O ex-dirigente político chinês Bo Xilai chamou nesta sexta-feira (23) sua mulher de insana, depois de escutá-la dizer em depoimento que ele sabia da existência de dinheiro e de uma mansão na França que, segundo promotores, foi dada ao casal por um amigo empresário.
O depoimento de Gu Kailai, feito em vídeo e por escrito, contradisse diretamente a robusta defesa apresentada por Bo na quinta-feira (22), e parece encaminhá-lo para uma condenação no mais dramático julgamento na China desde o processo contra a Camarilha dos Quatro, grupo político destronado em 1976, ao final da Revolução Cultural.
"Ele devia saber tudo a esse respeito", disse Gu no vídeo mostrado no tribunal e divulgado num microblog da corte. Ela se referia à acusação de que Bo teria ciência dos subornos pagos pelo empresário Xu Ming a Gu e ao filho do casal.
"Bogu Kailai mudou, ela está insana, costuma contar mentiras", disse Bo, segundo transcrição no microblog da corte, usando o nome oficial de Gu, que raramente é citado. "Sob as circunstâncias da sua doença mental, os investigadores depositaram enorme pressão sobre ela para me expor."
"Seu depoimento, no que me diz respeito, foi sob pressão psicológica, e motivada por uma sentença reduzida", acrescentou.
Gu atualmente cumpre pena pelo homicídio do empresário britânico Neil Heywood, crime que acabou por interromper a promissora careira política de Bo, que era dirigente do Partido Comunista na região metropolitana de Chongqing e costumava ser citado como candidato a um cargo mais alto.
O empresário Xu, que também está preso, já foi amigo íntimo da família de Bo, mas também depôs contra ele na quinta-feira, segundo as transcrições. A imprensa estrangeira não foi autorizada a entrar no tribunal.
Bo, de 64 anos, é acusado de ter recebido propinas num valor equivalente a 4,4 milhões de dólares, além de ter cometido corrupção ativa e abuso de poder. Partidários dos programas sociais implementados por Bo sob inspiração maoísta dizem que ele foi derrotado em uma disputa de poder contra reformistas de tendência capitalista, expondo divisões dentro do regime comunista e da sociedade chinesa como um todo.
Na semana passada, duas fontes disseram à Reuters que Gu só deporia contra o marido se houvesse um acordo com as autoridades para proteger seu filho.
Um acordo que levasse a uma rápida condenação de Bo à prisão, poupando-o da pena de morte e sem repercussões para seu filho, seria do interesse da liderança chinesa, que deseja concluir o julgamento sem causar atritos escancarados entre partidários e críticos de Bo.
Na quinta-feira, Bo defendeu-se inflamadamente, dizendo-se vítima de uma armação política, e declarando que foi forçado a confessar os crimes em um interrogatório sob pressão. Observadores disseram que isso pode ser um jogo de cena para mostrar que o julgamento é limpo, em troca de uma sentença mais moderada.