Quando, no dia 5 de março de 2013, os veículos de comunicação anunciaram a morte de Hugo Chávez, ex-presidente venezuelano e uma das lideranças mais controversas da América Latina, não era apenas a Venezuela que se viu prestes a iniciar uma nova fase. Todos os países sul-americanos sabiam que, dali em diante, com a perda de uma referência no continente, a geografia política haveria de ser redesenhada. As recentes eleições presidenciais no país e no vizinho Paraguai serviram para definir os últimos traços desse novo alinhamento, que começa a ganhar corpo.
Na opinião de analistas, o momento é crucial para estabelecer quem tomará para si a missão de dar sequência, de forma efetiva, ao processo de integração política e econômica da América do Sul. O Brasil, juntamente com a Argentina, é um forte candidato a assumir esse posto de liderança. Mas desde que chame a responsabilidade para si, na opinião de Olavo Henrique Furtado, professor de Relações Internacionais da Trevisan Escola de Negócios. "O Brasil precisa tomar uma posição mais assertiva, manter a linha da atual política externa, mas sendo mais agressivo em termos de negociação", avalia.
A missão de buscar uma integração maior entre os vizinhos sul-americanos ganha força com a saída de Chávez, um dos principais articuladores da união entre os países na forma de bloco para fazer frente às grandes potências. Para seu lugar foi eleito Nicolás Maduro, nome que não tem o mesmo carisma e força política de seu antecessor. Já no Paraguai, o retorno do tradicional Partido Colorado ao poder, na figura do empresário Horacio Cartes, também não é tido como suficiente para alçá-lo à condição de liderança na América Latina.
Responsabilidade
Na avaliação de Javier Vadell, professor de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG), o Brasil foi beneficiado pela política de integração de Hugo Chávez, que abriu as portas para acordos comercias e empréstimos internacionais. "Esse novo cenário vai fazer o Brasil olhar mais para fora, é um momento importante para assumir alguma responsabilidade a mais", defende o especialista, que rechaça a ideia de que o ex-presidente venezuelano inibiu a atuação do Brasil.
Cristina Pecequilo, professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), defende que o governo brasileiro tome a frente do processo de integração sul-americana, fortalecendo as relações comerciais e políticas. "O futuro da região e dos interesses brasileiros depende de nossa reação aos problemas dos vizinhos, em forma preventiva, e não só reativa", afirma.
Mercosul
Com novos presidentes, Venezuela e Paraguai devem se reaproximar
A eleição dos novos presidentes da Venezuela e do Paraguai reabre a expectativa de que os dois países restabeleçam o entendimento, quebrado no ano passado, quando o Congresso paraguaio rejeitou o ingresso dos venezuelanos no Mercosul. A justificativa dos congressistas paraguaios para a negativa foi o "caráter autoritário e ditatorial do governo de Hugo Chávez". Decorridas as mudanças na administração dos dois países, os novos governantes já deram mostras de que o impasse será superado.
Paraguai e Venezuela interromperam relações diplomáticas após a destituição do então presidente paraguaio Fernando Lugo, ocorrida em junho do ano passado. Chávez, assim como outras lideranças latino-americanas, criticou o impeachment, classificado como um golpe de Estado. Nicolás Maduro, atual presidente venezuelano e então chanceler, foi acusado por Assunção de "grave intervenção" na crise política. O impasse administrativo fez com que o Mercosul suspendesse o Paraguai, que por sua vez, rejeitou o ingresso da Venezuela no bloco.
Superação
Em suas declarações, os dois presidentes eleitos demonstram que as desavenças ficaram no passado. "Esperamos que sejam superadas as circunstâncias que levaram à suspensão e tenhamos o Paraguai no Mercosul e na Unasul, porque faz falta, porque são nossos irmãos sul-americanos", afirmou Maduro durante reunião com governadores. O presidente eleito paraguaio, Horacio Cartes, garantiu ter "muita predisposição" para obter a aprovação parlamentar sobre o ingresso da Venezuela no Mercosul. "O nosso compromisso é realizar todo o esforço em busca da normalização das relações", assegurou.
Analistas políticos também acreditam que não haverá maiores dificuldades para o ingresso dos dois países no bloco comercial. "O problema do Paraguai com a Venezuela era o Hugo Chávez. Sem ele, acredito que seja questão de tempo voltar às relações normais", avalia Javier Vadell.