Londres – As relações diplomáticas entre o Brasil e a Venezuela estão fora da "normalidade". A avaliação foi feita no início da tarde de ontem, em Londres, pelo ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, e reforça a aparente inconformidade do governo brasileiro em relação às críticas feitas pelo presidente da Venezuela, Hugo Chávez, ao Congresso brasileiro. Na quinta-feira, em Caracas, o venezuelano definiu o parlamento de Brasília como "papagaio" de Washington. Em entrevista coletiva concedida no centro de imprensa montado pela Embaixada Brasileira no Hotel Marriott, na capital inglesa, Amorim se mostrou indeciso entre definir as declarações de Chávez como um "incômodo" ou uma "preocupação".

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A crise retórica entre os dois países foi aberta quando o venezuelano disse que "o povo do Brasil não merece que o Congresso apareça repetindo como um papagaio o que dizem em Washington". O ataque, feito durante uma cerimônia no Palácio de Miraflores, em Caracas, havia sido uma resposta de Chávez a uma moção da Comissão de Relações Exteriores do Senado brasileiro. O texto exortava o governo do país vizinho a rever a revogação da concessão de funcionamento à emissora RCTV, considerada oposicionista e proibida de veicular sinal por seu canal habitual desde o domingo passado. Chávez definiu os parlamentares brasileiros como "direitistas", em tom pejorativo, e lhes mandou um recado: "A esses representantes da direita brasileira eu digo: muito mais fácil seria que o império português voltasse a se instalar no Brasil do que o governo da Venezuela devolvesse a concessão a este canal".

Ontem, após reunião com Susan Schwab, representante de Comércio dos Estados Unidos, sobre a Rodada de Doha, Amorim disse que a interferência de autoridades estrangeiras em instituições brasileiras não é apropriada. "A independência, a dignidade, os princípios democráticos e nacionais do Congresso brasileiro não podem estar e não estão nunca em jogo. Certamente, não é apreciável que uma autoridade estrangeira, seja ela qual for, se manifeste sobre nosso Congresso." "Minha expectativa", disse, "é de que todos os arroubos retóricos possam refluir e que as relações possam voltar à normalidade que têm. Isso exige capacidade de contenção de todos."

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Questionado sobre qual é a melhor definição para o desentendimento, o chanceler hesitou: "A retórica pode ter saído (da normalidade). Mas isso é uma coisa que às vezes dura um dia, dois dias. É uma nuvem que passa. Veremos".

Lula e Chávez não se falaram após desentendimento. Na sexta-feira, o Ministério das Relações Exteriores convocou o embaixador venezuelano em Brasília, Julio García Montoya, a explicar as declarações. Em nota oficial, o Itamaraty disse: "Tendo tomado conhecimento, em Londres, de declarações atribuídas ao presidente Hugo Chávez a respeito do Congresso brasileiro, o presidente Lula reafirmou seu total apoio às instituições brasileiras e expressou seu repúdio a manifestações que coloquem em questão a independência, a dignidade e os princípios democráticos, que norteiam essas instituições."