O presidente da Coreia do Sul, Moon Jae-in, disse que a cúpula de Cingapura foi um sucesso que estabeleceu um caminho para a paz e expressou gratidão ao presidente americano Donald Trump após o anúncio-surpresa de que os militares americanos suspenderiam os exercícios militares com a Coreia do Norte, vistos como uma ameaça pela Coreia do Norte.
Moon considerou a cúpula como uma grande vitória conseguida pelos Estados Unidos e pelas duas Coreias. “Gostaria de agradecer ao presidente Trump que conseguiu algo que outros não conseguiram”, disse ele. “Kim Jong-um também será lembrado com um líder que construiu um momento histórico ao dar um primeiro passo corajoso em direção ao mundo.”
A declaração refletiu a visão de Moon, de que a cúpula era apenas o primeiro passo de um processo de longo prazo para establilizar e desnuclearizar a Península Coreana.
Leia também: Seis grandes questões deixadas pelo encontro entre Trump e Kim
O presidente sul-coreano tem sido um cauteloso e determinado parceiro no processo de paz, tendo um papel crucial em manter os contatos após, abruptamente, Trump cancelar a cúpula no final do mês passado. A Coreia do Sul tem realizado conversas paralelas com o regime de Kim sobre iniciativas que incluem planos de abrir um escritório de ligação com o Norte, o que possibilitaria um relacionamento quase diplomático.
Mas seu governo foi surpreendido pelo anuncio feito por Trump, logo após o encontro de cúpula, de que os exercícios militares com a Coreia do Sul seriam suspensos, sem especificar quais deles e quando isto poderá acontecer. Seu governo não foi informado da decisão antes do anúncio. Os dois lideres conversaram por telefone apenas após a reunião, quando Trump estava a bordo do Air Force One, partindo de Cingapura.
No Japão, que esperava que a Coreia do Norte se comprometesse a discutir a questão dos cidadãos japoneses sequestrados, houve alívio pelo fato de que Trump expôs o assunto a Kim.
A posição chinesa
A China emitiu uma declaração sobre a possibilidade de relaxar as sanções contra a Coreia do Norte, mas viu sua abordagem preferida para as relações entre os Estados Unidos e a Coreia do Norte permanecer praticamente intactas na declaração firmada pelos lideres.
Pequim conseguiu tudo o que queria, disse Abraham Denmark, diretor do programa asiático no Woodrow Wilson International Center of Scholars. Ao interromper os exercícios militares com a Coreia do Sul foi removido um motivo de grande irritação para Pequim, disse ele.
“Espero que Pequim se veja como um grande vencedor da cúpula”, afirmou Denmark. “Mas , suspeito que há gente preocupada na China com a aproximação entre os Estados Unidos e a Coreia do Norte. Acredito que Pequim irá acelerar seu relacionamento com a Coreia do Norte, com encontros políticos de alto nível e, ate mesmo, assistência econômica e desenvolvimento de infraestrutura. A China irá deixar claro que tem um papel relevante no processo e não pode ser deixada de lado ou ignorada.
Leia também: O encontro entre Trump e Kim foi simbólico, mas pode resultar em um acordo histórico?
Um porta-voz do Ministério de Relações Exteriores da China disse que o órgão iria considerar o levantamento das sanções apenas se Pyonyang atender as condições estabelecidas pelas resoluções das Nações Unidas.
O apoio da China às sanções é um instrumento para manter as pressões econômicas sobre a Coreia do Norte, que depende de Pequim, há décadas, como tábua de salvação para o comércio e assistência.
Lu Chao, um especialista em assuntos coreanos da Liaoning Academy of Social Sciences, disse que o acordo de Cingapura reflete os objetivos e as demandas chinesas. “É um progresso histórico. Podemos acreditar que a região começou a avançar em direção à paz.”
Japão não conseguiu o que desejava
Mas outro vizinho da Coreia do Norte, o Japão não conseguiu o que mais desejava na cúpula: uma declaração clara de que a Coreia do Norte iria reabrir as conversas sobre o sequestro de japoneses há algumas décadas,
Os lideres japoneses aparentaram estar satisfeitos com o que conseguiram: a promessa pública de Trump que conversou com Kim sobre o assunto e que o Norte estava trabalhando nele.
A vaga menção ao tema fez com que o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, se livrasse de um grande embaraço político após ele, pessoalmente, fazer lobby para que Trump defendesse a questão. Para o Japão, os sequestros permanecem com um grande obstáculo para unir-se aos Estados Unidos e a Coreia do Norte no crescente relacionamento com o Norte.
A Coreia do Norte admite ter sequestrado 13 pessoas no Japão nos anos 70 e 80. O objetivo era treiná-las como espiões. Pyongyang permitiu que cinco delas retornassem ao Japão com suas famílias em 2002, e insiste que as outras oito morreram. Japão suspeita que centenas possam estar cativas.
Leia também: Os três grandes ausentes da cúpula entre Kim Jong-un e Donald Trump
Trump disse que discutiu o assunto na reunião, mas não deu pistas sobre a resposta de Kim ou que ações podem ser tomadas pela Coreia do Norte. “Eles disseram que vão trabalhar no assunto. Não colocamos no documento, mas é algo a ser trabalhado.”
A Coreia do Norte diz que a questão dos sequestros já foi “resolvida”. E acusa o Japão de tentar atrapalhar a aproximação com a Coreia do Sul e os Estados Unidos. Em resposta, Abe disse que o Japão não normalizará as relações com Pyongyang ou oferecera ajuda a menos que seja realizada uma investigação completa sobre o assunto.
Outras disputas históricas pairam sobre uma eventual normalização da situação da Coreia do Norte, incluindo assuntos entre países que se dizem aliados.
Ativistas sul-coreanos têm mantido vigílias permanentes fora da embaixada japonesa em Seul, procurando manter viva a memória das mulheres coreanas usadas como escravas sexuais durante a Segunda Guerra Mundial. O governo de Abe também está bravo com a decisão da Coreia do Sul em reabrir as discussões após um acordo em 2015, que pretendia ser uma conclusão “final e irreversível” para as indenizações relacionadas à escravidão sexual e outros temas.