A manhã de 11 de outubro de 1962, todos os sinos de Roma ecoavam enquanto 2.540 bispos de todo o mundo entravam, em procissão, na Basílica de São Pedro e assumiam seus lugares, à espera de João XXIII, o "Papa bom". Ele chegou na sédia gestatória, a tradicional cadeira levada por ajudantes, e usava a coroa papal de três camadas, chamada tiara. O pontífice se ajoelhou perto do altar e começou o "Veni, Creator Spiritus", hino que invoca a presença do Espírito Santo. Celebrou missa, recebeu a obediência dos presentes e liderou uma série de orações. Naquele dia começava a maior aventura da Igreja no século 20, o Concílio Vaticano II, que completa 40 anos de seu encerramento na próxima quinta-feira.
"Eu era um bispo jovem, sagrado em 1957. Jamais pensei que poderia participar de um acontecimento histórico como este", recorda dom Jaime Coelho, arcebispo emérito de Maringá, que tinha 46 anos quando o concílio começou. João XXIII havia sido eleito em 1958 para ser um "pontífice de transição", ou seja, reinar sem maiores turbulências e por pouco tempo, depois dos quase 20 anos de papado de Pio XII. Em vez disso, resolveu sacudir o mundo católico com menos de três meses de papado. No encerramento de uma semana de orações pela unidade dos cristãos, em janeiro de 1959, anunciou um novo concílio ecumênico, reunião de todos os bispos da Igreja.
"Que o depósito sagrado da doutrina cristã seja guardado e ensinado de forma mais eficaz. O concílio quer transmitir pura e íntegra a doutrina, sem atenuações nem subterfúgios", pediu o Papa naquela manhã de outubro de 1962. Ao contrário de outros concílios, o Vaticano II não tinha sido convocado para propor alguma verdade de fé ou combater heresias. A palavra de ordem era "aggiornamento" termo italiano para atualização. "O concílio não deveria ser combativo. Tratava-se de dialogar com a modernidade, mas segurando a dogmática", define o professor Mário Betiato, do curso de Teologia da Pontifícia Universidade Católica (PUCPR). Ou, como dizia o próprio João XXIII, "deixar entrar ar fresco na Igreja".
O encanto da abertura do concílio se prolongou até a noite, como lembra o cardeal Serafim Fernandes de Araújo, arcebispo emérito de Belo Horizonte, que tinha sido nomeado bispo auxiliar da capital mineira seis dias antes da convocação do concílio: "mais que da manhã, eu lembro da procissão à luz de velas na Praça de São Pedro. O Papa disse olhem a lua!, e acrescentou: voltem para suas casas e levem a minha bênção como um lenço, capaz de enxugar todas as lágrimas, desde as da criancinha até as da pessoa mais idosa. Foi inesquecível!".
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