Morales leva folhas de coca a eventos internacionais, onde não se acanha de mostrar a maneira correta de mascá-las| Foto: Dieter Nagl/AFP

Polêmica

Aumento de plantio teria estimulado narcotráfico

"A coca boliviana tem um mercado principal, e é o Brasil." Assim o professor de ciência política e relações internacionais da Universidade Florida International Eduardo Gamarra resume à Gazeta do Povo a importância que o aumento no plantio de folhas de coca no país vizinho na última década deveria ter para as autoridades brasileiras. A alta foi de mais de 40%.

Apesar de o presidente Evo Morales frisar em toda oportunidade de exposição internacional que é possível combater a cocaína enquanto se estimula produtores da folha da coca, um efeito colateral de sua política de industrialização do arbusto foi a expansão da produção para 31 mil hectares anuais, quando a lei boliviana permite apenas 12 mil hectares, de acordo com o Departamento de Combate às Drogas dos Estados Unidos. Para onde vai esse excedente, é fácil imaginar. Há dois anos, responsáveis desse departamento que fiscalizavam a droga no país foram acusados de espionagem e expulsos.

O aumento na produção de cocaína teria levado a um rearranjo do papel da Bolívia no narcotráfico internacional.

Se antes da chegada de Evo ao poder a rede de produção de folhas de coca – e, supostamente, cocaína – estava restrita a uma pequena região, agora ela é nacional. "O altiplano está salpicado de pequenos laboratórios de droga, até mesmo em regiões que ficam fora da faixa semitropical onde originalmente a coca cresce", diz Gamarra.

Ele também aponta o fato de o mercado consumidor de drogas europeu estar dando preferência para a droga boliviana. (HC)

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Em seus quatros anos à frente da Presidência da Bolívia – que acumula com o cargo de presidente do comitê de cocaleiros do país – Evo Morales acrescentou romantismo à erva com a qual sempre trabalhou, a ponto de deixar bolivianos e estrangeiros apaixonados por sua tese de que a industrialização da planta irá catapultar a economia do país. Para isso, a última cartada foi o lançamento da "Coca Colla", que, ao contrário da versão original e símbolo do capitalismo, assume levar folhas de coca na receita. O que o primeiro presidente indígena não reconhece é que a produção de cocaína cresce no país no mesmo ritmo das plantações de Erythroxylon coca.

O segredo da "Coca Colla" bo­­liviana não é sua fórmula guardada a sete chaves, e sim o apoio governamental. Morales dá su­­porte à empreitada do cocaleiro Victor Ledezma, que lançou seu refrigerante-energético em abril.

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O nome, diz ele, não é plágio, e sim homenagem às tribos colla dos Andes, que cultivavam a planta originalmente.

O capital inicialmente investido na empreitada foi de US$ 1 mil, mas, Ledezma espera, poderá ser expandido para US$ 1 milhão, com a construção de uma fábrica em Santa Cruz.

"A coca tem muito potencial... ela pode mudar a imagem da Bolívia como país traficante de drogas", disse à rede britânica BBC. As garrafas do produto vêm com meio litro cada e custam cerca de R$ 2,50.

Apesar do gosto, que seria equivalente a um chá de coca doce demais, a bebida tem fãs. "Ainda não tive a oportunidade de tomar, mas, se não for danosa à saúde, acho louvável. Muita gente usa a coca para problemas causados pela altitude, estômago, fome, e sede", diz o dentista boliviano Julio Bustillos, que mora em Curitiba há mais de 30 anos.

No quesito participação de mercado, ninguém realmente acredita que a bebida fará concorrência com a rival americana. "Quem é contra o governo, agora toma ainda mais Coca-Cola", disse à Gazeta do Povo o boliviano Javier Rocabado.

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Talvez para intensificar o im­­pacto do novo produto, o go­­verno Morales lançou mão do que pode ser considerada uma campanha de perseguição contra a empresa americana. No co­­meço de julho, criou uma norma contra os contratos de exclusividade de refrigerantes em pontos de venda – estratégica típica do setor. A Pepsi escapou, por en­­quanto, porque passa por um processo de fusão.

"Não se pode criar leis que modifiquem feitos anteriores a ela", lembra à Gazeta do Povo o professor, advogado e especialista em Lei de Propriedade Social Antonio Canova.

Com a investida, Morales busca fazer frente aos EUA, onde a industrialização da folha de coca é permitida e as 400 mil toneladas da erva importadas anualmente vão para a indústria farmacêutica e de refrigerantes. A Coca-Cola nega, mas fontes do setor dão como certo o uso da folha de coca em sua fórmula se­­creta.

Na Bolívia, o plano de industrializar a folha da coca já deu lu­­­­gar a chás, xaropes, licores, doces, bolos e até pasta de dente.