Para o Kremlin, desavenças são resolvidas com boicotes. E esta parece ser novamente a estratégia de retaliação russa às delicadas investigações lideradas pela Holanda sobre a queda do voo MH17 da Malaysia Airlines, em 2014. A aeronave foi abatida em espaço aéreo ucraniano e, nesta semana, investigadores apontaram indícios de que ela pode ter sido derrubada por um míssil russo, reforçando a suspeita de ligação entre Moscou e o desastre que matou 298 pessoas. Imediatamente, a Rússia começou a queimar as flores importadas do país líder na produção mundial.
Outros embargos
Barreiras comerciais são imposições comuns do governo russo aos vizinhos. O Kremlin baniu os vinhos da Geórgia quando os movimentos de independência começaram no país ex-membro da União Soviética. Da mesma forma, proibiram laticínios dos países bálticos. Contra a Ucrânia, com quem Moscou trava disputa política e territorial, o chocolate foi barrado. Em todos os casos, preocupações sanitárias foram dadas como motivo. Na semana passada, no entanto, o país deu um novo passo em suas retaliações ao queimar toneladas de alimentos importados da União Europeia e Estados Unidos -- uma resposta às sanções impostas pelos ocidentais por conta da crise entre Rússia e Ucrânia.
Moscou anexou a península ucraniana da Crimeia em março do ano passado, depois de protestos de rua em Kiev derrubarem um presidente ucraniano aliado a Moscou.
Não é pouca coisa: o mercado de flores na Rússia movimenta anualmente US$ 2,5 bilhões e a maior parte é oriunda da Holanda. A queima foi explicada oficialmente como de questão sanitária. “São flores frescas e recém-cortadas da Holanda infectadas com tripes [uma espécie de inseto] do oeste da Califórnia”, explicou na televisão a chefe da agência reguladora da agricultura da Rússia, Yekaterina Slakova. As autoridades locais cogitam inclusive vetar as flores holandesas, o que representaria uma quebra de 5% nas exportações dos batavos.
Os críticos à medida de Putin não demoraram a apelidar a ação de “guerra das flores” e apontar as motivações políticas por trás da aparente preocupação agrícola. “Os russos estão procurando qualquer motivo para não deixarem nossas flores entrarem no país. Sabemos que a motivação é política”, disse ao”The Moscow Times” o porta-voz, que não quis se identificar, de uma companhia de cultivo. “Nenhuma flor será enviada à Rússia até que a situação mude. Queremos que as inspeções sejam feitas em solo holandês”, completou.
A queima das flores não preocupa apenas holandeses, mas também russos, que deverão ver os preços dispararem nos próximos meses com a escassez do produto.
Investigação
A tensão entre os países aumentou desde que holandeses assumiram a investigação da queda do voo MH17 da Malaysia Airlines, na Ucrânia, em julho de 2014. Nesta semana, os peritos indicaram que fragmentos encontrados nos destroços podem ser de um sistema de mísseis russos, o que aumenta a ligação entre o Kremlin e o acidente que vitimou 298 pessoas, na maioria holandeses. A região da queda, no leste ucraniano, é de confrontos entre rebeldes pró-Rússia e forças governamentais. Especialistas e governos ocidentais acusam os separatistas de derrubarem o avião de passageiros com um míssil fornecido pela Rússia. Moscou, por sua vez, nega qualquer responsabilidade e defende que a aeronave foi atingida por um foguete ucraniano.
Há duas semanas, a Rússia vetou uma resolução no Conselho de Segurança da ONU que criaria um tribunal para investigar criminalmente e julgar os responsáveis pelo acidente aéreo.