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ENTREVISTA

Atentado tem um duplo efeito sobre a população

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(Foto: YouTube/Reprodução)

O cientista político Stéphane Monclaire, da Sorbonne, concedeu uma entrevista exclusiva para a Gazeta do Povo sobre a situação política na França pós-atentado. Ele falou de Paris, por telefone, e explicou a possibilidade de os atentados criarem uma divisão no país e de facilitarem a chegada ao poder da radical Marine Le Pen, da Front National. Veja abaixo:

Os fatos desta semana podem ter influência nas próximas eleições?

A eleição presidencial ainda está longe. Estamos em 2015 e a eleição presidencial é só daqui a dois anos e meio. Portanto, peso direto eu acredito que não. Mas esses eventos trágicos podem modificar os comportamentos eleitorais dos cidadãos, os graus de simpatia por alguns partidos. Os eventos atuais têm um duplo efeito sobre a população. Por um lado, existe a emoção coletiva, que é visível. Isso deve aumentar as convicções daqueles que são amantes da democracia, que são contra a islamofobia, a xenofobia. Mas, por outro lado, como os matadores são de origem árabe e justificam os assassinatos em nome de Deus, alguns cidadãos fazem amálgama entre essas pessoas e o Islã.

Quem sai ganhando com isso?

É provável que algumas pessoas vão ser ainda mais atraídas pela Front National [partido de extrema direita, comandado por Marine Le Pen]. Nós estamos numa crise econômica que já dura 40 anos, com desemprego estrutural altíssimo. Esta crise longa fragiliza a nação francesa, faz com que ela perca muitos reflexos de solidariedade, faz crescer o individualismo. E a nação francesa, para sobreviver, não precisa de discursos racistas, antissemitas, de islamofobia. Ontem [quarta, dia do atentado] parecia haver uma união do ponto de vista das emoções. Mas esta unidade é fictícia. É preciso haver um debate sobre como impedir isso de novo, esses atos violentos. Mas como fazer isso sem reduzir as garantias do Estado de Direito? Até do ponto de vista filosófico é difícil resolver isso.

Isso causa fissuras no país?

Essa situação toda acirra o jogo dos partidos, que tentam se diferenciar. A falta de unidade nacional tem a ver com essa competição política, mas tem a ver também com a imprensa. A responsabilidade da imprensa não é pífia. Frente a problemas de desigualdade, desemprego, há uma nítida tendência de etnização. Inclusive na televisão pública já houve várias matérias que tentam denunciar tal e tal categoria em função de sua cor de pele, religião, como responsável por um problema. Os árabes são responsabilizados por muita coisa. Penso especialmente num jornalista, por exemplo, Éric Zemmour, autor de um livro que está há várias semanas entre os mais vendidos na França [O Suicídio Francês]. A tese dele é cientificamente nula, mas é difícil de demonstrar a falsidade dos números dele. E ao mesmo tempo ele é convidado para falar sobre isso na tevê o tempo todo.

Como tratar isso?

Desde ontem os meios de comunicação cometem alguns erros importantes. Por exemplo, não há nada de errado em dar destaque à morte dos cartunistas, que eram conhecidos da população. Mas morreu também o policial que era encarregado de fazer a segurança do diretor de redação da Charlie Hebdo. Ele era de origem árabe, tinha nome árabe. Depois, na saída, eles mataram outro policial, que também era árabe, de origem árabe. Quer dizer: existem árabes que são parte da vida nacional, que integram a polícia nacional. Ao destacar um pouco mais isso, você mandaria uma mensagem a todos os burros da França que acham que essas pessoas não fazem parte da população.

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