A Coreia do Norte está rapidamente mudando os rumos da cúpula entre o líder Kim Jong-un e o presidente dos EUA Donald Trump, dizendo que os Estados Unidos devem parar de insistir que o país comunista abandone "unilateralmente" seu programa nuclear.
O último alerta, entregue pelo ex-negociador nuclear norte-coreano Kim Kye Gwan na quarta-feira (16), se encaixa no padrão já conhecido de Pyongyang de aumentar as apostas nas negociações ao ameaçar parar o diálogo de paz se não conseguir o que quer.
Se a administração Trump abordar a cúpula "com sinceridade" para melhorar as relações, "receberá uma resposta merecida de nossa parte", disse Kim Kye Gwan, agora vice-ministro das Relações Exteriores, em uma declaração divulgada pela agência de notícias oficial coreana.
"No entanto, se os EUA estão tentando nos forçar a abandonar o nosso programa nuclear unilateralmente, não vamos mais nos interessar por tal diálogo e poderemos reconsiderar a nossa participação na cúpula com os Estados Unidos", ameaçou. Ele também questionou o sequenciamento de a desnuclearização vir primeiro, e depois a compensação.
Este aviso ocorreu horas depois de a ditadura norte-coreana suspender “por tempo indeterminado” a reunião com líderes da Coreia do Sul, marcada para esta quarta-feira, por causa dos exercícios militares da Coreia do Sul com os Estados Unidos, que, segundo as autoridades de Pyongyang, estavam arruinando o clima diplomático.
Analistas disseram que não ficaram surpresos com esses últimos acontecimentos.
"Os EUA e a Coreia do Sul realizam um exercício, que contém alguns elementos estratégicos de bombardeamentos. As autoridades dos EUA não parecem estar na mesma página em relação à desnuclearização e ao que é exigido da Coreia do Norte", disse Ken Gause, especialista em Coreia do Norte na CNA, uma empresa de consultoria sediada na Virgínia. "Em algum momento, a Coreia do Norte iria protestar".
O encontro entre Trump e Kim Jong-un está marcado para 12 de junho, em Cingapura, e, se ocorrer, será a primeira vez que um líder norte-coreano se reunirá com um presidente em exercício dos EUA.
Acordo estilo “Líbia 2004”
Trump e seus principais assessores, incluindo o secretário de Estado, Mike Pompeo, e o conselheiro de segurança nacional, John Bolton, disseram repetidas vezes que os Estados Unidos querem a "completa, irreversível e verificável desnuclearização da Coreia do Norte" - algo que Pyongyang já rejeitou.
Bolton, conhecido por suas visões agressivas, disse que a Coreia do Norte deve se comprometer com um desarmamento estilo "Líbia 2004". Ele era subsecretário de Estado para o controle de armas naquele ano, quando o líder líbio Muamar Kadafi concordou em desistir de seu programa nuclear em troca do alívio nas sanções impostas ao seu país.
Mas este não é um exemplo que a Coreia do Norte quer seguir. Sete anos depois de acabar com seu programa nuclear, Kadafi foi derrubado e depois brutalmente morto pelos opositores de seu regime.
A Coreia do Norte criticou Bolton e as sugestões de que eles deveriam ser tratados da mesma forma como o governo Bush lidou com a Líbia e Iraque.
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"Esta não é uma expressão da intenção de abordar a questão através do diálogo. É essencialmente a manifestação de um movimento terrivelmente sinistro para impor ao nosso estado digno o destino da Líbia ou do Iraque, que desmoronaram devido à rendição de seus direitos às grandes potências", disse Kim Kye Gwan, vice-ministro das Relações Exteriores.
"O mundo sabe muito bem que o nosso país não é nem a Líbia nem o Iraque, que enfrentaram um destino miserável", disse ele, recordando as críticas anteriores a Bolton. "Nós já esclarecemos a qualidade de Bolton no passado e não escondemos um sentimento de repugnância em relação a ele", disse o vice-ministro.
Exercícios militares
Em negociações ao longo dos anos, a Coreia do Norte tem repetidamente ameaçado sair e, de vez em quando, de fato saiu de campo, por divergências. A esse respeito, o anúncio de quarta-feira não é surpreendente e ressalta os alertas dos analistas de que a Coréia do Norte não abrirá mão de suas armas nucleares facilmente.
Durante a cúpula inter-coreana de 27 de abril, Kim Jong-un e o presidente sul-coreano Moon Jae-in concordaram em trabalhar em prol da "completa desnuclearização da Península Coreana" - o que foi visto como um código para a redução mútua de armas.
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Mais cedo nesta quarta-feira (16), a Agência Central de Notícias da Coreia do Norte havia protestado contra os exercícios militares conjuntos dos EUA e Coreia do Sul, que estão ocorrendo atualmente na metade sul da península.
A Coreia do Norte não disse nada a respeito dos exercícios em simulação de computador que ocorreram até abril, e os militares sul-coreanos e norte-americanos haviam reduzido os exercícios para evitar antagonizar o Norte.
Mas as duas semanas de exercícios militares aéreos de Washington e Seul, um evento anual chamado de Max Thunder que começou na sexta-feira e envolveu cerca de 100 aviões de guerra, incluindo bombardeiros B-52 e jatos F-15K, claramente causaram problemas.
"Os Estados Unidos também terão que empreender deliberações cuidadosas sobre o destino da planejada cúpula da Coreia do Norte-EUA, à luz deste tumulto militar provocativo conduzido em conjunto com as autoridades sul-coreanas", disse a reportagem da agência norte-coreana.
O Ministério da Defesa da Coreia do Sul disse que os exercícios do Max Thunder continuarão como o planejado, e não há desacordo sobre isso entre a Coreia do Sul e os Estados Unidos.
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Um porta-voz do Pentágono, o coronel do Exército Robert Manning III, disse na terça-feira (15) que os exercícios fazem parte do "programa anual de treinamento de rotina da aliança EUA-Coreia do Sul para manter uma base de prontidão militar".
Manning disse que o objetivo dos exercícios é aumentar a capacidade da aliança de defender a Coreia do Sul. "Embora não discutamos detalhes, a natureza defensiva desses exercícios combinados ficou clara por muitas décadas e não mudou", disse.
A Coreia do Norte, como no passado, discordou. "Este exercício dirigido a nós é um desafio flagrante à Declaração de Panmunjom e uma provocação militar intencional que vai contra o desenvolvimento político positivo na Península Coreana", disse a agência.
Ao mencionar a Declaração de Panmunjom, a Coreia do Norte estava se referindo ao acordo assinado no mês passado pelo ditador Kim e o presidente sul-coreano Moon Jae-in após a cúpula histórica entre os dois. No encontro eles concordaram em trabalhar para transformar o acordo de armistício que encerrou a Guerra da Coreia em 1953 em um tratado de paz que oficialmente encerraria a guerra, e também para perseguir a "completa desnuclearização" da Península Coreana.
Resposta dos EUA
Oficiais da administração Trump disseram que continuariam a trabalhar para a cúpula de 12 de junho entre Trump e Kim.
"Os Estados Unidos vão analisar o que a Coreia do Norte disse de forma independente e continuar a coordenação [do encontro] com nossos aliados", disse a secretária de imprensa da Casa Branca, Sarah Huckabee Sanders.
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A porta-voz do Departamento de Estado, Heather Nauert, disse que os Estados Unidos não receberam nenhum aviso sobre qualquer alteração ou cancelamento. Ela disse que o governo continua a planejar a cúpula e está confiante de que Kim entende a necessidade dos exercícios.
Ao mesmo tempo em que ameaça derrubar a cúpula com Trump, a ditadura comunista cancelou conversas com autoridades sul-coreanas que estavam marcadas para quarta-feira, menos de 24 horas depois de concordar com elas. O país havia dito que enviaria cinco altos funcionários para a vila fronteiriça de Panmunjom para reuniões com autoridades sul-coreanas, a primeira desde a cúpula inter-coreana de 27 de abril.
Eles deveriam discutir algumas das ajudas de infraestrutura que a Coreia do Sul forneceria à Coreia do Norte. O norte enviaria Ri Son Kwon, que lidera a agência norte-coreana encarregada dos intercâmbios intercoreanos, enquanto o sul enviaria altos funcionários do Ministério dos Transportes e do serviço florestal.
A decisão da Coreia do Norte de adiar unilateralmente as conversas de alto nível entre as duas Coreias "não está alinhada com o espírito da Declaração de Panmunjom e é lamentável", disse o porta-voz do Ministério da Unificação, Baik Tae-hyun, a repórteres nesta quarta-feira.
"Tal ação do Norte é inconsistente com o espírito fundamental e propósito da Declaração de Panmunjom acordado pelos líderes do Sul e do Norte em 27 de abril", disse Baik.
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