Meteorologistas explicam que o furacão Harvey parou na costa do Texas porque duas massas de ar com alta pressão atmosférica – grandes barreiras feitas de ar – o fizeram parar no lugar, e que não houve nenhuma corrente de alta atmosfera para ajudar a dissipá-lo.
O furacão Harvey é mais um dos desastres naturais recentes caracterizados por um alto poder de permanência, castigando regiões inteiras por vários dias ou semanas – ou até mais tempo.
Outros desastres incluem uma grande massa de ar quente que atingiu a Rússia em 2010 e uma enchente no Paquistão; a seca no Texas em 2011 e a seca na Califórnia que começou quase ao mesmo tempo e continuou até este ano; e a enchente, no ano passado, ao leste do Texas, no estado de Louisiana.
A permanência das tempestades é um grande problema, principalmente se elas aumentam sua frequência. “Isso transforma um pequeno desastre natural em uma catástrofe”, diz o meteorologista e empreendedor Paul Douglas.
Enquanto o furacão Harvey permanece parado, ele funciona como uma mangueira de incêndio que absorve a água morna do Golfo do México e da atmosfera, despejando no continente. Até o momento, meteorologistas previram que o furacão Harvey continuará a se mover no sentido norte-nordeste até quarta-feira, e até a bacia do Mississipi na sexta-feira.
Para deixar claro, a mudança climática em si não é mais um tópico a ser discutido na comunidade científica e entre os governos nacionais (com poucas exceções notórias). Entender o fenômeno é relativamente simples.
Culpa das mudanças climáticas?
As temperaturas globais estão aumentando. Há pelo menos 4% mais vapor de água no ar do que há 70 anos. Calotas polares estão derretendo. O nível do mar está subindo. Esses fenômenos são efeitos diretos do aquecimento, e os seres humanos que estão causando.
“Essa é a parte da ciência que todo mundo concorda”, diz Adam Sobel, professor de ciências naturais, física aplicada e matemática na Universidade Columbia.
O que os especialistas não concordam, no entanto, é se – ou quanto – a mudança climática antropogênica é responsável pelo desequilíbrio meteorológico que manteve o furacão Harvey no sul do Texas.
As questões que os cientistas estão fazendo sobre a permanência de tempestades não são aquelas do tipo “a mudança climática causou o furacão?”. A mudança climática não causou o furacão. Mas a água mais quente e o ar mais úmido dos dias de hoje serviram como combustível para isso, tornando-o mais intenso, e a humanidade provocou essas condições.
Em vez disso, os especialistas estão se perguntando o quanto os grandes sistemas atmosféricos “dinâmicos” podem estar mudando, pelo menos indiretamente, por causa da poluição com gases do efeito estufa causada pela humanidade.
Ação humana?
Então, uma pergunta melhor seria: “A humanidade tem alguma coisa a ver com as tempestades de verão no hemisfério norte que são impedidas de se moverem por causa das mudanças nas correntes?”. A resposta é que ainda não há evidências suficientes.
Michael Mann, professor renomado de ciência atmosférica na Universidade Estadual da Pensilvânia, publicou um artigo na segunda-feira que, entre tópicos mais conhecidos sobre furacões e aquecimento global, inclui:
“Mais tênue, mas ainda relevante, é o fato de que esse tipo de padrões climáticos de verão mais persistentes, quase ‘permanentes’, nos quais anomalias climáticas (...) permanecem no mesmo lugar por muitos dias, parecem ser acentuados pela mudança climática antropogênica.”
Em março, Mann e demais colegas publicaram um estudo no jornal Scientific Reports que mostra a relação entre eventos extremos, como a seca no Texas em 2011 e a enchente no Paquistão em 2010, e uma fase de permanência rara que às vezes ocorre em correntes de alta atmosfera em médias latitudes.
Fatores
Stefan Rahmstorf, um dos coautores do estudo e chefe de Análise de Sistemas Terrestres no Instituto Potsdam de Pesquisa sobre Impacto Climático, explicou que pode haver muitos fatores acontecendo.
De modo geral, as correntes, rios de ar de alta atmosfera que correm do oeste para o leste, perderam velocidade e ganharam ondas nos últimos verões, com desvios acentuados do norte para o sul. Esse é um fator que pode ter ajudado a manter o furacão Harvey no mesmo lugar.
Pesquisadores têm discutido desde 2012 se o aquecimento do Ártico, que está ocorrendo duas vezes mais rápido que a média mundial, estaria provocando a oscilação atmosférica, e consequentemente criando mais oportunidades para condições climáticas persistentes mais ao sul.
Em uma série de casos extremos analisados no trabalho – a seca na Califórnia, a onda de calor na Rússia em 2010 e a enchente no Paquistão – o desvio norte-sul do rio de correntes se estabiliza por certos períodos de tempo em alguns lugares, criando uma faixa intransponível em forma de ondas. Os pesquisadores procuraram por algum tipo de anomalia na circulação atmosférica depois de notar que os efeitos causados pelo aquecimento não seriam suficiente para explicar o caráter extremo de alguns desastres naturais.
Nem todo mundo está convencido seja pela oscilação geral das correntes por um aquecimento do Ártico, seja pela estabilização das ondas atmosféricas descrita por Mann, Rahmstorf e seus colegas. “Isso ainda é controverso”, diz Sobel. Até Mann, o autor principal, classificou esse padrão como “tênue”, e Rahmstorf disse que seriam necessários estudos de caso mais práticos e mais anos de observações.
Com Houston ainda em sítio e a temporada de furacões ainda forte, a ideia de mais estudos de caso é a última coisa que qualquer pessoa gostaria de considerar. E ainda assim, do mesmo modo que levou décadas para provar a mudança climática, tempo e mais estudos provavelmente mostrarão se os seres humanos causaram mais do que o aquecimento global, e de fato mudaram o sopro dos ventos.
Por que Houston não foi evacuada se a chegada de Harvey já era esperada? https://t.co/yVzHkFEV77 pic.twitter.com/9TugxDyCCl
â Ideias (@ideias_gp) August 27, 2017
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