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Literatura

Alice Munro, mestra do conto

 | Ilustração: Osvalter Urbinati
(Foto: Ilustração: Osvalter Urbinati)
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De madrugada, o telefone da casa de Alice Munro tocou, tocou e tocou — em vão. Mal ela sabia que se tratava da ligação mais importante da sua vida como escritora. Era a Academia Sueca telefonando para avisar a canadense, definida como a "mestra do conto contemporâneo", que ela havia ganhado o Prêmio Nobel de Literatura, divulgado ontem.

Aos 82 anos, três meses depois de anunciar sua aposentadoria das letras, Alice Munro dormia tranquilamente na casa de uma de suas filhas, que acordou a mãe, às quatro horas da manhã, com a notícia.

Pouco depois, com a voz sonolenta, ela já estava em uma rádio ca­­na­dense. "Pa­rece impossível. É tão esplêndido de acontecer, não consigo descrever, é mais do que posso expressar", falou na entrevista. "Espero que isso faça as pessoas verem o conto como uma arte importante, e não algo com o qual você fica experimentando até escrever um romance."

Nada mau para quem começou a escrever contos exatamente por isso: uma prática para, um dia, chegar ao romance. Nascida em Winghan, na província de Ontario, no Canadá, e criada na fazenda de sua família, Alice Munro tem nas cidades rurais do interior canadense o principal cenário de suas narrativas curtas. Em sua cidade, ela precisava esconder sua paixão pela literatura — algo inconveniente em uma menina.

Ela havia anunciado sua aposentadoria com o livro Dear Life. Por isso, junto a Philip Roth, que ano passado também abandonou a literatura, ela era alvo de intensas especulações como possível premiada. Com o Nobel, Alice Munro vai receber US$ 1,25 milhão (R$ 2,75 milhões).

A escritora canadense se assemelha a um autor com quem sempre é comparada: Anton Tchekhov, o mestre russo das narrativas curtas. Como nas histórias do escritor, os contos de Alice não têm o enredo como característica mais importante, mas sim a narrativa, muitas vezes marcada por personagens que vivem momentos de epifania.

Biografia - Entre os livros e a família

Diferentemente das outras garotas de sua cidade natal, Alice Munro frequentou a universidade. Conseguiu uma bolsa de dois anos para estudar jornalismo na University of West Ontario. Para se sustentar, combatia pragas em plantações de tabaco e vendia o próprio sangue.

Casou cedo, como tantas garotas da região. Com o marido (de quem se separaria em 1972), fundou uma livraria, a Munro Bookshop, aberta até hoje. Criada em uma família de classe média, Alice Munro sempre precisou conciliar as tarefas de dona de casa com a literatura.

Durante os meses da primeira gravidez, ela diz — em entrevista à revista literária Paris Review, em 1994 — que passou a escrever "desesperadamente". "Achei que depois de ter um filho nunca mais seria capaz de escrever. Cada gravidez me estimulou a fazer algo grande antes do nascimento do bebê. Mas, na verdade, nunca consegui realizar algo grande nesses períodos", disse a autora.

Os filhos não a afastaram da literatura, como Alice Munro acreditava que aconteceria. Ela passou a escrever depois de as crianças irem para a escola, até a hora do almoço — quando elas e o marido apareciam.

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