Manifestantes em ato no Mali seguram cartaz que diz: "Não sou Charlie nem terrorista. Pelo fim do Charlie. Sou muçulmano. Longa vida ao Islã"| Foto: Joe Penney/Reuters

Política

Extrema-direita europeia se alimenta de discursos contra o Islã e anti-imigração

A ascensão da extrema-direita na França e em outros países europeus tem sido alimentada pelo discurso anti-imigração e anti-Islã. A líder da Frente Nacional, Marine Le Pen, retratou os atentados contra a revista Charlie Hebdo horas depois do acontecido, sugerindo que os ataques foram uma vingança contra a posição xenófoba do partido. Outros grupos de extrema-direita da Europa começam a ganhar terreno entre seus compatriotas vendendo o temor de que suas culturas estão sendo destruídas por uma civilização estranha.

Manifestação

Na Alemanha, o recém-formado grupo Europeus Patrióticos Contra a Islamização do Ocidente (Pegida, na sigla em alemão) conseguiu fazer sua maior manifestação na noite de segunda-feira, dia 12, ao juntar cerca de 40 mil pessoas em Dresden. Segundo seus organizadores, o ato foi uma homenagem às vítimas dos ataques na França.

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Para Marine Le Pen, atentados foram vingança contra xenofobia
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Bombas incendiárias e cabeças de porco jogadas em mesquitas. Mulheres que usam véu insultadas nas ruas. A internet varrida por uma onda de insultos e ameaças. Os muçulmanos europeus estão sentindo na pele as reações aos atentados contra o jornal satírico francês Charlie Hebdo.

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De acordo com Abdallah Zekri, diretor do Observatório Nacional Contra a Islamofobia, da França, desde o ataque ao jornal, em 7 de janeiro, 26 locais de culto em toda a França foram atacados por bombas incendiárias, disparos ou cabeças de porco. Uma mesquita foi atingida por quatro granadas. Foram registrados 34 insultos e ameaças.

Os três dias de terror em Paris mataram 17 pessoas e traumatizaram um continente inteiro. Autoridades correm para alertar o país sobre o risco de associar os muçulmanos aos terroristas.

"A religião desses extremistas não é o Islã, que eles estão traindo. É a barbárie", afirmou o ministro de Relações Exteriores da França, Laurent Fabius. Ele também pediu para que não seja usado o termo "islamita" para identificar os atiradores.

Em uma carta enviada à imprensa francesa, a mãe e as irmãs de Amedy Coulibaly, o homem que atacou um mercado kosher, prestaram condolências às vítimas e afirmaram que "não pode haver mistura entre esses atos odiosos e a religião muçulmana".

Ainda assim, muitos muçulmanos e especialistas acreditam ser inevitável que a desconfiança cresça depois dos ataques, mesmo que a marcha pela unidade realizada no último domingo, descrita como a maior da história francesa, tenha contado com a participação de muitos fiéis do Islã.

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Na França, os muçulmanos veem crescer as animosidades desde os ataques de 2012, quando Mohamed Merah matou três crianças numa escola judaica, um rabino e três soldados paraquedistas. Desde então, incidentes anti-Islã e antissemitas vêm aumentando na França, país que abriga as maiores comunidades de ambas as religiões do continente.

"Para os muçulmanos, é difícil viver neste clima de islamofobia, de agressões contra locais de culto", afirmou em um comunicado Dalil Boubakeur, presidente do Conselho Muçulmano na França.

O estado de alerta na França, com o envio de 10 mil soldados para as ruas, pode aprofundar a sensação de cerco na população muçulmana.

As autoridades francesas há muito alertam que o país se tornou um dos alvos preferidos dos extremistas. A França expulsou a Al-Qaeda do norte do Mali e agora ajuda os Estados Unidos a realizar ataques aéreos contra posições do grupo extremista Estado Islâmico no Iraque. Ambas as organizações fizeram ameaças à França.

Atentados também afetam islamitas de outros países

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Os atentados de Paris também tiveram efeitos em outros países. Na Holanda, grupos muçulmanos e governo mantêm contato desde o dia 9 e pretendem registrar incidentes contra muçulmanos no país. Um objeto em chamas foi jogado em uma mesquita em Vlaardingen, nos arredores de Roterdã.

"Todos estão desconfortáveis, sentindo-se ameaçados, porque estão com medo de serem estigmatizados", afirma Imade Annouri, deputado do Partido Verde da Bélgica para a região de Flandres e especialista em questões de integração.

Monitoramento

O Tell Mama, um grupo britânico que monitora atentados anti-Islã, contabilizou entre 50 e 60 casos de ameaças feitas pela internet a indivíduos específicos no fim de semana que se seguiu aos ataques de Paris.

"O volume de ameaças é inacreditável", afirmou o diretor da organização, Fiyaz Mughal. Ele teme que ameaças feitas pela internet possam se transformar em ataques reais no futuro.

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Mohamed Ali Adraoui, pesquisador do Instituto Universitário Europeu, acredita que o ódio ao Islã pode se transformar em um ataque a uma mesquita na França ou em outro lugar do continente.

"Se você consegue fazer aquilo no escritório do Charlie Hebdo, pode atacar uma mesquita", afirma.