Ainda há uma luz no fim do túnel para quem compartilhou intimidades no Facebook e ficou assustado com o escândalo de vazamento de dados de 87 milhões de usuários da rede social. A esperança está na desconhecida “relação sinalagmática”, estrutura jurídica que obriga as duas partes de um contrato a obedecer às regras estabelecidas.
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Em outras palavras, quando um usuário clica “aceito” nos obscuros “termos de uso” do Facebook, a empresa de Mark Zuckerberg não recebe apenas direitos sobre fotos, dados – e até acesso a outras informações , como os dados do cartão de crédito, caso o usuário utilize um aplicativo com o seu perfil na rede. Ela também se compromete a cumprir obrigações que, caso sejam negligenciadas, possuem desdobramentos jurídicos.
“No Brasil, ainda não temos uma lei específica que trate da proteção de dados, porém há limites impostos pelo Marco Civil da Internet e pela Constituição Federal”, explica Alexandre Fidalgo, sócio do escritório Fidalgo Advogados.
Ou seja, o mero fato de concordar com os “termos de uso” não significa que as regras do Facebook sejam absolutas ou à margem da lei e, portanto, sempre que algum delito seja cometido, a empresa, em tese, pode ser chamada judicialmente para responder. Ainda que o usuário, ao clicar “aceito”, permita que o Facebook colete dados e os use para fins comerciais.
O Marco Civil da Internet, Lei 12.965 de 2014, estabelece como princípio da disciplina do uso da Internet no Brasil a proteção dos dados pessoais e garante ao usuário, entre outros, o direito à inviolabilidade da intimidade e da vida privada, sua proteção e indenização pelo dano material ou moral decorrente da violação a este direito.
A Constituição Federal, por outro lado, trata como valores fundamentais a intimidade, a imagem e a honra do cidadão, ou seja, valores superiores a outros direitos e obrigações quando em conflito. “Qualquer interpretação a respeito dos termos de uso ou da política de uso de dados de uma empresa deve obediência ao que diz o texto constitucional”, explica Fidalgo.
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Mas o Facebook realmente poderá ser incriminado?
Ao mesmo tempo em que a legislação protege os dados – em teoria –, na prática, ainda faltam regras mais concretas que, de fato, deem autonomia às autoridades para essa fiscalização.
“Hoje, para o consumidor é muito custoso entrar com um processo. Por isso, caso fosse aprovada uma Lei de Proteção de Dados a norma criaria uma autoridade garantidora, fiscalizadora. Seria um grupo com expertise nesse tema e que poderia fazer essa fiscalização. A Europa adota esse modelo com autoridades administrativas que controlam. O cidadão entra com uma queixa e ela passa a ser investigada”, afirma Jacqueline Abreu, coordenadora da área de privacidade e vigilância no Internet Lab, centro de pesquisa independente em direito e tecnologia baseado em São Paulo.
Entre as discussões nesse sentido que tramitam no Congresso Nacional é possível destacar o Projeto de Lei (PL) 2060/2012, com relatoria do deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) na Câmara, e o PL 330/2013, cuja relatoria é do senador Ricardo Ferraço, na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado.
No mundo, Jacqueline lembra que poucos acabam levando um processo adiante. O caso mais notório é do ativista austríaco Maximilian Schremsm, fundador da ONG “Europa versus Facebook”, que tem como objetivo identificar falhas nas políticas de privacidade da rede social com base na legislação europeia.
Max Schrems processou o Facebook em uma ação coletiva por violação da lei de Proteção de Dados da União Europeia. No processo, ele acusou o Facebook e outras empresas de tecnologia de repassarem dados de usuários à Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos. Os processos ocorreram em Luxemburgo e na Irlanda, sedes das empresas questionadas.
Em 2015, o Tribunal de Justiça da União Europeia em Luxemburgo invalidou o acordo entre a União Europeia e os Estados Unidos para a transferência de dados pessoais.
No Brasil, recentemente, houve uma movimentação do Ministério Público do Distrito Federal pedindo informações sobre o vazamento de informações dos dados de 300 mil internautas brasileiros, no caso envolvendo a Cambridge Analytica.
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