trabalho Marcelo Freire, que também é professor de Processo do Trabalho na faculdade de direito do Mackenzie (SP).
Para o Ministério Público do Trabalho, os recentes posicionamentos do Ministério do Trabalho e do Tribunal de Contas da União sobre a validade da nova lei para todos os contratos em vigor, sejam novos ou antigos, não se sustentam na justiça trabalhista. “Todas as ações trabalhistas é que vão consolidar isso, tem vários assuntos pendentes”, esclarece Freire.
E mesmo que o TST venha a tomar uma decisão nos próximos dias, os efeitos das mudanças na legislação tendem a se consolidar ao longo dos anos. Essa é a opinião do doutor em direito e professor de Direito do Trabalho e Direito Constitucional da Universidade de Brasília (UnB) Paulo Blair, também juiz de Direito da 17.ª Vara do Trabalho de Brasília. “O tribunal está tentando dar algum norte, alguma orientação. Mas a verdade é que adianta muito menos do que se imagina”.
Para o jurista, uma primeira avaliação só deve ocorrer nos próximos três ou quatro anos. “A Justiça do Trabalho ainda está tomando posicionamentos, nas varas, nos tribunais regionais, e os recursos nem sequer ainda foram interpostos ao TST. É necessário tempo para que esses recursos cheguem ao tribunal”, defende Blair.
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Ações antigas não devem entrar na reforma trabalhista, diz ministro
O ministro Aloysio Corrêa da Veiga participa desde 2004 das principais discussões no Tribunal Superior do Trabalho em torno das instruções normativas, normas gerais que orientam sobre os procedimentos administrativos que devem ser adotados e seguidos conforme a legislação em vigor. A experiência levou o ministro à Presidência da Comissão de Regulamentação da Reforma Trabalhista no Tribunal Superior do Trabalho (TST), com o desafio de trazer o primeiro entendimento da corte sobre o tema. Para isso, ele aposta no debate acadêmico e não ideológico sobre as alterações trazidas pela nova lei. O magistrado recebeu a Gazeta do Povo no seu gabinete, em Brasília, e falou sobre o trabalho da comissão e os desafios do TST depois das mudanças na CLT. Confira os principais trechos da entrevista.
O TST está próximo do primeiro consenso sobre a reforma trabalhista depois que, de forma unânime, a comissão apresentou a proposta de que ações ajuizadas antes da nova legislação entrar em vigor não devem ser atingidas pelas mudanças?
Houve um consenso, não unanimidade na comissão. Ela é composta de nove ministros, há um debate e uma discussão sobre os temas tratados. E há uma restrição de atuação porque não pode o Tribunal Superior do Trabalho regulamentar uma norma legal quando a lei não autoriza.
Como o TST pode repetir esse consenso entre os 27 ministros?
O nível dos debates é acadêmico. É preciso que se abstraia de qualquer ideário político ou cultural para se concentrar exatamente na pura e simples interpretação da norma jurídica. Não cabe ao tribunal regulamentar lei. Ele se limita a dar um norte da interpretação de cunho processual, que diz respeito ao seguinte: o processo iniciado anteriormente vai seguir as regras da lei anterior ou se aplica à regra da lei nova? Quanto ao direito material, a construção jurisprudencial que vai determinar o alcance, os próprios julgamentos futuros que determinarão qual o alcance da norma jurídica nova.
Qual a contribuição que esse entendimento pode trazer à justiça trabalhista?
Com relação ao direito processual, a comissão se atém ao direito intertemporal. Há uma regra nova, de processo: ela atinge os processos em curso? Por exemplo, com relação ao aspecto de algumas posturas, como a prescrição intercorrente. Ela vai ser aplicada retroativamente? Os processos que estavam parados há mais de dois anos, eu aplico a lei nova? Não é bem assim. Nesse ponto, a comissão demonstrou, até para dar uma orientação em termos gerais, que só poderá aplicar a prescrição intercorrente das decisões que os juízes derem após a lei.
Outros pontos, como o pagamento de custas e honorários em caso de derrota do trabalhador, também seguiriam esse entendimento?
Não enfrentamos o tema da condenação em honorários. Essa matéria é jurisdicional, está dentro do princípio do julgamento do juiz. Mas sabemos o seguinte: essa regra nova vale para todos os processos em curso ou está restrita aos processos que iniciaram pós-reforma?
Essa questão é importante ficar definida?
Claro. Na verdade, muda o paradigma. O que antigamente a Justiça do Trabalho entendia não haver sucumbência, por força de um critério próprio, foi alterado. Então, toda a estrutura do processo anterior foi elaborada com princípio outro. Não pode haver surpresa da parte de a lei nova retroagir e alcançar ações anteriormente ajuizadas. Naturalmente, as ações novas que serão julgadas segundo os critérios da nova lei.
E por que a corte ainda não debateu a questão?
Somos 27. A comissão tinha nove. Um terço do tribunal. É um debate. Por isso é uma proposta. E o presidente quer ouvir cada ministro para que possam apresentar suas sugestões. Uma vez apresentadas, vamos ao pleno para decidir. Até agora, estamos no campo da proposta. Foi constituída uma comissão, ela exerceu a função de analisar e submeter ao presidente e ao tribunal a conclusão dos trabalhos. Essa conclusão será debatida naturalmente com todos os ministros da corte e que irão ter o julgamento final sobre isso.
O senhor acredita que a aprovação da resolução vai trazer mais segurança jurídica para as questões trabalhistas?
Toda mudança legislativa muda também a zona de conforto. Altera o que já vinha sendo praticado há muito tempo. O grande problema da reforma não é ser contra ou favor da reforma. O juiz julga. Ele tem que julgar segundo o direito. Essa é a grande questão. Muda paradigmas. A origem é legítima. É o poder legislativo que criou, foi o órgão competente para estabelecer a nova lei. Quando se legisla, o objetivo final da lei é melhorar as condições sociais. Agora é a questão da prática. A relação jurídica que vai se desenvolver a partir daí.
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