Um discreto buquê de flores preso a uma árvore passava quase despercebido nos arredores da estação de metrô de Shaw, ao norte do centro de Washington.

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Era uma homenagem ao consultor financeiro Matt Shlonsky, 23, morto no local por uma bala perdida há cerca de três semanas.

Tributos a outras vítimas de armas de fogo foram vistos pela capital americana nos últimos tempos, marcando o aumento do número de homicídios em Washington.

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No último dia 28, com mais duas pessoas mortas a tiros, a estatística bateu em 105 homicídios na cidade desde janeiro, igualando o número registrado ao longo de todo o ano passado.

O fenômeno não se limita a Washington e tem intrigado tanto autoridades policiais como criminólogos, que buscam entender os motivos da alta, após duas décadas de violência em queda.

O mesmo ocorre em outros centros urbanos dos EUA, como Nova York, Chicago, Nova Orleans e Baltimore. Em todo o país, mais de 30 cidades registraram aumento nos números da violência neste ano em relação a 2014.

Não há consenso entre os especialistas. Entre as razões estão o aparecimento de novas drogas, que estimula a disputa entre gangues, a relutância da polícia em agir com maior firmeza após uma série de escândalos de violência policial e uma cultura de violência armada entre jovens.

Para Peter Scharf, especialista em criminologia da Universidade de Louisiana, pode ter havido complacência das autoridades devido aos baixos números dos últimos vinte anos.

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Segundo ele, um exemplo disso é o drástico corte no orçamento nacional dedicado à polícia e à Justiça Criminal, que caiu de US$ 4 bilhões (R$ 15,2 bilhões) em 2000 para menos de US$ 400 mil (R$ 1,52 milhão) hoje em dia.

Sharf conta que os criminólogos debatem se a alta nos homicídios significa apenas um “solavanco” temporário nas estatísticas ou se é o início de uma reversão na queda dos últimos anos.

Embora ressalte que ainda não há dados suficientes para uma conclusão, ele está entre os pessimistas. “Temo que os números continuarão subindo”, disse Scharf. “Muitas cidades estão falidas e demitiram policiais. Com isso, o número de homicídios aumenta”.

Gentrificação

Em Washington, nenhuma parte da cidade personifica melhor o encontro do passado de violência e o atual receio de seu retorno do que Shaw, onde o jovem consultor Matt Shlonsky foi morto por um tiro a esmo quando saía de um táxi, há duas semanas.

Matt estava a caminho de um dos muitos bares da região, que de foco de violência e drogas nos anos 80 e 90, transformou-se no bairro da moda da capital americana.

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Shaw é o símbolo máximo do processo de “gentrificação” de Washington, como é conhecido o processo de valorização das áreas degradadas.

Prédios moderninhos estão em construção por toda a parte, com apartamentos com aluguel de US$ 3.000 (R$ 11,8 mil) por mês para cima, em meio a casas subsidiadas pelo governo de moradores antigos.

Mas a mistura que faz de Shaw um dos bairros mais multifacetados e dinâmicos da capital -também preserva um ressentimento social que, para alguns, explica em parte a ascensão da violência.

“Quem é de fora talvez não perceba, mas há um sentimento de frustração entre jovens afro-americanos”, disse ao jornal “Washington Post” Ibrahim Mumin, 68, quee vive na região desde 1976.

“É a velha história: se você tem um celeiro cheio de milho e o meio está vazio, em algum momento haverá problemas”.

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Vários dos homicídios recentes em Washington parecem seguir uma lógica aleatória, que reforça a tese de tensão social levantada por Mumin, mas confunde ainda mais os criminólogos, por não ter alvos específicos.

Em vários casos, as vítimas foram atingidas por atiradores que passaram atirando de carros em alta velocidade.

Entretanto, para a chefe de polícia de Washington, Cathy L. Lenier, há uma razão básica para o aumento da violência: a proliferação de armas ilegais.

“Quando há armas ilegais nas casas e nas mãos de pessoas erradas, coisas ruins acontecem”, disse ela.

Há quem considere a preocupação exagerada, já que os números da violência nos EUA continua baixos em relação a duas décadas atrás -e mais ainda se comparados a países com taxas altíssimas, como o Brasil, que tem cerca de 50 mil homicídios por ano.

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Em 2013 houve 16.121 homicídios nos EUA, segundo o Departamento de Saúde, uma queda de 52% em relação a 1993.

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