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Imagine se você fosse um tradicional morador de Paris e no trajeto para a Torre Eifel, de repente, um homem de barba longa e em conversa com uma mulher vestida com o hijab (lenço que cobre pescoço, cabeça e ombros das muçulmanas) falasse a expressão Allahu Akbar (Deus é o maior). A probabilidade de que a sua reação fosse de medo imediato é grande. Assim como a França, países como Síria e Iraque têm perdido cidadãos desde 2011, quando o terrorismo do Estado Islâmico (ISIS) começou a avançar. Mas, nos países ocidentais, o terror gerou, além da incomensurável dor e sofrimento causados pelas mortes das vítimas, um certo medo do islã – consequência do desconhecimento e do uso recorrente e deturpado do termo Allahu Akbar pelos terroristas antes de cada atentado. Afinal, os próprios muçulmanos são as principais vítimas do ISIS.

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Por outro lado, há indícios que essa falta de informação sobre o islã está mudando. A busca na internet pelo termo chegou ao ápice histórico em novembro, o mês dos ataques, segundo a ferramenta Google Trends, que analisa o desempenho das buscas no Google. Embora não divulgue números absolutos, a ferramenta faz relação entre a performance das palavras digitadas no buscador de 2004 para cá. As buscas pela expressão foi três vezes maior em relação a janeiro, por exemplo – mês do ataque ao jornal satírico Charlie Hebdo também em Paris. No Brasil, nunca se buscou tanto o termo no Google como na semana de 15 a 21 de novembro – dias seguintes aos ataques de Paris.

“Allahu Akbar ao entrar em casa”

Para o presidente da Sociedade Beneficente Muçulmana de São Paulo, Nasser Fares, o uso do tabkir Allahu Akbar pelos muçulmanos não pode ser confundido com o terrorismo. “O Islã não prega o suicídio, nem assassinato, assim como todas as outras religiões não pregam. O ISIS não representa o Islã”, disse. Por isso, fez questão de explicar. Allahu Akbar pode e deve ser usada sempre para homenagear Deus. “Até quando a gente entra em casa falo”, mencionou.

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Essas buscas rápidas, no entanto, não substituem uma conversa com quem sente na pele o preconceito ou a ignorância em relação sua fé. Para o porta-voz da Sociedade Beneficente Muçulmana do Paraná, Omar Nasser Filho, a expressão Allahu Akbar é sagrada para qualquer muçulmano e é usada de maneira “rasteira e cruel” pelo ISIS. “Para nós, o terrorismo é um ultraje, pecado maior”, diz.

Origem e hábito

Nasser Filho explica a origem do termo e como ele é usado. “É usado como se fosse um graças a Deus para o cristão no Brasil. Falamos Allahu Akbar para nos dirigirmos diretamente a Deus”, explicou. Segundo ele, quando o profeta criador do Islã, Muhammad (Maomé, em português) nasceu datava por volta 570 d.c.. Quando ouviu a voz do anjo Gabriel, aos 60 anos, a região da atual Arábia Saudita, vivia um conflito entre a Pérsia e o império Bizantino. Era comum o politeísmo. Ao receber as mensagens de Allah (Deus), acredita-se que Maomé pronunciou Allahu Akbar na região para unificar as tribos árabes e mostrar que haveria, portanto, apenas um Deus.

A expressão do cotidiano

A doutora em Antropologia da USP, Francirosy Campos Barbosa, que estudou a cultura islâmica, contou que a expressão Allahu Akbar, chamada de takbir, é usada sempre em cada uma das cinco orações dos muçulmanos. “Ele está presente na oração do muçulmano. Quando ele faz a primeira reverência. É um takbir, a abertura da oração. Significa que o muçulmano só prostra para Deus”, explicou. Seu sentido não é diferente entre as correntes xiitas e sunitas.

“Está no cotidiano. É uma expressão do dia a dia. Além de ser dita na abertura da oração, fala-se em momentos de alegrias, tristeza. Em todas as ocasiões, para o muçulmano, Deus é maior sempre”, comentou.

Outro momento em que o takbir aparece é quando um muçulmano usa o famoso masbaha – o terço árabe. Ele é manuseado durante reflexões e orações. O objeto ajuda para repetir 99 nomes de Deus nas expressões “Subhana Allah (Glorificado é Allah), Alhamdu Lil-lah (Graças a Deus), Allahu Akbar”. Cada uma delas é repetida 33 vezes até completar 99, número que faz referência ao total de atributos de Allah no Alcorão, o livro sagrado dos muçulmanos.