Policial examina local onde foram encontradas vítimas do massacre: jornalistas estão entre os mortos no sul das Filipinas| Foto: Erik de Castro/Reuters

Instabilidade

Chacina mistura clãs locais e separatismo religioso

Osny Tavares

O massacre de ao menos 46 pessoas após sequestro nas Filipinas acendeu a luz amarela no governo local e na diplomacia norte-americana. Uma possível escalada de violência está na lista de preocupações desde 2008, quando foi rompido um acordo de paz com insurgentes islâmicos e comunistas.

Os insurgentes atuam na região sul do país, onde se concentra a minoria islâmica. Um dos grupos mais influentes é o Abu Sayyaf, que tem vínculos com a organização terrorista Al-Qaeda. Seu objetivo declarado é a criação de um estado muçulmano autônomo. Para combatê-los, os Estados Unidos enviam às Filipinas ajuda econômica e militar equivalente a US$ 1,6 bilhão (R$ 2,73 bilhões) ao ano.

Mas o que a chacina revela, ao menos até agora, é uma outra característica da região: as disputas entre clãs políticos nos microestados formados pela geografia – física e política – do país.

As Filipinas são um arquipélago de 7 mil ilhas em uma área de 300 mil km² (pouco maior que o Rio Grande do Sul). As 11 maiores representam 90% do país. A isso soma-se a conturbada história do país, que sofreu três séculos de dominação espanhola e só se tornou independente em 1946. Sem conseguir controlar todo o território, o governo central deu poder aos clãs para conter os insurgentes.

Para José Carlos Brandi Aleixo, professor do departamento de Relações Internacionais da Universidade de Brasília, o passado instável do país pode ressurgir vez ou outra. "O sistema político filipino está consolidado, porém os conflitos regionais não desapareceram e às vezes ocorrem contratempos. Há regiões em que as rivalidades políticas descambam para a violência", relata.

Ele diz não acreditar, porém, que isto seja o início de um ciclo prolongado de mortes: "O ocorrido não abala o sistema político em seu conjunto. Preocupa, mas é superável. Em caso extremo, pode-se ordenar a presença de militares para garantir as eleições (de maio de 2010)".

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Ampatuan, Filipinas - A presidente das Filipinas, Glo­­ria Macapagal Arroyo, declarou estado de emergência em parte do sul do país em resposta a um massacre de dezenas de pessoas em meio ao acirramento da ri­­va­­lidade política na região a poucos meses das eleições gerais nesta nação insular asiática. On­­tem, militares descobriram nu­­ma vala os corpos de mais 22 pessoas, que se somaram aos corpos de outras 24 pessoas en­­contradas ontem no local da ma­­tança, o que elevou a 46 o nú­­mero de mortos. Ao anunciar a medida, o porta-voz de Gloria, Cerge Remonde, disse que o es­­tado de emergência abrange Ma­­guindanao, onde ocorreu o massacre na segunda-feira, e duas províncias vizinhas. A re­­gião é habitada por mais de 1,5 milhão de pessoas.

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"Há uma necessidade urgente de se impedir e suprimir a ocorrência de incidentes de violência", alega Arroyo no decreto lido pelo porta-voz.

"As Forças Armadas e a Po­­lí­­cia Nacional das Filipinas es­­tão, portanto, ordenadas a adotar as medidas previstas em lei para impedir e suprimir todos os atos de violência ilegal nas áreas men­­cionadas", prossegue a presiden­­te no decreto.

O estado de emergência autoriza o exército a impor toques de recolher, estabelecer postos de controle e realizar buscas em imóveis sem a necessidade de mandado judicial.

A crise teve início na segunda-feira, quando um grupo de dezenas de homens armados su­­postamente ligados a Andal Am­­patuan, governador de Ma­­guin­­danao, sequestraram e as­­sassinaram mais de 40 correligionários de um rival político e jornalistas que os acompanhavam.

Ontem, 22 corpos foram de­­senterrados de uma vala comum no sul das Filipinas. O superintendente de polícia Josefino Ca­­taluna disse que 11 corpos fo­­ram encontrados antes do cair da noite, pelo horário local, em uma vala comum cavada na en­­costa de um morro. Mais ce­­do, outras 11 vítimas do mesmo massacre foram encontradas no mesmo local. Na segunda-feira, 24 corpos já haviam sido recuperados.

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Os jornalistas acompanhavam assessores e seguidores de Esmael Mangudadatu, prefeito de uma cidade da província de Maguindanao, a um cartório eleitoral onde seria formalizada sua candidatura a governador nas eleições de maio de 2010.

O clã Mangudadatu tem uma antiga desavença política com a família do governador Andal Ampatuan.

Segundo a polícia, Ampatuan dispõe de um exército particular a seu serviço. Entre os mortos no massacre estão a esposa de Mangudadatu, Gena­­lyn, e duas irmãs dele.

Também ontem, o comandante da polícia de Maguinda­­nao foi exonerado e detido de­­pois de três de seus subordinados terem sido implicados no massacre por testemunhas.