Deve haver um relógio do juízo final batendo no palácio presidencial da Venezuela. Em 10 de janeiro, o presidente Nicolás Maduro tomará posse para um segundo mandato após eleições fraudulentas em maio passado. A oposição – com sua coalizão desarticulada, com seus líderes na prisão ou no exílio – boicotou em grande parte a votação. Os Estados Unidos, o Canadá e os maiores países da América Latina, incluindo o Brasil e a Argentina, prometeram não reconhecer os resultados.
O fim do mandato de Maduro deveria sinalizar o início de seu total isolamento diplomático.
Mas em vez disso, espera-se que os governos latino-americanos pouco façam, além das promessas de faltar às cerimônias em Caracas. Mesmo com o colapso da Venezuela produzindo milhões de migrantes, seus vizinhos estão mostrando pouca vontade de reunir uma resposta significativa ao regime criminoso do país.
Existem várias razões para a falta de ação regional. Embora a posse ofereça uma oportunidade para ampliar a pressão sobre Maduro, essa é apenas a mais recente de uma série de provocações. Afinal, Maduro – que substituiu Hugo Chávez após sua morte em 2013 e venceu uma eleição especial no final daquele ano – há muito tempo governa de forma autocrática. Em outubro de 2016, ele anulou um referendo revogatório que o teria tirado do cargo. No mês de julho seguinte, ele estabeleceu uma assembleia constituinte para usurpar as responsabilidades do congresso liderado pela oposição no país.
Os governos latino-americanos têm uma forte história de não-intervenção nos assuntos de seus vizinhos. O ressentimento da intromissão europeia e dos EUA é fundamental para a identidade regional, e os líderes hesitam em julgar seus pares. Por exemplo, apesar de uma notável onda de democratização nos anos 80, há uma aceitação generalizada da ditadura cubana.
Há também um problema de amplitude, uma vez que a repressão da Nicarágua à dissidência sobrecarrega a capacidade de mobilização da região.
Além disso, a eleição do México em julho do esquerdista Andrés Manuel López Obrador ameaça prejudicar a resposta da região à crise na Venezuela.
Sob o governo do ex-presidente Enrique Peña Nieto, o México abandonou sua tradicional política externa menos interventiva e foi líder na Organização dos Estados Americanos e no Grupo de Lima – um conjunto informal de países comprometidos com a defesa agressiva da democracia decadente da Venezuela. Na sexta-feira (4), o grupo endureceu sua posição contra a reeleição de Maduro e ameaçou impor sanções financeiras. Mas, historicamente, esses países se contentam apenas com declarações. Além disso, o México parece estar se aproximando de Caracas: López Obrador convidou Maduro para sua posse e se opôs à linha mais dura do Grupo de Lima, diminuindo muito a influência do grupo.
Mas as baixas expectativas de Washington também contribuíram para as mais graves crises políticas, econômicas e humanitárias da história moderna da América Latina. Nós dois trabalhamos na política da Venezuela no Conselho de Segurança Nacional nos últimos anos – um de nós para o presidente Barack Obama, o outro para o presidente Donald Trump. Nos últimos três anos, enquanto os governos latino-americanos minimizavam sua confortável neutralidade, a Casa Branca celebrou a crescente oposição a Maduro, mas não pediu mais aos vizinhos da Venezuela.
Na Organização dos Estados Americanos, os aliados da Venezuela – companheiros de viagem socialistas como a Bolívia e vassalos caribenhos que se beneficiaram das remessas de petróleo subsidiadas da Venezuela – frustraram a ação coletiva. No entanto, os maiores países da América Latina reuniram coalizões ad hoc para produzir declarações condenatórias sobre a ditadura repressora e causadora de miséria de Maduro. Em dezembro de 2016, membros do Mercosul – Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai – suspenderam a participação da Venezuela.
Mas a resposta da América Latina agora está paralisada, apesar do contínuo agravamento das condições.
Por muito tempo, os aliados dos EUA na região receberam elogios demais por pouca ação.
É hora de exigir mais da América Latina. Especificamente, os governos latino-americanos deveriam adotar sanções unilaterais para punir os cleptocratas cujo roubo, incompetência e brutalidade empobreceram um país rico em petróleo que já foi um dos mais ricos da América Latina.
Os Estados Unidos vêm impondo sanções à Venezuela há anos, visando os traficantes de drogas e os violadores de direitos humanos no governo de Maduro. Entre outros, o Tesouro dos EUA colocou na lista negra o presidente, a vice-presidente e a primeira-dama da Venezuela. Em novembro de 2017, a União Europeia também aprovou sanções contra Caracas.
Mas na América Latina, apenas o Panamá concordou em sancionar a Venezuela. O resto da região insiste que suas mãos estão atadas por restrições constitucionais e autoridades legais inadequadas. Líderes rejeitaram ofertas de advogados do governo dos EUA para ajudar a redigir legislação sobre sanções. Em vez disso, eles se escondem por trás de sua preferência por ação multilateral – improvável na paralisada Organização dos Estados Americanos e impossível no Conselho de Segurança das Nações Unidas, onde China e Rússia, aliados venezuelanos, não cumpririam uma resolução de sanções.
Os países latino-americanos devem encontrar maneiras de superar os obstáculos às sanções, seja propondo novas leis ou identificando ferramentas alternativas, como processos criminais para lavagem de dinheiro ou tráfico de drogas ocorridos em suas jurisdições, seguidos de alertas vermelhos da Interpol que de fato impediriam autoridades venezuelanas criminosas de sair de seu país para sempre.
Ao contrário de outras regiões, a América Latina – marcada por uma história de ditaduras militares brutais – declarou a democracia como a única forma aceitável de governo. É um requisito para a participação em órgãos regionais, até mesmo parcerias comerciais.
Para cumprir esse compromisso, os líderes latino-americanos não devem mais tratar Maduro como seu colega. Em vez disso, Maduro e seu círculo próximo devem ter acesso negado aos sistemas financeiros da América Latina. Membros de seu regime, e seus parentes, não poderiam viajar pela América Latina, seja com passaportes oficiais ou como turistas. Seus embaixadores deveriam ser declarados personae non gratae e mandados de volta para casa.
Essas ações estão atrasadas. O dia 10 de janeiro é o momento certo para recuperar o tempo perdido.
*Gedan, assessor sênior do Programa Latino-Americano do Centro Internacional de Acadêmicos Woodrow Wilson, foi diretor da América do Sul na Casa Branca durante o governo do presidente Barack Obama. Cutz, um associado sênior do Grupo Cohen, ocupou o mesmo cargo no governo do presidente Donald Trump.