Saiu na mídia que as Escolas Estaduais teriam as aulas suspensas por quinze dias. A medida adotada pelo Governo Estadual visava reduzir a chance de contágio da Covid-19. O fato ocorreu no dia 23 de março de 2020 e, até o momento, estou em casa, dando aulas por meio do trabalho remoto.
Imaginava que este ano seria igual aos demais: teria limitações físicas, pois sou portadora de fibromialgia e essa síndrome produz muitas dores musculares; conviveria com problemas estruturais, já que as escolas carecem de investimentos; e teria que enfrentar situações pertinentes ao exercício da minha profissão, pois ser professor exige constante preparo, esforço, comprometimento, renunciar a si mesmo, e muito amor envolvido. Diante desse contexto, a primeira atitude que tomei foi buscar entender o que estava acontecendo. O vírus era realmente nocivo? Por que fechar as escolas tão precocemente? Tive que digerir cada acontecimento e não negar os fatos.
Na sequência li as portarias emitidas pela Secretaria de Educação, que especificavam sobre a atuação de gestores, coordenadores e professores na modalidade “Remoto”, a fim de compreendê-las. Confesso que muitas informações me pareceram difíceis de serem aplicadas, pois tinha em mente o contexto escolar do qual faço parte e as dificuldades enfrentadas pelos alunos, especialmente a financeira.
Analisei as tecnologias que já possuía, as que ainda seriam necessárias, e como obtê-las. Também como eu e meu esposo podíamos revezá-las, já que ele as usava com frequência. Refleti ainda sobre o nível da internet e como garantir melhores condições no trabalho em casa (separei um cômodo “confortável”, silencioso, que não me permitisse distrações, e contribuísse para a confecção de áudios, vídeos e etc.). Foi imprescindível pensar nesses detalhes, pois o planejamento das atividades diárias, o constante uso das tecnologias, dar-se-iam nesse local por um longo tempo.
Após colocar em prática as solicitações das portarias, foram muitas as inquietações. Ainda que toda semana dialogasse com colegas, que atuavam comigo nas mesmas turmas, e tivéssemos periódicas reuniões pedagógicas, a sensação era de que algo não ia bem. Onde estava o principal instrumento motivador, o aluno? Era urgente retomar a aproximação de professores e alunos!
Decidida a não permitir que o distanciamento educacional aumentasse, e o desânimo fizesse morada em mim, resolvi “sacodir a poeira” e superar as dificuldades. Como conseguir tal façanha, se parentes, amigos, alunos, e a agitação das ruas me foram tirados? A internet estava bem ali, na minha frente, e eu não tinha plena consciência disso! Então fiz pesquisas, encontrei sites que ofertavam cursos gratuitos, de excelente qualidade, que podiam me ajudar a desenvolver os conteúdos e as atividades propostas em cada roteiro de estudos semanais, disponibilizados aos alunos. A cada curso, e módulo concluído, refletia sobre qual recurso usar, para qual turma, série, pensava nos diferentes perfis dos alunos e aplicava o que aprendia. Li sobre práticas que estavam sendo desenvolvidas Brasil afora. Também revivi conhecimentos adquiridos nos projetos das escolas nas quais atuei, e os uni às práticas consultadas. Tendo em vista, é claro, a minha realidade, a Educação de Jovens e Adultos – EJA, e suas especificidades.
Aprendi pela observação, a escuta, e as vivências. O fato é que nós professores, neste contexto de pandemia, damos aulas por meio do WhatsApp. Então pude observar as aulas das disciplinas, notar diferentes intencionalidades, escutar explicações enriquecedoras, visualizar a reação dos alunos e extrair o que necessitava, ainda que essas atitudes demandassem tempo e, muitas vezes, “roubassem” horas do meu precioso descanso. Porém valeu muito a pena! Indaguei sobre a minha prática, tirei proveito de diferentes metodologias e recursos, e passei a integrá-los. O tempo passou e muitos alunos continuam quietos, silenciados na condição de expectadores (visualizam os conteúdos, mas não interagem).
Eu continuo molhando a teoria na prática, questionando-me, pois como diz Quintana, o poeta: “A resposta certa, não importa nada: o essencial é que as perguntas estejam certas.” Portanto, em tempos de pandemia, de incertezas, de reinvenções... o que importa não são as respostas, mas os desafios enfrentados, as diferentes mudanças e as lições aprendidas.
*Texto escrito por Maria Dóris Araújo de Lima, professora na Rede Estadual de Alagoas, nas turmas de EJA do Centro Educacional de Jovens e Adultos - Paulo Freire (CEJA), na cidade de Maceió. A professora participa do Projeto Ler e Pensar e enviou o texto voluntariamente.
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