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Siderúrgica na Itália: risco de nova crise preocupa as empresas | GIANNI CIPRIANO/NYT
Siderúrgica na Itália: risco de nova crise preocupa as empresas| Foto: GIANNI CIPRIANO/NYT

A história sugere que o mundo está em vias de entrar em uma nova crise financeira, e um dos lugares em que ela pode começar, de acordo com um número crescente de indicadores, é a Itália. Muitos dos ingredientes estão lá. Uma grande quantidade de dívidas duvidosas. Bancos fracos. Governo errático. E uma economia de tamanho considerável, capaz de causar danos colaterais fora de suas fronteiras. 

 Investidores de títulos, sempre bons para avaliar a solvência de um país, têm prestado atenção nos sinais. Os planos de gastos populistas do governo de Roma, que nos círculos financeiros são considerados imprudentes, fizeram com que as taxas de juros de mercado sobre a dívida italiana atingissem um pico, ameaçando criar um "doom loop", que causaria uma turbulência na economia já debilitada. 

Os pontos fracos

O orçamento proposto expôs as brechas da coalizão do governo italiano, onde um partido favorece cortes de imposto amigáveis para pequenas empresas, e o outro, programas bastante dispendiosos de bem-estar social. Em uma visão mais ampla, dividiu o governo populista – que prometeu prosseguir com o orçamento que vê como um imperativo político – do

establishment

 Não é preciso ser italiano para se preocupar com as consequências. Crises financeiras tendem a chegar a cada década e a Itália costuma estar no topo de uma lista de focos onde ela pode estourar, ao lado das turbulências econômicas e políticas da Turquia, a guerra comercial travada pelo presidente Donald Trump, a saída do Reino Unido da União Europeia e uma grande desaceleração no crescimento global. 

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 Mas, em contraste com a crise financeira que começou em 2008, os bancos centrais podem não ter capacidade de fazer um resgate desta vez, disse Richard Portes, professor de economia na London Business School. Eles usaram boa parte de seus recursos para se salvar do último colapso. "Seria muito difícil para Mario Draghi pensar em outra saída para essa bagunça", disse Portes, referindo-se ao presidente do Banco Central Europeu. 

 É por isso que os investidores estão tão preocupados com a Itália. A zona do euro ainda se recupera de uma crise da dívida que começou na Grécia em 2010. A Itália, a terceira maior economia do bloco monetário, representa 11% do produto interno bruto da União Europeia – 10 vezes mais do que a Grécia – e tem potencial maior de criar danos. 

 Muitos dos problemas do país são antigos, como o número anormal de empréstimos problemáticos nos balanços dos bancos e o crescimento cronicamente lento. A economia italiana ainda não se recompôs totalmente da crise financeira de 2008. O novo elemento é o governo populista da Itália, que, para o horror das autoridades da União Europeia e dos mercados de títulos, está prometendo dinheiro que não tem para cumprir promessas de campanha. 

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 Ao contrário dos governos italianos anteriores que tentaram se rebelar, mas acabaram cumprindo as exigências da União Europeia, os populistas da Itália basearam suas carreiras na oposição à Bruxelas. Eles estão seguindo um caminho de confronto aberto com a Comissão Europeia, não importa a reação do mercado ou as consequências para os italianos que investem e que estão entre os maiores detentores de títulos do governo. 

 "Os inimigos da Europa são aqueles que se protegem no bunker de Bruxelas", disse Matteo Salvini, o líder da Liga, anti-imigrante, e o político mais poderoso do país. Ele repetidamente chamou o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, e o comissário de economia, Pierre Moscovici, de vilões que "arruinaram a Europa e o nosso país" através de medidas de austeridade. 

 Plano de gastos

O plano de gastos proposto pela Itália exige um déficit igual a 2,4% do PIB, uma previsão considerada elevada demais para um país cuja dívida pública total equivale a 131% do PIB, mais do que o dobro do limite da zona do euro. 

 O governo anterior de centro-esquerda tinha proposto um orçamento com um déficit de 0,8%, o que teria permitido que a Itália reduzisse sua dívida total. 

 Uma parcela significativa do novo orçamento iria para um programa de bem-estar amplo, uma promessa de campanha chave do Movimento 5 Estrelas para sua base jovem, desempregada e frustrada, muitos provenientes do melancólico sul do país. "De forma decisiva, com esta medida, com este orçamento, teremos abolido a pobreza", disse Luigi Di Maio, líder político do Movimento 5 Estrelas e Ministro do Desenvolvimento Econômico da Itália, em setembro. 

 Um relatório negativo sobre o orçamento proposto pela Fitch Ratings no dia 10 de outubro injetou ansiedade extra nas negociações do orçamento. Em seu relatório, a Fitch citou o "método desordenado" da apresentação orçamentária e a discordância entre o Movimento 5 Estrelas e a Liga sobre as prioridades fiscais, a falta de detalhes sobre as propostas fiscais e o abismo entre o "alto custo de implementação das promessas de política básica e o objetivo de reduzir a dívida pública". 

Hostilidade em relação à União Europeia

Além disso, o tom hostil que os italianos têm direcionado à União Europeia, a única coisa que ajudou a colocá-los no poder, "indica que o governo vê uma oportunidade política no ataque às regras fiscais da UE, especialmente na campanha para as eleições parlamentares europeias em maio do ano que vem", disse o relatório. 

A Fitch sinalizou que poderia baixar a classificação da dívida da Itália, um passo que se correspondido por outras agências de classificação aumentaria ainda mais o custo de empréstimos do governo. 

 O governo cortou algumas despesas, mas em categorias que ainda provocam Bruxelas. Por exemplo, Roma suspendeu planos para adquirir um novo sistema de defesa de mísseis em um momento em que a Europa está tentando apaziguar Trump por meio de um gasto maior com a OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte). 

 O plano de gastos foi "um desvio significativo do caminho fiscal" recomendado por líderes europeus e "é, portanto, uma séria fonte de preocupação", Moscovici e Valdis Dombrovskis, o vice-presidente da Comissão Europeia, escreveram ao governo italiano no dia 5. 

 No entanto, autoridades em Bruxelas enfrentam um dilema. Elas irão perder credibilidade se não disciplinarem um membro errante. Mas se forem muito duras, apenas farão Bruxelas se tornar um bode expiatório conveniente para os políticos italianos. 

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 Por isso, é provável que os dirigentes europeus iniciem um processo que pode levar a sanções, como o corte dos fundos da União Europeia, mas de modo cauteloso. "Eles terão que fazer alguma coisa, mas têm que ser no tempo certo", disse Grégory Claeys, pesquisador do Bruegel, um think tank em Bruxelas. 

 O governo italiano, pelo menos por enquanto, parece manter a popularidade e ficar imune à dor eleitoral. Quando o Parlamento italiano aprovou a proposta orçamentária no final de setembro, Di Maio e seus aliados do Movimento 5 Estrelas a levaram para a varanda do Palazzo Chigi, a sede do governo italiano, fazendo sinais de vitória enquanto uma multidão de legisladores e apoiadores abaixo deles gritava "Luigi! Luigi!" 

Mas o apoio público pode vacilar se os investidores continuarem a perder confiança na dívida italiana, o que teria consequências graves para a economia. "A dívida é o grande gerador de turbulências na Itália. As oscilações em seu valor também têm efeito sobre os italianos, suas famílias, empresas e instituições financeiras que o garantem", disse Luigi Federico Signorini, diretor-geral adjunto do Banco da Itália, para uma audiência parlamentar no dia 9 de outubro. 

 As pesquisas mostram que os italianos não querem desistir do euro, um fato que pode conter o governo, que já mostrou no passado que reage à pressão, indicando Giovanni Tria para o Ministério das Finanças, escolha mais moderada depois que foram apresentadas objeções à escolha inicial de Paolo Savona, economista que chegou a escrever sobre a saída da zona do euro. 

 A provocação a Bruxelas tem sido uma estratégia política vencedora na atual safra de líderes italianos e eles não demonstram sinais de desistência. "Nós nos preocupamos com os mercados", disse Di Maio no início de outubro. Mas confrontado com uma escolha entre rendimentos de títulos e o povo italiano, acrescentou: "Eu escolho o povo italiano".  

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