São Paulo A escritora inglesa Doris Lessing fazia compras, em Londres, quando a Academia Sueca anunciou ontem seu nome como a vencedora do Prêmio Nobel de Literatura deste ano. A "capacidade para transmitir a épica experiência feminina e narrar a divisão da civilização com ceticismo, paixão e força visionária" de Lessing foram fundamentais para a decisão do instituto, lida pelo secretário permanente da Academia Sueca, Horace Engdahl.
Duas horas depois da divulgação e ainda sem saber, ela chegou de táxi e se surpreendeu com sua casa rodeada de repórteres e cinegrafistas. "Pensei que estivessem gravando algum programa de televisão", disse Doris, surpresa com a premiação. "Estou há 30 anos assim. Ganhei todos os prêmios da Europa, todos eles. Fico muito feliz por vencer todos. É uma grande emoção."
Recompensa
De fato, sua longa trajetória literária foi recompensada com o Prêmio Somerset Maugham (1964), o Prêmio de Literatura Européia do Estado Austríaco (1981), o Shakespeare da Fundação FVS de Hamburgo, o Prêmio Internacional da Catalunha (1999), o David Cohen de Literatura (2001) e o Príncipe de Astúrias das Letras (2001).
Horace Engdahl reconheceu, no entanto, que essa foi uma das decisões "mais meditadas" da Academia. "Há anos analisamos sua obra e concluímos que o melhor momento para premiá-la era agora"
Aos 87 anos (faz aniversário no dia 22), Doris Lessing tornou-se a pessoa mais velha a ganhar um Nobel. Nascida na cidade persa de Kermanshah (atual Irã). Lá morava seu pai, que tinha sofrido graves amputações na 1.ª Guerra Mundial, onde trabalhava no Banco Imperial e era casado com uma ex-enfermeira.
Em 1924 a família se mudou para a Rodésia do Sul (atual Zimbábue), então colônia britânica, e se instalou em uma fazenda Foi lá que Doris passou a infância e a juventude. Ela foi educada em um colégio de freiras católicas e depois em um liceu feminino também em Salisbury (hoje Harare), até os 13 anos.
O início
Ao chegar à capital britânica, em 1949, a escritora tinha o manuscrito do seu primeiro romance, The Grass is Singing (ainda sem tradução para o português), um texto sobre a vida na África. Comprometida com o universo feminino, escreveu em 1952 a primeira obra de reflexão nesse sentido, intitulada O Sonho de Martha Quest e primeiro dos cinco livros da série Os Filhos da Violência (195159). A consagração veio em 1962 com "O Carnê Dourado", que, segundo a Academia, foi "uma obra pioneira" que "mostrou a visão no século 20 da relação homemmulher".
Os conflitos entre culturas, o comprometimento com o feminismo, a desigualdade racial e a contradição entre consciência individual e bem-estar coletivo são alguns dos temas tratados em sua produção literária, que compreende mais de 40 livros em novembro, a Companhia das Letras lança mais um, As Avós.