Em seus quatros anos à frente da Presidência da Bolívia que acumula com o cargo de presidente do comitê de cocaleiros do país Evo Morales acrescentou romantismo à erva com a qual sempre trabalhou, a ponto de deixar bolivianos e estrangeiros apaixonados por sua tese de que a industrialização da planta irá catapultar a economia do país. Para isso, a última cartada foi o lançamento da "Coca Colla", que, ao contrário da versão original e símbolo do capitalismo, assume levar folhas de coca na receita. O que o primeiro presidente indígena não reconhece é que a produção de cocaína cresce no país no mesmo ritmo das plantações de Erythroxylon coca.
O segredo da "Coca Colla" boliviana não é sua fórmula guardada a sete chaves, e sim o apoio governamental. Morales dá suporte à empreitada do cocaleiro Victor Ledezma, que lançou seu refrigerante-energético em abril.
O nome, diz ele, não é plágio, e sim homenagem às tribos colla dos Andes, que cultivavam a planta originalmente.
O capital inicialmente investido na empreitada foi de US$ 1 mil, mas, Ledezma espera, poderá ser expandido para US$ 1 milhão, com a construção de uma fábrica em Santa Cruz.
"A coca tem muito potencial... ela pode mudar a imagem da Bolívia como país traficante de drogas", disse à rede britânica BBC. As garrafas do produto vêm com meio litro cada e custam cerca de R$ 2,50.
Apesar do gosto, que seria equivalente a um chá de coca doce demais, a bebida tem fãs. "Ainda não tive a oportunidade de tomar, mas, se não for danosa à saúde, acho louvável. Muita gente usa a coca para problemas causados pela altitude, estômago, fome, e sede", diz o dentista boliviano Julio Bustillos, que mora em Curitiba há mais de 30 anos.
No quesito participação de mercado, ninguém realmente acredita que a bebida fará concorrência com a rival americana. "Quem é contra o governo, agora toma ainda mais Coca-Cola", disse à Gazeta do Povo o boliviano Javier Rocabado.
Talvez para intensificar o impacto do novo produto, o governo Morales lançou mão do que pode ser considerada uma campanha de perseguição contra a empresa americana. No começo de julho, criou uma norma contra os contratos de exclusividade de refrigerantes em pontos de venda estratégica típica do setor. A Pepsi escapou, por enquanto, porque passa por um processo de fusão.
"Não se pode criar leis que modifiquem feitos anteriores a ela", lembra à Gazeta do Povo o professor, advogado e especialista em Lei de Propriedade Social Antonio Canova.
Com a investida, Morales busca fazer frente aos EUA, onde a industrialização da folha de coca é permitida e as 400 mil toneladas da erva importadas anualmente vão para a indústria farmacêutica e de refrigerantes. A Coca-Cola nega, mas fontes do setor dão como certo o uso da folha de coca em sua fórmula secreta.
Na Bolívia, o plano de industrializar a folha da coca já deu lugar a chás, xaropes, licores, doces, bolos e até pasta de dente.