A situação da Venezuela só piora a cada dia que passa. Os preços não dão trégua e a inflação anual deve atingir 1.000.000% ao ano, segundo a última estimativa do Fundo Monetário Internacional (FMI). Só para comparar, é, aproximadamente, a mesma variação de preços que o Brasil teve desde março de 1992, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
“Ter uma inflação anual de 1.000.000% significa que a cada mês você vai ver que os preços são um pouco mais do que o dobro do mês anterior, e não a sua renda”, disse Henkel Garcia, diretor da consultoria venezuelana Econométrica, em sua conta no Twitter.
E, mesmo com tamanha crise, os venezuelanos estão bem distantes do recorde mundial. Um estudo feito por Steve Hanke, professor de economia aplicada da Universidade Johns Hopkins, aponta que a espiral inflacionária do país sul-americano é 23ª maior da história. Mas podem estar chegando lá.
Recorde histórico
O recorde histórico pertence à Hungria, em julho de 1946, quando a inflação diária era de 207%. O tempo necessário para os preços dobrarem era de 15 horas, segundo o estudo de Hanke.
O episódio mais recente de hiperinflação aconteceu no Zimbábue (Sul da África), entre março de 2007 e meados de novembro 2008. A inflação diária chegou a 98% nesse mês, o que fazia com que os preços dobrassem a cada 24,7 horas. O país chegou a esta situação em decorrência da desestruturação da economia, promovida pelo ditador Robert Mugabe, que ficou no poder entre 1980 e 2017.
Segundo o organismo, a Venezuela sofre com a queda na produção de petróleo e o governo vem imprimindo dinheiro (e, portanto, gerando inflação) para cobrir o rombo nas contas públicas. “É uma das mais severas situações de hiperinflação que conhecemos desde o começo do século 20”, diz Robert Rennhack, vice-diretor do FMI para o Hemisfério Ocidental.
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Mesmo com a melhora do preço internacional do petróleo (a cotação do barril subiu mais de 50% nos últimos 12 meses), a produção venezuelana sofre com a falta de investimento e ruma para ser a menor em três décadas.
A previsão anterior do FMI, de abril, apontava que os preços na Venezuela subiriam 12.875% neste ano. Naquele momento nenhum país chegava perto da situação do país sul-americana: os piores cenários eram os do Sudão (alta de 42%) e do Sudão do Sul (96%). A previsão para o Brasil é de inflação de 3,9%.
Causas
A inflação da Venezuela também está em alta porque a economia foi destruída pela corrupção extrema epelas políticas socialistas fracassadas,. Além disso, o presidente Nicolás Maduro - o sucessor de Hugo Chávez, que morreu em 2013 - procurou se apegar ao poder desestabilizando instituições, manipulando os tribunais e, segundo seus críticos, roubando eleições.
As notas da moeda local, quase sem valor, o bolívar, são incrivelmente escassas. O governo tendo dificuldade em pagar pelo papel necessário para imprimi-las. Em vez disso, o governo está simplesmente criando uma grande quantidade de dinheiro eletrônico, o que significa que até mesmo pequenas transações são cada vez mais feitas por meio de cartões bancários e transferências de dinheiro.
Maduro fez algumas tentativas para solucionar o problema, tentando ver o que pegava. Até criou uma cibermoeda, o Petro, teoricamente baseada nas reservas do petróleo. Mas nada tem funcionado, em parte, porque espirais hiperinflacionárias são notoriamente difíceis de serem interrompidas.
As soluções mais extremas, apontadas em um passado recente, para resolver o problema sinalizam para o abandono do bolívar e a adoção, por exemplo, do dólar americano. Entretanto, tal movimento seria uma heresia na Venezuela, onde Maduro descreve os Estados Unidos como o império que quer destruir o país sul-americano.
Subestimativas
O FMI pode, inclusive, estar subestimando a gravidade da hiperinflação da Venezuela. A Ecoanalitica, uma consultoria financeira com sede em Caracas, prevê que a taxa de inflação atinja 1.400.000%.
Para um país que já teve a maior renda per capita da América do Sul, "significa um ciclo brutal de empobrecimento", diz Asdrúbal Oliveros, diretor da consultoria. "Para a maioria dos venezuelanos que dependem de seus empregos e não têm economias em dólar ou recebem ajuda de seus familiares no exterior, uma inflação como esta, que atinge mais de 1.000.000%, os condena à pobreza de maneira drástica".
As maiores hiperinflações da história
Hungria
- Período: agosto de 1945 – julho de 1946
- Mês com a taxa mais elevada: julho de 1946
- Taxa diária de inflação: 207%
- Tempo necessário para os preços dobrarem: 15 horas
Zimbábue
- Período: março de 2007 – meados de novembro de 2008
- Mês com a taxa mais elevada: novembro de 2008
- Taxa diária de inflação: 98%
- Tempo necessário para os preços dobrarem: 24,7 horas
Iugoslávia
- Período: abril de 1992-janeiro de 1994
- Mês com a taxa mais elevada: janeiro de 1994
- Taxa diária de inflação: 64,6%
- Tempo necessário para os preços dobrarem: 1,41 dias
República Srpska*
- Período: abril de 1992-janeiro de 1994
- Mês com a taxa mais elevada: janeiro de 1994
- Taxa diária de inflação: 64,3%
- Tempo necessário para os preços dobrarem: 1,41 dias
Alemanha
- Período: agosto de 1922 – dezembro de 1923
- Mês com a taxa mais elevada: outubro de 1923
- Taxa diária de inflação: 20,9%
- Tempo necessário para os preços dobrarem: 3,7 dias
*A República Srpska era um pseudo-estado, que existiu entre 1992 e 1995, e ocupava parte da atual Bósnia-Herzegovina.
Fonte: Hanke-Krus Hyperinflation Table
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