O presidente Barack Obama vai enfrentar um enorme desafio nas próximas semanas. De um lado, o momento é propício para mudanças fundamentais. Há um sentimento generalizado de que os Estados Unidos atravessam uma "fase Sputnik", um período crucial para mostrar se serão capazes de encarar a concorrência internacional. Os congressistas norte-americanos trabalham em propostas ousadas. A economia do país está forte o suficiente para que os políticos pensem além da crise imediata, apesar de ainda não ter chegado ao ponto de amenizar o medo de um novo declínio.
Por outro lado, se o desejo popular por mudanças está mais forte do que nunca, as barreiras políticas que impedem as reformas também foram erguidas a níveis jamais vistos. Os democratas do Congresso desconfiam da Casa Branca e mal conseguem trabalhar com os republicanos. Os republicanos do Congresso não querem saber de acordos e mal conseguem trabalhar com os democratas. Dos dois lados, muitos estão dispostos a aguardar até 2013, quando esperam estar mais fortes. Os eleitores estão céticos em relação a todos e querem que tudo seja cortado do orçamento, exceto os programas que os beneficiam diretamente.
De forma ainda mais relevante, o presidente norte-americano deverá aproveitar o seguinte paradoxo: quanto maior a ousadia mais fácil para ele. Se ele ficar apenas nas bordas, com propostas modestas, todos se sentirão em terreno familiar. Mas, caso expanda o debate, Obama pode, de uma hora para outra, jogar todo mundo numa nova arena.
Jogo duplo
Com essa abordagem, deve-se oferecer algo que a esquerda realmente deseja. Em seguida, é preciso fazer o mesmo com a direita. Quando todos estivessem com água na boca, o governo avisaria aos congressistas em geral que eles teriam de abdicar das propostas com as quais não se preocupam muito para fazer valer aquelas sobre as quais têm interesse.
Para animar a esquerda, Obama pode sugerir medidas desenvolvimentistas. Isso envolveria mais gastos em infraestrutura, pesquisa e treinamento profissional assuntos básicos dos quais Obama sempre tratou. Mas também significaria avanços na política industrial. Pessoalmente, não acho que o governo saiba investir bem em coisas como a geração de energia limpa ou a criação de empregos no Meio-Oeste. Mas muitos liberais acreditam que isso é possível. Economistas respeitáveis como Dani Rodrik e Jeff Faux defendem o que chamam de propostas para uma política industrial inteligente. Outros dizem que os EUA têm o que aprender com China e Cingapura.
Para ganhar espaço à direita, o presidente norte-americano precisa elaborar uma reforma profunda do sistema de bem-estar social. Até agora, a maioria dos esforços para evitar a falência das contas públicas envolve o controle de gastos sem mexer na estrutura básica da rede de benefícios sociais. Entretanto, é preciso reforçar essa rede e modernizar alguns de seus aspectos.
Paul Ryan, um republicano, e Alice Rivlin, uma democrata, apresentaram um plano de reforma do Medicare (sistema de saúde público dos EUA) em que os novos inscritos do programa passariam a receber uma contribuição fixa do governo, a qual teria correção um pouco acima da inflação. Esse dinheiro seria usado para abater gastos com planos de saúde. Tal medida transformaria o Medicare num programa contributivo de fato, e geraria uma economia de centenas de bilhões de dólares. Se Obama sinalizasse interesse por propostas desse tipo, ele deixaria a direita muito contente.
Essas sugestões são o oposto da triangulação. Em vez de encontrar o meio termo em acordos de pequeno alcance, elas buscam combinar grandes ideias da direita e da esquerda. Num país polarizado como os EUA de hoje, é mais fácil fazer as mudanças com base em lados opostos do espectro político do que depender de um centro infelizmente fraco.