“Nenhuma reforma das Nações Unidas é razoável: as muitas tentativas feitas até agora falharam.”| Foto: Arquivo pessoal

Com o travamento das negociações do Ocidente com o Irã sobre o programa nuclear que os aiatolás dizem ter fins pacíficos, mas EUA e Israel temem ter por objetivo construir a bomba atômica, cresce a perspectiva de uma nova rodada de sanções econômicas. Pior: um ataque israelense às usinas de enriquecimento de urânio iranianas já não soa apenas como sinopse de filme de ação. A possibilidade foi definida na semana passada pelo presidente francês Nicolas Sarkozy como desastrosa.

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O filósofo italiano de Direito Internacional Danilo Zolo teme que o ataque, se ocorrer, envolva todas as grandes potências e tome o formato de uma grande guerra. Em entrevista concedida por e-mail à Gazeta do Povo, ele critica a atuação do Conselho de Segurança das Nações Unidas em momentos como esse.

Com a crise crescente, é possível que Israel adquira apoio internacional para um ataque a instalações nucleares do Irã?

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O único apoio decisivo que Israel poderia receber viria dos EUA, mas envolveria militarmente, provavelmente, todas as grandes potências do mundo, começando pela China. Seria a terceira guerra mundial. E não parece que neste momento os EUA estejam prontos para uma aventura tão séria e trabalhosa, não só militarmente mas também economicamente.

Já um ataque do Irã contra Israel parece provável?

É impensável que um conflito armado contra Israel venha por iniciativa da Síria ou do Irã. Tra­­ta-se de Estados fraquíssimos em relação a Israel, que é a quinta potência nuclear do mundo. Ao mesmo tempo, o presidente Oba­­ma parece convencido de que o empenho militar de seu governo deva concentrar-se contra o terrorismo global, ou seja, contra o Taleban e a etnia pash­­tun, com sede no Afeganistão e Paquistão.

O Conselho de Segurança tenderia a aprovar um ataque preventivo contra o Irã?

O CS das Nações Unidas é controlado pelos EUA e portanto não se oporá a qualquer iniciativa bélica empreendida por essa superpotência – não importa o quanto fosse contrária à Carta das Nações Unidas. As Nações Unidas nas últimas décadas não têm tido a mínima função de salvaguarda da paz, ou, ao menos, de reduzir a violência militar e o massacre de milhares de inocentes. Pensemos nas guerras de agressão como contra os Bálcãs, no início dos anos 90, ou o ataque duplo ao Iraque (em 1991 e 2003), ou na guerra em curso contra o Afeganistão. As Nações Unidas são um organismo já deslegitimizado e marginalizado em relação às estratégias hegemônicas das grandes potências. Não apenas sumiu qualquer capacidade de limitar o uso da força internacional, como faltam a autoridade e o poder ne­­cessários para restaurar a soberania dos povos agredidos e oprimidos pelas grandes potências ou seus aliados. A referência pa­­ra isso são os povos afegão, iraquiano, palestino e tchetcheno.

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A tendência no Irã é o regime endurecer ou a oposição conquistar espaço?

Não creio que alguém possa fazer previsões, nem mesmo de curto prazo. Só posso dizer que a pressão político-militar que o Ocidente está fazendo sobre o governo do Irã não leva à paz nem dentro nem fora do Irã.

Uma interferência estrangeira no Irã poderia garantir direitos humanos que hoje são desrespeitados?

Não, de maneira nenhuma. Os direitos humanos não são algo que se garanta com o uso de meios de destruição em massa, como foi feito na guerra da Otan contra a Sérvia, em 1999. Nin­guém tem o direito de matar inocentes com a motivação (falsa) de "intervenção humanitária".

Que mudanças poderiam ser feitas na atuação do Conselho de Segurança para que a soberania dos países seja respeitada, ao mesmo tempo em que se defendem os direitos humanos?

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Enquanto o Conselho de Segu­­rança permanecer o que tem si­­do nos primeiros 60 anos, ne­­nhuma soberania estatal será respeitada, os direitos humanos não serão promovidos e tutelados e sobretudo o direito à vida será sistematicamente violado. O Conselho de Segurança é do­­minado por seus cinco membros permanentes. Nenhuma reforma nas Nações Unidas é razoável, as muitas tentativas feitas até agora falharam. É ingênuo pensar que uma grande potência que nutre privilégios absolutos dentro de uma instituição internacional esteja disposta a renunciar a eles pelo sentimento de generosidade em relação aos Estados mais fracos e pobres. Nunca aconteceu e nunca acontecerá.

Em seu livro La Giustizia dei Vincitori. Da Norimberga a Baghdad (A Justiça dos Ven­­cedores, de Nuremberg a Bag­­dá) o senhor critica a falta de funcionalidade dos organismos internacionais. O que falta para que eles funcionem?

Critico principalmente as Na­­ções Unidas, os tribunais penais internacionais de exceção e a Corte Penal Internacional de Haia. A estrutura centralizadora da ONU é antidemocrática e impede que se reduza minimamente a violência internacional e as guerras de agressão. Antonio Cassese [jurista italiano] disse com propriedade que a ONU tira do forno todo ano uma grande quantidade de resoluções – a Assembleia-Ge­­ral, em média 300, o Conselho de Segurança, umas 60 – que em geral viram letra morta.