O filho do ditador da Guiné Equatorial e vice-presidente do país, Teodoro Obiang Mangue, conhecido como Teodorin, poderá ser denunciado por lavagem de dinheiro, afirmaram neste domingo (16) fontes da Receita Federal ao jornal O Estado de S. Paulo. Na sexta-feira (14), a Polícia Federal encontrou US$ 16 milhões em dinheiro e relógios de luxo em duas malas da comitiva de Teodorin. Neste domingo, ele deixou o País levando apenas R$ 10 mil.
Os fiscais da Receita apreenderam em um avião cerca de US$ 1,5 milhão em espécie e uma grande quantidade de relógios de luxo cravejados de pedras, entre eles um modelo avaliado em US$ 3,5 mil. O dinheiro não havia sido declarado ao fisco e foi apreendido na chegada da comitiva ao País, no aeroporto de Viracopos (SP).
Como há casos semelhantes em outros países, a PF e a Receita verificarão agora a origem do dinheiro. Caso o Ministério Público entenda que possa ser fruto de corrupção, mesmo que praticada na Guiné Equatorial, a ocultação dos valores e sua não declaração à Receita podem ser indícios suficientes para promotores oferecerem denúncia de lavagem de dinheiro.
O montante apreendido foi recolhido a uma instituição financeira e só será devolvido após o fim das investigações, a depender do resultado, ou por ordem judicial. Na madrugada do domingo, Teodorin voltou à Guiné Equatorial, disse o secretário da Embaixada no Brasil, Leminio Akuben MBA Mikue.
Em depoimento à PF, Akuben havia dito que Teodorin veio ao Brasil para um "tratamento médico e posteriormente seguiria para Cingapura em missão oficial" e os US$ 16 milhões estavam relacionados a isso. "Ele está mal de saúde e necessita tratamento", disse ao Estado o secretário, sem especificar qual doença o filho do ditador tem nem em qual hospital ele buscaria tratamento.
Pelas normas da Receita, só é permitido entrar no Brasil com até R$ 10 mil em espécie. Ainda assim, se a origem do dinheiro não for justificada, ele pode ser apreendido. No caso dos relógios e joias, a quantidade levantou suspeitas de que pudessem ser destinados à comercialização. Nesse caso, não poderiam ingressar como bagagem.
Akuben alega que o vice-presidente africano teve seus direitos ignorados, estava sob proteção da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas e não poderia ser alvo de inspeções alfandegárias comuns.
Ele explicou que Teodorin retornou ao país natal com R$ 10 mil e pede a devolução dos bens. "Não nego que os relógios apreendidos sejam de luxo, mas eram todos de uso pessoal, com as iniciais do vice-presidente."
A Receita abriu um procedimento administrativo e a Polícia Federal deve abrir um inquérito que poderá levar à denúncia do Ministério Público. Teodorin agora terá prazo para se defender e será chamado a apresentar provas da origem do dinheiro.
As suspeitas dos fiscais tiveram início quando seguranças da comitiva do vice-presidente, que não têm imunidade diplomática, se recusaram a passar com as malas pelos scanners no aeroporto. Depois de muita insistência e de acionarem o Itamaraty, a comitiva concordou em abrir as malas, onde foram apreendidos dinheiro e joias que somam US$ 16 milhões.
Abordagem
A comitiva de Teodorin foi abordada às 9h35 de sexta-feira. A aeronave Jumbo 77 desembarcou com 11 passageiros. Ele foi recepcionado e, por causa das prerrogativas do cargo, não foi inspecionado.
"Tínhamos autorização diplomática, avisamos que o vice-presidente chegaria. Há um artigo da Convenção de Viena que diz que sempre que viaja um dignitário, sua bagagem pessoal não é verificada", defendeu o secretário da Embaixada.
O auditor fiscal da Receita Alessandro Grisi Pessoa disse em depoimento à PF que a comitiva demorou quatro horas para entregar as chaves de duas malas. No Jumbo 777, "foram encontradas duas armas de fogo, as quais foram lacradas no cofre da aeronave para que não desembarcassem no País posteriormente, haja vista que não haviam sido declaradas".
Grisi Pessoa disse à PF que "os integrantes da comitiva não foram dispensados da inspeção", mas "forçaram passagem por aquela porta, na tentativa de embarcar na aeronave, sem obedecer aos trâmites aduaneiros". Segundo o servidor, uma das malas "chamava muita atenção por aparentar ser muito pesada, pelo esforço que aquele que a carregava estava fazendo".
Condenações anteriores
Condenado na França a três anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro, Teodoro Obiang também tem inquéritos criminais abertos contra ele na Suíça, na África do Sul, na Espanha e nos EUA. Nos cinco países, a suspeita é a mesma: desvio de milhões da renda do petróleo para uso pessoal.
Na Guiné Equatorial, mais de dois terços dos cidadãos vivem com menos de US$ 1 por dia. 90% da população não tem acesso à internet e a expectativa de vida é de apenas 53 anos, o equivalente à Europa dois séculos atrás. Enquanto isso, o governo do país diz ser dono de coleções de carros de luxo e grandes quantias de dinheiro.
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O vice-presidente do país tem atualmente mais de R$ 500 milhões confiscados em diferentes países. Na França, são US$ 115 milhões congelados; nos Estados Unidos, uma mansão em Malibu avaliada em US$ 6,5 milhões foi retida pelas autoridades; na Suíça, contas secretas, um iate e uma coleção de mais de 25 carros de luxo. Na África do Sul, uma de suas casas de US$ 2 milhões também foi confiscada.
Obiang declarou à Justiça francesa que tinha uma renda de apenas US$ 80 mil por ano. O que não explicou foi como pagou US$ 25 milhões em 2004 para comprar um imóvel na luxuosa Avenue Foch, em Paris. No ano passado, ele foi condenado a três anos de prisão e a uma multa de US$ 30 milhões.
Em 2016, a Justiça suíça confiscou uma coleção que incluía um Bugatti Veyron, quatro Ferraris, incluindo uma Enzo e outra modelo 599GTB, um Porsche 918 Spyder, uma Lamborghini Veneno, outro Maybach, um Koenigesegg, um Aston Martin e até uma McLaren P1.
O vice-presidente africano tentou embarcar os carros de luxo depois que o Ministério Público de Genebra iniciou um processo contra ele por suspeita de corrupção. Temendo o confisco, seu objetivo era embarcar a fortuna em um avião de carga alugado às pressas. Mas a polícia local foi mais rápida.
Na ocasião, os advogados de Obiang argumentaram que a coleção era "propriedade do Estado" e não poderia ser confiscada. Os carros seriam usados, segundo eles, como "veículos oficiais" e foram comprados "por ordem do Ministro do Interior". A Justiça suíça não aceitou o argumento.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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