O ditador da Coreia do Norte, Kim Jong-un, tinha 27 anos quando herdou o poder em 2011, ocupando seu lugar em uma dinastia Kim fundada por seu avô.
O livro "O Grande Sucessor: O Destino Divinamente Perfeito do Brilhante Camarada Kim Jong-un", escrito por Anna Fifield, chefe da sucursal do Washington Post em Pequim, revela detalhes anteriormente não relatados sobre a vida de Kim, que girava em torno do poder , prerrogativas e privilégios. A seguir um relato adaptado da autora.
Infância no luxo
Mesmo nos anos 1980, antes do colapso da União Soviética, a população norte-coreana estava dilacerada pela fome. Mas Kim Jong-un não experimentou nenhuma privação e provavelmente nunca viu o sofrimento de seus companheiros norte-coreanos pessoalmente.
Em vez disso, ele cresceu em um mundo de muros, onde tudo girava em torno dele e a vida era puro luxo.
Nas cozinhas, havia bolos e doces franceses, salmão defumado e patê, e frutas tropicais como manga e melão. Eles usavam roupas feitas especialmente para eles com tecidos britânicos que chegavam em malas Samsonite. Eles escovavam os dentes com Colgate importada, de acordo com as memórias de dois parentes que moravam na casa do meio irmão mais velho de Kim Jong-un.
Havia televisores Sony, computadores e videogames para que pudessem jogar Super Mario. Havia máquinas de pinball e pianos de cauda, Yamahas e Steinways, em todas as casas.
As crianças tinham enormes salas de jogos cheias de brinquedos - com mais brinquedos do que qualquer loja europeia. Havia montanhas de Lego e Playmobil; caixas de quebra-cabeças, mais do que poderiam resolver; e pistolas de plástico com balas surpreendentemente realistas, de acordo com as memórias.
Havia todo tipo de brinquedo de quatro rodas, mas Kim Jong-un também tinha um veículo e uma arma que eram de verdade: um carro que seu pai havia modificado especialmente para que o garotinho pudesse dirigi-lo aos 7 anos. Ele também tinha uma pistola Colt .45, que ele carregava na cintura quando tinha 11 anos.
As casas tinham cinemas amplos e à prova de som, com painéis de madeira para melhorar a acústica e uma cortina de veludo preto que se abria quando as luzes se apagavam. As crianças podiam sentar-se nas poltronas macias e assistir aos filmes "Ben Hur", Drácula ou James Bond.
Havia jardins tão grandes que os chamavam de parques, com cachoeiras artificiais correndo em lagos artificiais. Eles circulavam em carrinhos de golfe ou em ciclomotores. Havia ursos e macacos em gaiolas. Algumas residências tinham grandes piscinas; outras tinham estandes de tiro.
Mas o passatempo favorito de Kim Jong-un era jogar basquete nas quadras das residências oficiais - muitas vezes com crianças trazidas especialmente para jogar com os príncipes.
O menino analisaria obsessivamente os jogos de basquete. Ele apontava os pontos fortes e fracos dos jogadores, elogiando aqueles que considerava ter jogado bem e repreendendo aqueles que não jogaram. Ele parecia estar praticando a arte de comandar e estava gostando do terror que sua autoridade absoluta poderia inspirar.
Ele viveu, no entanto, uma infância solitária. Kim e seu irmão Jong Chol foram educados em casa por professores e não tinham amigos - eles nem sequer brincavam com seu meio-irmão mais velho, Jong Nam, que vivia sua própria vida, separada e isolada. A irmãzinha, Yo Jong, era jovem demais para ser uma boa companheira para as brincadeiras.
A história da mãe de Kim
A Coreia sofreu muito durante sua colonização pelo Japão Imperial na primeira metade do século XX. O país formalmente anexou a Península Coreana em 1910, iniciando trinta e cinco anos de um regime colonial brutal.
Quando o Japão foi derrotado em 1945, teve que desistir do controle da península para os vencedores, mas em ambas as metades da península, as memórias desse período são profundas. Até hoje, a Coreia do Norte ainda demoniza o Japão em sua imprensa estatal.
Mas há um detalhe importante que a propaganda do estado nunca relatou: Kim Jong-un tem uma forte conexão pessoal com o Japão. Sua amada mãe, Yong Hui, que mais tarde seria coroada "Mãe da Grande Coreia Militarizada", nasceu no Japão.
O pai de Yong Hui, Ko Kyon Taek, imigrou para o Japão em 1929 e lá iniciou sua família. Entre 1959 e 1965, a Coreia do Norte lançou uma campanha para incentivar o regresso dos coreanos à terra natal. Ko estava com problemas com a polícia japonesa e acabou voltando à Coreia do Norte com a família.
Para muitos coreanos que haviam deixado um país que rapidamente se transformava em uma potência econômica mundial depois da Segunda Guerra, chegar "em casa" foi uma grande decepção. Alguns se mataram na chegada quando perceberam que haviam sido enganados.
A versão de Pyongyang da vida que os retornados lideravam na Coreia do Norte era, obviamente, muito diferente. Como parte de seus esforços para fingir que a vida era cor-de-rosa, a revista norte-coreana Korean Pictorial apresentou a família Ko em sua edição de dezembro de 1972, sob a manchete "Minha Família Cheia de Felicidade".
A história menciona que a mãe de Kim Jong-un era membro da trupe de arte Mansudae e recebeu uma medalha de Kim Il-sung. Não conta, porém, que as belas dançarinas da Mansudae eram com frequência chamadas para participar de festas regadas a álcool que Kim Jong-il oferecia, e tinham de dançar para os homens de sua corte.
Kim Jong-il se apaixonou por Ko Yong Hui, pedindo a ela que se sentasse com ele nas festas, lembrou outra dançarina da trupe à autora do livro. "Kim Jong-il gostava tanto que vinha muitas vezes a salas de ensaio para assistir o ensaio", escreveu a bailarina em um livro de memórias depois de desertar do regime.
Ko frequentava cada vez menos os ensaios e começaram a circular fofocas de que ela estaria vivendo com Kim Jong-il ou que ela tinha dado à luz seu bebê. Ela se "casou" com Kim Jong Il - a união deles não parece ter sido oficial - em 1975.
Mas a dançarina era mais que uma esposa de troféu. Ela costumava ficar acordada até tarde da noite, revisando documentos com Kim e oferecendo suas opiniões. Certa vez, quando um guarda-costas estava bêbado e apontou com a arma para Kim Jong-il, Ko teria se jogado entre os homens. Ela pode ter nascido no Japão, mas provara ser uma verdadeira patriota, leal não apenas à Coreia do Norte, mas também ao marido poderoso.
Ela também deu a ele dois filhos - considerados na Coreia do Norte como herdeiros que poderiam dar continuidade ao nome da família.
Gênio militar destinado a ser líder
Kim Jong-un cresceu pensando que era especial. A sua oitava festa de aniversário ocorreu em um salão de festas no complexo real em Wonsan. Entre os convidados estavam funcionários de alto nível, e não outras crianças. Kim Jong-un vestia um terno preto e uma gravata borboleta e recebia buquês de flores.
Daquele momento em diante, até funcionários de alto escalão se curvavam a Kim Jong-un sempre que o viam, segundo seus tios que moram nos Estados Unidos há quase 20 anos, depois de terem desertado da Coreia do Norte. Era impossível para o menino crescer como uma criança normal quando as pessoas ao seu redor o estavam tratando assim, disseram eles. E ele rapidamente se acostumou a dar ordens.
Quando menino, Kim Jong-un ficou louco por todo tipo de maquinário, modelos de aviões e navios de brinquedo em particular. Ele queria saber como eles voaram, como eles flutuavam. Mesmo quando tinha oito ou nove anos e ainda estava em Pyongyang, Kim Jong-un ficava acordado a noite inteira fazendo experimentos com seu maquinário - e insistindo em falar com algum especialista ou outro, mesmo nas primeiras horas da manhã, se não conseguisse entender as coisas por si mesmo.
Um dia, em 2010, quando estava prestes a assumir o poder, Kim jong-un disse a um oficial militar que pediu seu conselho sobre um novo modelo de arma que ele "havia desenvolvido uma ligação próxima com aviões e navios de guerra" quando criança.
"Quando eu era menino, eu tinha uma sacola com aviões de brinquedo em algum lugar", disse ele, de acordo com a publicação norte-coreana "Anedotas da Vida de Kim Jong-un". O menino fazia uma pista no quintal e brincava com os pequenos aviões com frequência.
"Ouvindo essa história interessante, o funcionário estava convencido de que o hobby de Kim Jong-un e sua visão de vida estavam relacionadas com os assuntos militares", continua o livro.
Em qualquer outro país do mundo, tal anedota não seria mais do que uma lembrança de infância, mas no universo da propaganda paralela da Coreia do Norte, tornou-se uma parte crucial do seu mito da legitimidade. Não era apenas uma história sobre um menino e seus brinquedos. Era uma prova incontestável de que o garotinho era um gênio militar destinado a ser líder.
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