Desde o início da nova guerra no Oriente Médio, a Turquia tem se posicionado como uma aliada do Hamas no conflito, ancorada no seu histórico de abrigo para lideranças do grupo terrorista e facilitadora da angariação de fundos para ações da milícia palestina, ao mesmo tempo em que acusa Israel de cometer crimes em Gaza e ameaça o Estado judeu, caso decida "destruir" membros do grupo.
Além disso, o país islâmico também contribui com a continuidade de outra guerra: a do leste europeu, ao servir de rota de fuga das sanções aplicadas pelos EUA e aliados da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) contra a Rússia.
Segundo o jornal britânico The Financial Times, a exportação de material bélico para Moscou disparou neste ano, sendo três vezes maior do que o mesmo período em 2022.
Dados oficiais da Turquia apontam que, nos primeiros nove meses de 2023, a receita externa do país, somente com os bens ligados à guerra da Ucrânia, foi de US$ 158 milhões (cerca de R$ 775 milhões).
De acordo com os EUA, 45 itens considerados de “alta prioridade” para o governo de Putin, que são produzidos em países do G7 (Canadá, Japão, Reino Unido, Alemanha, EUA, França e Itália), foram enviados a partir de Ancara. Entre as mercadorias, há microchips, equipamentos de comunicação e peças como miras telescópicas, que estão, em tese, sujeitas ao controle desses países, desde que foram aplicadas sanções contra a Rússia.
O Exército de Putin utiliza esses equipamentos na construção de mísseis de cruzeiro, drones e helicópteros, de acordo com a inteligência dos EUA e da UE.
Os itens conseguem chegar até a Rússia com a ajuda de intermediários, como a Turquia, que utilizam pequenas empresas para "disfarçar" o destino final da mercadoria. Outras nações que mediam esse comércio são ex-integrantes da União Soviética: Azerbaijão, Geórgia, Cazaquistão, Quirguistão e Uzbequistão.
As estatísticas do governo turco apresentam um aumento nas declarações de exportações de bens de alta prioridade para esses cinco países, no entanto, os dados divulgados por essas nações não são correspondentes.
Por exemplo, o Cazaquistão registou importações de bens com origem da Turquia no valor de US$ 6,1 milhões (cerca de R$ 30 milhões) até setembro, contudo, os dados oficiais do governo turco mostram que as exportações dos mesmos materiais chegaram a US$ 66 milhões (R$ 324 milhões) no mesmo período.
Washington e aliados da OTAN já apelaram a Ancara para que tome medidas mais rígidas, a fim de limitar o comércio com países sancionados. No mês passado, o Departamento do Tesouro americano enfatizou novamente a necessidade de frear as exportações para a Rússia.
“Os EUA, a UE, o Reino Unido e os nossos parceiros do G7 deixaram claro que não queremos que nenhum dos nossos principais parceiros se tornem locais onde as nossas sanções sejam contornadas”, disse James O'Brien, secretário de Estado adjunto dos EUA para Assuntos Europeus e Asiáticos.
"É importante que continuemos a fechar as portas à Rússia, caso contrário, veremos cada vez mais grandes ataques contra Kiev”, acrescentou O’Brien, dias depois das autoridades ucranianas comunicarem sobre o maior ataque de drones russo até o momento, desde fevereiro de 2022, quando o conflito teve início.
A Turquia mantém fortes laços diplomáticos e comerciais com a Rússia, ao mesmo tempo em que se compromete a não ajudar Moscou em suas tentativas de contornar as sanções ocidentais. Os EUA ameaçaram o governo turco com a imposição de "medidas coercitivas", caso não adote ações mais eficazes para frear o recebimento de mercadorias importantes para a Rússia manter seu plano expansionista.
A título de exemplo, uma empresa fornecedora de eletrônicos com sede em Istambul foi sancionada pelo governo americano em novembro por suspeita de enviar remessas para a Rússia contendo bens de alta prioridade, como circuitos eletrônicos integrados.
Dados alfandegários russos, obtidos pelo jornal The Financial Times, mostraram que a empresa vendeu US$ 1,3 milhão (R$ 6,3 milhões) em equipamentos ao país de janeiro a julho deste ano, dos quais US$ 300 mil (R$ 1,4 milhão) eram itens de "alta necessidade".
As tensões diplomáticas entre a Turquia e os EUA surgem em um momento delicado, uma vez que Ancara tem interesse em adquirir aviões de combate F-16 americanos. Além disso, outro imbróglio ocorre dentro da OTAN, organização da qual a Turquia faz parte: Ancara tem sido um obstáculo para a entrada da Suécia.
O motivo da recusa é a suposta posição pouco rígida do país-membro da União Europeia sobre o reconhecimento do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) como uma milícia terrorista. De acordo com o governo de Erdogan, a Suécia é, pelo contrário, um refúgio para os curdos.
A questão teve um retrocesso ainda maior após a queima de uma cópia do Alcorão na frente da embaixada da Turquia em Estocolmo, no início do ano. A aprovação da entrada do país nórdico na organização segue parada no Parlamento turco.
No início deste mês, os EUA aumentaram ainda mais as sanções contra empresas turcas, diante dos recentes dados divulgados. As novas restrições surgem durante um novo acontecimento geopolítico importante: a guerra entre Israel e o Hamas, na qual os dois países seguem sentidos opostos.
O presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, tem atacado frequentemente Israel e seus aliados nos discursos públicos, condenando a ofensiva israelense. O país islâmico também não reconhece o Hamas como um grupo terrorista.
Há poucas semanas, o subsecretário do Tesouro dos EUA para o terrorismo e inteligência financeira, Brian Nelson, enfatizou em uma coletiva de imprensa que Washington estava “profundamente preocupado” com o papel da Turquia na facilitação do acesso do Hamas ao financiamento internacional, destacando que o conflito em Gaza tem complicado as relações entre os aliados da OTAN.
“Estamos profundamente preocupados com a capacidade do Hamas de continuar a angariar fundos ou encontrar apoio financeiro para as suas operações em potenciais futuros ataques terroristas na Turquia”, afirmou o funcionário da Casa Branca.
Em outubro, os EUA impuseram sanções contra três indivíduos que afirmaram ser membros do Hamas e estão baseados na Turquia. Segundo relataram, eles "ajudam a gerir a rede de investimentos do grupo terrorista" a partir de Ancara.
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