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Marketing político

A vez dos azarões

Nick Clegg | Ben Stansall/AFP
Nick Clegg (Foto: Ben Stansall/AFP)
Mockus |

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Mockus

O candidato a primeiro-ministro do Reino Unido pelo partido Li­­beral-Democrata, Nick Clegg, é um orador exemplar. O aspirante do Partido Verde à presidência da Colômbia, Antanas Mockus, é vi­­sivelmente tímido diante de plateias. Clegg fala rápido, enfatizando as sílabas tônicas enquanto bate com os punhos na mesa. Mockus desvia o olhar da câmera e se concentra nas mãos a gesticular. Clegg é esbelto, tem olhos azuis e corte de cabelo estilo executivo. Mockus é informal, usa óculos e barba de filósofo grego. Clegg é sério, quase tenso. Mockus é suave, algo divertido. Clegg é agressivo. Mockus é irônico.

Embora constituam uma oposição, os dois candidatos partilham duas características em comum: a estratégia de campanha, inspirada em Barack Obama, e o fato de terem passado de azarões a favoritos para se tornarem os próximos chefes de Estado de seus países.

As últimas pesquisas divulgadas na Inglaterra mostram que Nick Clegg, de 43 anos, tem a preferência de 28% do eleitorado, tecnicamente empatado com David Cameron (Partido Con­­ser­­vador). O trabalhista Gordon Brown, atual primeiro-ministro, tem 22% das intenções de voto. Mesmo que Clegg não seja apontado primeiro-ministro, o resultado do pleito desta quinta-feira dá a ele e a seu partido um papel fundamental no processo político. Com os votos angariados pelos liberais democratas, a legenda poderá escolher com qual dos dois partidos irá se coligar para formar o bloco hegemônico que terá o direito de apontar o próximo premier.

Clegg alcançou destaque na corrida presidencial após a realização do primeiro debate televisionado da história da política britânica. Curtas e discretas, as campanhas britânicas foram subvertidas pelo candidato com uma facilidade de se expressar que é reconhecida até pelos adversários. "Este evento pode parecer um concurso de popularidade na tevê, mas na verdade estamos fa­­lando do futuro da Grã-Bre­­ta­­nha", contra-atacou Brown no segundo debate.

Os temores de Brown são justificáveis. Desde a realização do primeiro debate, em 15 de abril, a Inglaterra vive a Cleggmania, acontecimento cultural que pode ganhar proporções devastadoras em um país que inventou os Bea­­tles, a mãe de todas as manias.

Para o cientista político Mark Wickham-Jones, professor da Uni­­­­v­­­­ersidade Bristol, a ascensão de Clegg é reflexo do desgaste dos partidos tradicionais do Reino Uni­­­­do. "Trabalhistas e conservadores não conseguiram mobilizar o eleitorado nos últimos anos, e Clegg tem se destacado justamente por ser novo e ninguém ter ouvido falar dele anteriormente. Ele é estiloso e e carismático, mas até agora é impossível avaliar quanta substância Clegg tem de fato", avalia ele para a Gazeta do Povo.

Além de facilidade de comunicação, Clegg conseguiu emplacar uma estratégia eleitoral ins­­pirada na campanha vencedora de Barack Obama em 2008, a ponto de começar a ser chamado de "Obama britânico". As palavras "mudança" e "es­­perança" estão encalacradas no discurso do liberal-democrata. Ele se define como um político diferente dos outros dois postulantes ao cargo, escaldados pelo escândalo de corrupção que estourou no Parla­­mento britânico no ano passado.

Clegg também evoca sua ascendência cosmopolita (a mãe é holandesa e o pai é russo). Tem um discurso contundente contra a guerra, mas faz ressalvas para operações estratégicas. "Não sou contra todas as guerras, somente contra as guerras estúpidas", afirma.

Clegg é louvado pelos correligionários por ser o principal responsável por reerguer o partido Liberal-Democrata. A legenda foi uma importante força política na Inglaterra até 100 anos atrás, quando começou a declinar ao ponto de se tornar um figurante na disputa entre conservadores e trabalhistas, que se alternam no poder há 60 anos. Com a liderança de Clegg, os "lib-dems" voltaram para o primeiro plano. "Com o apoio conquistado pela opinião pública, os lib-dems terão condições de balancear o poder com os outros dois partidos após a eleição. Este será o momento em que o partido vai decidir de fato qual linha ideológica seguirá", estima Wickham-Jones.

Mão aberta

Em outro po­­lo e hemisfério, a América Latina acompanha o sur­­gimento de seu próprio projeto de Obama. Au­­re­­lijus Ru­­te­­nis An­­tanas Mo­­ckus Si­­vickas é o nome completo do candidato que assumiu na sexta-feira a liderança nas pesquisas de intenção de voto para presidente da Colômbia. Com 38% das intenções de voto, abriu dez pontos porcentuais sobre Juan Ma­­nuel Santos, candidato da situação apoiado pelo presidente Álvaro Uribe. As eleições ocorrem em 30 de maio.

Filho de imigrantes lituanos, o político de 58 anos consolidou a carreira após dois mandatos co­­mo prefeito de Bogotá (1995-1998 e 2001-2004). A principal lembrança que deixou na cidade fo­­ram as campanhas pouco conven­­cionais, algumas com a participação do próprio prefeito. Ele se vestiu de super-herói para combater a pichação, tomou banho na tevê para conscientizar os es­­pectadores sobre a preservação da água e contratou mímicos para "punir" motoristas mal-educados com um sorriso.

Seus atos políticos, embora às vezes descambem para a ingenuidade, conseguem sensibilizar a fatia jovem do eleitorado. "Se os eleitores me garantirem a vitória no primeiro turno, poderíamos economizar o segundo turno e com isso daria para instalar 20 colégios nos lugares mais necessitados do país", garantiu.

Com poucos recursos e visibilidade reduzida, Antanas Mockus lançou sua campanha presidencial com um vídeo divulgado pelo YouTube. Na mensagem, Mockus diz que seus eleitores são polegares virados para cima, e o dever de cada polegar é ajudar a abrir toda a mão, ou seja, conquistar outros quatro votos para o candidato.

As ações na internet alavancaram a candidatura. "A conexão de Mockus com os eleitores jovens é total, principalmente com mobilizações on-line. É um eleitorado muito ativo, que viu em Mockus o candidato que encampa a bandeira anticorrupção", re­­lata à Gazeta do Povo o cientista político Alejo Vargas, professor da Uni­­ver­­si­­dade Nacional da Colômbia.

O discurso de Mockus também é livremente inspirado na estratégia obamista. Mockus se define como um político independente que pretende deixar velhas rivalidades para trás e congregar a oposição. Discorda da importância dada pelo governo Uribe ao combate às Farc e promete esforços diplomáticos para encerrar a rixa com a Vene­­zuela de Hugo Chávez.

Mockus concorre pelo Partido Verde, mas, no caso colombiano, o nome desta legenda não traduz a sua plataforma, e a causa ecológica não está entre as prioridades. "O candidato verde não representa uma mudança de po­­lítica, apenas de estilo", analisa Vargas. "Mo­­ckus tem uma maneira mais pedagógica de expor suas ideias. Porém, ainda falta um mês para as eleições, e na Colômbia es­­te é um período em que tudo pode acontecer".

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