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O Lago Mono, onde foram coletadas as bactérias GFAJ-1,  é três vezes mais salgado do que o oceano | Creative Commons
O Lago Mono, onde foram coletadas as bactérias GFAJ-1, é três vezes mais salgado do que o oceano| Foto: Creative Commons
  • Felisa Wolfe-Simon recolhe amostras de bactérias às margens do Lago Mono
  • Entenda a descoberta da bactéria feita por pesquisadores da Nasa

Washington - Sinais de que uma bactéria é ca­­paz de substituir o nutriente es­­sencial fósforo por arsênio – um elemento tóxico para a maioria das formas de vida conhecidas – expande o horizonte para a busca de vida fora da Terra, anunciam os cientistas que assinam pesquisa descrita no serviço on-line da re­­vista Science, o Science Express.

Todas as formas de vida conhecidas até hoje – plantas, animais e micro-organismos – dependem de seis elementos químicos para construir as moléculas que compõem seus corpos: oxigênio, hi­­drogênio, carbono, fósforo, enxofre e nitrogênio. A bactéria descoberta pela equipe de cientistas li­­derada por Felisa Wolfe-Simon, da Pesquisa Geológica dos Estados Unidos, seria a primeira exceção conhecida à regra.

Não se trata de uma exceção trivial: o fósforo faz parte da estrutura do DNA e é um componente do ATP, a molécula usada para transportar energia no metabolismo celular.

Batizado de GFAJ-1, o novo or­­ganismo foi encontrado em sedimentos do Lago Mono, da Cali­­fórnia, nos Estados Unidos. O lago é extremamente salgado e conta com níveis elevados de arsênio, um elemento que fica logo abaixo do fósforo na Tabela Periódica.

"A vida como a conhecemos re­­quer alguns elementos químicos em particular e exclui outros", disse, em nota divulgada pela Uni­­versidade Estadual do Arizona, um dos coautores do estudo, Ariel Anbar. "Mas seriam essas as únicas opções? Como a vida poderia ser diferente?"

Um dos princípios da busca por vida em outros planetas, acrescenta Anbar, é que os cientistas devem "seguir os elementos". "O estudo mostra que temos de pensar me­­lhor em que elementos seguir", acredita.

A ideia de que arsênio poderia substituir fósforo já havia sido apresentada por Felisa, Anbar e por Paul Davies – que também as­­sina o artigo na Science Express – em trabalho publicado em 2009 no International Journal of Astrobiology.

"Nós não apenas sugerimos que sistemas bioquímicos análogos aos conhecidos hoje poderiam usar arseniato (composto de arsênio e oxigênio) no papel equivalente do fosfato", diz Felisa. "Mas também que esses organismos poderiam ter evoluído na Terra an­­tiga e persistir em ambientes incomuns até hoje."

A pesquisa foi feita em parceria com a Nasa. O anúncio de que a Science desta semana traria um artigo patrocinado pela agência espacial sobre astrobiologia – a ciência que explora as possibilidades de vida fora da Terra – causou uma onda de boatos na internet, sobre a possível descoberta de alienígenas.

A descoberta – depois de recolher lama do fundo do Lago Mono – que é três vezes mais salgado do que o oceano – os pesquisadores passaram a cultivar, em laboratório, os micróbios extraídos dali, usando uma dieta onde entravam doses crescentes de arsênio.

A taxa de arsênio em relação a fósforo no meio de cultura foi sendo ampliada paulatinamente, com a transferência de populações de bactérias para meios cada vez mais pobres no elemento tradicional da vida e cada vez mais ricas no material tóxico, até um ponto onde qualquer bactéria que ainda estivesse produzindo DNA, ATP e outras moléculas que dependem de fósforo fosse forçada a usar arsênio no lugar – ou morrer.

Quando o microscópio revelou que havia micróbios vivos mesmo no meio de cultura mais concentrado, uma série de análises delicadas foi realizada para determinar se o arsênio estava mesmo sendo utilizado como "material de construção" pelas bactérias.

Os testes revelaram que o arsênio estava realmente dentro das células. Depois, com o uso de ma­­terial radiativo baseado em arsênio, os cientistas conseguiram encontrar sinais do elemento em fragmentos de moléculas de proteína, gordura e material genético.

Aprofundando a análise, a equipe determinou a presença de arsênio no DNA purificado das bactérias. Testes com raios X de alta intensidade indicaram que o arsênio presente ali estaria cumprindo uma função química, dentro da molécula de DNA, análoga à do fósforo.

Davies, um físico que vem se especializando na questão da busca por vida extraterrestre, acredita que o micróbio GFAJ-1 é apenas "a ponta do iceberg". "Isso tem o potencial de abrir um novo domínio na microbiologia", disse ele, também por meio de nota. Felisa acrescenta: "Se uma coisa na Terra pode fazer algo tão inesperado, o que mais a vida pode fazer que não vimos ainda?"

Outros cientistas, no entanto, preferem manter cautela e esperar por mais provas de que a bactéria faz tudo o que seus descobridores alegam.

Ouvido pela revista Science, o microbiólogo Robert Gunsalus, da Universidade da Califórnia, afirma que "ainda há muito a fazer an­­tes de pôr esse micróbio no ma­­pa da biologia".

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