Sede da FSB, o serviço secreto russo, sucessor da KGB| Foto: SERGEY PONOMAREV/NYT

O vasto aparato de segurança da Rússia muitas vezes exibe seu poder através de ações brutais: policiais em manifestações agredindo a população ou assassinos misteriosos atacando e ocasionalmente matando políticos da oposição e jornalistas. 

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Uma face mais suave e insidiosa do sistema, no entanto, pertence ao homem cortês, sorridente e bem vestido que, carregando um buquê de flores, apareceu de repente, no início do mês passado, no apartamento no 9° andar de Nataliya Gryaznevich, em Moscou. 

O homem, que se apresentou apenas como "Andrei", disse a Gryaznevich, funcionária de 29 anos de um grupo pró-democracia chamado Open Russia, que gostaria de convidá-la para um café e uma conversa amena. "Parece que você realmente gosta de café", disse ele, insinuando que sabia muitas outras coisas sobre ela. 

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"Ele agiu como um velho amigo que eu não reconhecia", recorda-se Gryaznevich. 

Embora inicialmente assustada, ela entendeu o que estava acontecendo quando se conheceram e ele a encheu de perguntas sobre suas viagens ao exterior e seus contatos estrangeiros. "Andrei" estava tentando recrutá-la como informante. 

"Vamos ser amigos", ela se lembra de ouvi-lo dizer. "Pense em você. Quer fazer carreira, e pode ir longe com a gente a seu lado." Seu relato da tentativa de recrutamento, que segundo ela não conteve ameaças, mostra um pouco dos aspectos mais secretos e sinistros do sistema de segurança da Rússia. 

Prática revivida

Conhecidos em russo como stukachi – literalmente, "aquele que bate à porta" – um termo soviético de etimologia incerta, os informantes basicamente trabalham como espiões para o Estado russo, dentro do país e no exterior. Estão longe de ser tão onipresentes na Rússia hoje quanto eram na Alemanha Oriental ou a União Soviética, onde milhões denunciavam amigos e colegas. 

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Mas depois de ser banida no início dos anos 1990, a prática de convencer os russos a passar informações sobre seus compatriotas novamente parece ter se espalhado. 

As autoridades estão ávidas por informações privilegiadas sobre a oposição interna desde que grandes manifestações antigovernamentais explodiram do nada, no início de 2011, incomodando muito o Kremlin. Uma nova onda de protestos que começou em maio de 2017, mesmo sendo menor que a anterior, também foi uma surpresa, aumentando o valor das informações internas. 

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É impossível saber quantas pessoas estão servindo de informantes: as únicas que falam sobre a tentativa de recrutamento são as que recusaram. 

Viktor Veronkuv, diretor do Centro de Pesquisa Social Independente em São Petersburgo, disse ao jornal russo Novaya Gazeta, no início deste ano, que quatro membros de sua equipe tinham lhe contado sobre abordagens de recrutamento feitas pelo Serviço de Segurança Federal, ou FSB, o sucessor da KGB. 

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Contatado recentemente, ele disse que não tinha ouvido falar de outras tentativas, mas assumiu que muitos outros funcionários haviam sido abordados. "Acredite em mim, é raro as pessoas relatarem essas coisas", disse ele, acrescentando que muitos dos que são abordados são convidados a assinar acordos de não divulgação. 

Profissão em alta

Um sinal claro de que os serviços de segurança estão novamente no mercado de informantes veio em 2016, quando a Life, um serviço de notícias russo que é muitas vezes utilizado pelo FSB como um canal de informações, revelou que informantes aposentados receberiam pensões estaduais em troca de seu serviço. No passado, esse incentivo só era oferecido aos empregados em período integral da agência da inteligência. 

Porém, o principal estímulo para servir como informante não é dinheiro, mas a promessa de que os problemas legais desapareçam como em um passe de mágica. 

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Convencido de que o descontentamento na Rússia é em grande parte culpa de forças estrangeiras hostis, o aparato policial nacional tem cada vez mais focado em se infiltrar em organizações com ligações reais ou imaginárias com estrangeiros, segundo Mark Galeotti, especialista no sistema de segurança da Rússia no Instituto de Relações Internacionais em Praga. 

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"A busca por informantes tem muito mais foco hoje do que na União Soviética, quando a KGB recheava sua lista com pessoas que faziam fofocas de escritório inúteis e diz-que-diz doméstico", disse ele. A ênfase hoje está em encontrar quem possa ter informações internas reais sobre organizações terroristas como o Estado Islâmico, assim como grupos estrangeiros pacíficos que promovem a democracia, que o Kremlin vê como uma ameaça perigosa. 

Kremlin não gosta de ONGs

Inúmeros grupos estrangeiros sem fins lucrativos foram declarados "indesejáveis" e uma ameaça à segurança nacional da Rússia, incluindo o posto de Londres da organização de Gryaznevich, a Open Russia. 

O Kremlin está particularmente preocupado com grupos como esse, segundo Galeotti, por causa de suas ligações com Mikhail Khodorkovsky, um bilionário russo exilado que, depois de quase uma década em campos de prisioneiros, agora vive em Londres e financia uma vasta gama de projetos destinados a promover a democracia e as liberdades civis em seu país. 

A Open Russia, cujo escritório de Moscou foi invadido duas vezes pelas autoridades, diz que recebe algum financiamento de Khodorkovsky, mas não de seus grupos londrinos que foram declarados "indesejáveis". Representantes do grupo na Rússia insistiram que não são uma organização, mas mais uma aliança de pequenos grupos da sociedade civil, totalmente russos. 

Assustada, mas também intrigada com os motivos e a identidade do estranho que apareceu em sua porta com flores, Gryaznevich pegou seu número de telefone. Depois de ligar para seu chefe na Open Russia para pedir conselhos, ela concordou em encontrá-lo. 

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"Eu não tinha ideia de quem ele era ou o que queria, mas era muito educado e falava bem", lembra-se Gryaznevich, que havia recentemente retornado da cidade oriental de Vladivostok depois de passar uma noite presa por ajudar a organizar uma conferência lá patrocinada pela Open Russia. 

Enquanto tomavam café, "Andrei" rapidamente deixou claro que sabia tudo sobre seus problemas com a polícia em Vladivostok – e uma quantidade desconcertante de fatos sobre a vida dela em geral, incluindo suas viagens ao exterior em nome da Open Russia. 

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O homem se ofereceu para ajudá-la a resolver seus problemas legais, explicando que seu advogado "não pode protegê-la, mas nós podemos" – desde que retribuísse, ajudando também. 

Sua proposta, disse, era a seguinte: se ela concordasse em se encontrar uma vez por semana para fornecer informações, especialmente sobre seus contatos estrangeiros – quem eram, o que estavam fazendo e por quê –, não precisaria mais se preocupar com perseguições da polícia e ameaças de prisão. "Podemos resolver todos esses problemas", ela se lembrava de ouvi-lo dizer. 

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Contou que "Andrei" mostrou pouco interesse nas atividades da Open Russia no país, pois parecia já saber muita coisa, mas estava interessado na interação com os estrangeiros. 

A única vez que ele traiu seus modos cuidadosamente educados, acrescentou, foi depois que ela se recusou a servir de informante e negou seu pedido de manter a reunião em segredo. E mesmo assim, ele não partiu para as ameaças brutas, muitas vezes associadas à polícia secreta da Rússia. "Obviamente, não era a primeira vez que ele fazia esse tipo de coisa", concluiu ela. 

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