Em quatro meses de protestos na Venezuela, as forças oficiais de Nicolás Maduro contiveram com violência as manifestações de dia e usavam o mesmo recurso à noite para aterrorizar bairros oposicionistas. As operações ilegais em prédios e condomínios e o trauma dos moradores atacados pelos agentes foram compilados pela Anistia Internacional em relatório apresentado nesta segunda-feira (30).
O modus operandi das forças inclui disparos em áreas internas e para arrombar portas, prisões arbitrárias e destruição e roubo de bens dos moradores, assim como ocultação de provas.
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O método foi detectado pelas denúncias que chegaram à organização e a outras entidades venezuelanas, de modo que, para a ONG, não se pode considerá-los casos isolados ou esporádicos. "Isso constitui violação à integridade pessoal, à vida privada e à propriedade privada por parte dos agentes de segurança do Estado venezuelano e obedece a uma política de uso ilegal da força", diz o relatório.
Um exemplo foi a ação no bairro OPS de San Antonio de los Altos, perto de Caracas. Na noite de 22 de maio, mais de 50 carros foram destruídos e janelas dos apartamentos foram alvejadas.
Quatro semanas depois, o Sebin (Serviço Bolivariano de Inteligência) usou três blindados para derrubar os portões de um condomínio do bairro caraquenho de El Paraíso. Casas de máquinas dos elevadores foram destruídas.
A Anistia Internacional obteve ainda as imagens de câmeras de segurança que registraram duas operações antes que os equipamentos fossem destruídos, em San Antonio de los Altos. Os vídeos mostram guardas nacionais saindo dos condomínios com malas, o que coincide com as denúncias de roubo. As gravações foram interrompidas a tiros.
"Assim, a intenção de inibir que existissem registros é prova de que se atuava com a finalidade de garantir a impunidade nas atuações ilegais", segundo o relatório.
As ameaças são similares às registradas nos protestos de rua, em que as forças oficiais roubavam celulares de manifestantes e quebravam equipamentos de jornalistas.
Outra situação que se repete são prisões arbitrárias. Testemunhas dizem que os guardas entraram em casas procurando homens entre 15 e 25 anos e os capturaram sem ordem judicial ou flagrante.
A missão identificou que a maioria das operações não era denunciada porque moradores não acreditam na Justiça e temiam represálias.
Trauma
Além da violência física, há casos de intimidação psicológica. Em operação em maio, em Barquisimeto (a 365 km de Caracas), agentes chegaram dizendo que estuprariam todos os "guarimberos", forma como chavistas se referem aos opositores. Com isso, diz a organização, há moradores que sofrem de estresse pós-traumático e síndrome do pânico em reação a militares ou a militantes de vermelho, usado por chavistas.
A Anistia Internacional já havia denunciados arbitrariedades das autoridades venezuelanas em relação às prisões de manifestantes, em abril, e considerou em julho que a violência era uma tática para calar oposicionistas.
Em ambos os casos, a organização pediu ao líder chavista que interrompesse as práticas, que pararam não por força do regime, mas pela desmobilização da oposição nas ruas.
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