Católicos liberais, ativistas antiaids e autoridades de saúde elogiaram neste domingo as declarações do papa Bento 16 de que o uso da camisinha pode se justificar, em alguns casos, para impedir a proliferação do vírus HIV.
"É uma vitória maravilhosa do bom senso e da razão, um passo importante para reconhecer que a camisinha pode exercer um papel vital em reduzir o impacto futuro da pandemia de HIV", disse Jon O'Brien, chefe do grupo norte-americano Católicos em Favor da Escolha.
O papa se manifestou em um livro a ser lançado na terça-feira, intitulado "Luz do Mundo: o Papa, a Igreja e os Sinais dos Tempos". Embora sejam de âmbito limitado e não mudem a proibição da contracepção decretada pela Igreja Católica, suas declarações foram vistas como um avanço.
"Trata-se de um avanço importante e positivo do Vaticano", disse o diretor executivo da Unaids, Michel Sidibe. "Esta iniciativa reconhece que o comportamento sexual responsável e o uso da camisinha têm papéis importantes na prevenção do HIV."
No livro de 219 páginas, o papa também fala com franqueza sobre a possibilidade de ele renunciar por motivo de saúde e defende o papa Pio 12, da época da 2a Guerra Mundial, contra acusações judaicas de que teria feito vista grossa para o Holocausto.
Bento diz que os escândalos de abuso sexual de menores por padres foram "um choque sem precedentes", apesar de vir acompanhando o problema havia anos, e diz que pode entender porque algumas pessoas talvez abandonem a Igreja em protesto.
Mas é a parte do livro que trata da camisinha -- uma longa entrevista concedida ao jornalista católico alemão Peter Seewald -- que marcou uma pequena abertura na postura antes rigidamente fechada da Igreja em relação ao assunto.
Bento 16 cita o uso de camisinhas por prostitutas como "primeiro passo em direção a uma moralização", embora a camisinha "não seja realmente a maneira certa de enfrentar o mal da infecção com o HIV".
O texto alemão original e as versões francesa e inglesa do livro fazem referência a prostitutos, homens, mas um trecho do livro reproduzido em italiano no jornal do Vaticano cita uma prostituta, mulher.
Alguns teólogos e líderes católicos já falaram sobre o uso limitado da camisinha para impedir a proliferação do HIV-Aids como sendo o menor de dois males, mas esta é a primeira vez em que o papa menciona essa possibilidade.
No livro, Bento 16 deixa claro que não quer enfraquecer a postura fundamental da Igreja contra o controle de natalidade artificial, questão que angustia muitos católicos.
A Igreja vem dizendo há décadas que a camisinha nem sequer faz parte da solução para o combate à Aids, embora não existisse posição formal a esse respeito em nenhum documento do Vaticano.
O falecido cardeal John O'Connor, de Nova York, descreveu o uso de camisinhas para impedir a proliferação da Aids como "a grande mentira".
Um grupo de apoio a soropositivos Act Up Paris disse: "Depois de ter declarado que a camisinha agrava a epidemia de Aids, depois de envolver-se em questões nas quais não é especialista, o papa parece finalmente estar levando em conta o princípio da realidade."
Gerard Guerin, secretário-geral do grupo francês Cristãos e Aids, disse que o papa não avançou o suficiente.
"As declarações do papa semeiam a confusão. Ele se limita a citar o caso de prostitutos homens. E o que devem fazer os casais nos quais uma das pessoas é soropositiva?", disse ele ao jornal Le Parisien.
Mais “taxa das blusinhas”? Alta do ICMS divide indústria nacional e sites estrangeiros
O que propõe o acordo UE-Mercosul, desejado por Lula e rejeitado por agricultores europeus
O ataque grotesco de Lewandowski à imunidade parlamentar
Marcos Pereira diz que anistia a réus do 8/1 não deve ser votada agora para não ser derrubada no STF