Papa Massata Diack, 52 anos, acusado de participar de um dos maiores esquemas de corrupção do esporte global, é um rosto familiar nos hotéis mais sofisticados do Senegal. Recentemente, foi cumprimentado por meia dúzia de pessoas ao cruzar o lobby do Pullman Teranga.
Vestindo seu habitual boubou branco, ele se sentou a uma mesa de canto com vista para o Atlântico. Sua irmã Awa carregava uma mochila preta contendo inúmeros documentos que ele havia reunido para se defender.
As acusações criminais contra Diack são tão numerosas e tão variadas que ele sugeriu um plano para sua entrevista: Awa tomaria notas e, por fim, pegaria os documentos, incluindo vários relatos da mídia, da pilha, que vem expandindo conforme as acusações vão se somando.
"Essa é a maior mentira do mundo dos esportes. Posso aceitar ser acusado, mas nunca provaram que sou o marco zero de tudo isso", disse Diack, procurado por autoridades francesas.
Filho de um ex-líder do órgão dirigente do atletismo mundial, Diack é o centro de uma investigação de corrupção cada vez maior que abrange quatro continentes. Promotores de justiça alegam que ele passou anos nos bastidores, praticando subornos no esporte, na política e nos negócios, envolvido em um esquema para encobrir resultados de testes antidoping e que possibilitou a compra de votos em competições para sediar grandes eventos desportivos, incluindo os Jogos Olímpicos.
Milhões de dólares em pagamentos ilícitos foram transferidos através de contas controladas por Diack ou seus associados, de acordo com o Ministério Público do Brasil e da França que, em janeiro de 2016, emitiu um mandado internacional de prisão contra ele.
Seu pai, Lamine Diack, um dos homens mais poderosos nos esportes durante seu reinado de 16 anos como chefe da Associação Internacional de Federações de Atletismo, conhecido como IAAF, está detido na França desde novembro de 2015 sobre alegações de ter aceitado subornos para encobrir violações de doping de atletas russos.
Mais recentemente, as conexões com os Diacks levaram à detenção de Carlos Arthur Nuzman, chefe do Comitê Olímpico Brasileiro, em meio a suspeitas de que a proposta vencedora do Rio de Janeiro para sediar os Jogos de 2016 tenha contado com a ajuda de um pagamento de US$2 milhões ao Diack filho, que atuou como intermediário do pai para garantir os votos de outros membros africanos do Comitê Olímpico Internacional.
Ao longo de quase três horas no Pullman Teranga, Diack afirmou que todas as acusações se originaram no racismo e no ciúme, parte de uma conspiração anglo-saxã para manchar o legado de seu pai. Disse também acreditar que o caso era parte de um jogo de poder entre a Agência Mundial Antidoping e o IOC.
"Dizer que Lamine Diack e seu filho estavam envolvidos com doping de atletas, após 2 anos de investigação, onde estão as provas? Apenas artigos de jornais. Se tivessem provas, já teriam ido ao tribunal", afirmou Diack.
"É um problema para um africano negro ser tão bem sucedido após 16 anos na IAAF".
As provas contra ele incluem transferências de dinheiro e e-mails descobertos no Brasil, depois que autoridades de lá acusaram funcionários de subornar Diack e outros para assegurar votos e garantir o Rio como sede das Olimpíadas de 2016.
Investigadores franceses de crimes financeiros rastrearam depósitos de US$2 milhões de empresários brasileiros em contas bancárias controladas por Diack, na época que o Rio foi escolhido para sediar os Jogos Olímpicos. No mesmo dia da votação, Diack transferiu cerca de US$300 mil para Frankie Fredericks, ex-velocista da Namíbia e estrela em ascensão do movimento olímpico, que por acaso era uma das três pessoas que seguiriam a votação.
Diack chamou a isso de "uma coincidência infeliz". Os brasileiros estavam pagando para patrocinar um novo evento de revezamento que estava sendo criado para a IAAF, e Diack era consultor de marketing da organização.
Essa afirmação contrasta com as de Maria Celeste Pedrosa, secretária de Nuzman. Em depoimento dado a investigadores no Rio, ela disse que o dinheiro supostamente seria para pagar pela construção de pistas de atletismo na África e questionou por que deveria ser depositado em uma conta bancária controlada por Diack na Rússia.
"O pagamento a Fredericks foi relacionado a uma dívida por seu trabalho promocional para patrocinadores de atletismo", disse Diack. Um inquérito sobre a conduta de Fredericks continua em andamento. O evento de revezamento supostamente patrocinado pelos brasileiros nunca ocorreu.
"Papa Diack disse, gravou, afirmou que Lamine Diack e Frankie Fredericks votaram em Tóquio", disse Diack, declarando que seu pai preferia que Tóquio tivesse sediado os Jogos Olímpicos de 2016, e não o Rio.
O Rio acabou batendo Madri em um segundo turno final.
"Quem disser o contrário está mentindo, e estou pronto para ser desafiado no lugar de meu pai", disse ele.
Os promotores identificaram também inúmeros outros pagamentos que dizem estar relacionados com o esquema de corrupção, incluindo grandes transferências para lojas de joias em Paris e no Qatar. "As alegações são puramente circunstanciais e podem ser refutadas por documentos e contratos que tenho comigo", afirmou Diack. Quando pedi que os revelasse, ele falou: "Meu amigo, vou dar tudo isso para um promotor, não para um jornalista".
Os investigadores afirmam que Diack e seus cúmplices eram tão descarados em sua busca por dinheiro corrupto que um dos seus associados operava uma empresa chamada Black Tidings, que, de acordo com uma investigação da WADA, significa "mercado negro ou lavagem de dinheiro", em hindi. Essa conta está ligada a um esquema de extorsão, no qual atletas russos deveriam pagar milhares de dólares para que os resultados de seus exames antidoping fossem ocultados.
Diack nega enfaticamente qualquer envolvimento nesse caso.
"Dinheiro sujo, ou dinheiro de corrupção, é mantido em contas no exterior, ou é pago em dinheiro. Você acha que eu sou burro para depositar dinheiro de corrupção em contas oficiais da minha empresa?"
O escândalo não evitou que Diack continuasse com suas atividades comerciais e garantisse contratos para sua empresa de marketing esportivo, a Pamodzi, uma entidade que já foi associada a vários negócios que os promotores descreveram como suborno.
Diack agora dedica sua atenção ao futebol mundial, uma indústria muito mais lucrativa que o atletismo, e que já deu problemas no passado. Ele passou um breve período preso após alegações de que milhares de dólares do dinheiro de patrocínio para a seleção masculina de futebol do Senegal haviam sumido. Diack contou que passou nove dias na prisão antes de ser liberado sem acusações.
A luxuosa vida que leva pelos corredores do esporte internacional também fez com que licitantes envolvidos na disputa para sediar a Copa do Mundo de futebol de 2018 e 2022 pedissem sua ajuda. Diack deu um sorriso antes de se recusar a responder com quem pode ter trabalhado durante o processo que terminou com a Rússia e o Qatar garantindo direitos de sede.
"Assessoro um monte de países nos esportes", disse ele.
Diack disse que havia ganhado aproximadamente US$14 milhões em comissões durante seu tempo como consultor da IAAF, e ainda mais no futebol.
"Não existe nenhum executivo mais experiente em marketing esportivo na África do que eu. Riqueza nunca foi meu problema", afirmou.
Antes que fosse forçado a ficar no Senegal – ele entregou seus dois passaportes, incluindo um diplomático, às autoridades locais –, ele conta que passava 250 dias por ano viajando, trabalhando acordos e aconselhando clientes.
O Senegal continua a resistir ao pedido da França para que extradite Diack. No ano passado, o primeiro-ministro disse que o país "nunca entregaria um filho". O caso pode se arrastar por anos.
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