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Apoiadores do candidato Carlos Mesa, derrotado na eleição presidencial da Bolívia, se chocam com apoiadores do presidente Evo Morales
Apoiadores do candidato Carlos Mesa, derrotado na eleição presidencial da Bolívia, se chocam com apoiadores do presidente Evo Morales| Foto: AFP

Apoiadores e opositores do presidente boliviano Evo Morales voltaram às ruas nesta terça-feira (29) em mais um dia de protestos sobre os resultados da eleição que deu vitória a Morales e é questionada por suspeitas de fraude.

No sétimo dia de "greve geral por tempo indeterminado", convocada pela oposição como protesto ao controverso processo de contagem de votos, houve bloqueio de ruas e estradas e piquetes em locais comerciais que continuavam funcionando, segundo o jornal Los Tiempos.

Na segunda-feira, manifestantes da oposição construíram barricadas em La Paz e outras cidades; os partidários de Morales bloquearam estradas e queimaram fogos de artifício. Autoridades dizem que 30 pessoas ficaram feridas em confronto entre os dois lados em Santa Cruz, a maior cidade da Bolívia.

O tribunal eleitoral da Bolívia diz que o socialista Morales venceu o segundo colocado Carlos Mesa no primeiro turno da eleição da semana passada. Mesa, ex-presidente que uniu partidos da oposição de esquerda e direita contra Morales, o acusou de fraude eleitoral.

Morales, que lidera a nação há 13 anos, alertou sobre uma "tentativa de golpe" para privá-lo de um quarto mandato. Mas ele também convidou a Organização dos Estados Americanos (OEA), o Brasil, os Estados Unidos, Mesa e outros para auditar a eleição. Se a OEA encontrar evidências de fraude, disse Morales, ele concordará com um segundo turno.

Os governos do Brasil e de outros países não reconheceram o resultado até que a auditoria seja feita. Enquanto isso, Mesa diz que a auditoria pode ser útil, mas não deve ser considerada a palavra final sobre a votação. Os manifestantes da oposição não estão mais exigindo um segundo turno - eles querem uma nova eleição.

Mesa disse nesta terça-feira que a oposição continuará se mobilizando "até alcançarmos um caminho que leve à saída de Evo Morales da presidência em janeiro de 2020".

Morales alertou que, se os protestos continuassem, seus partidários de zonas rurais cercariam as cidades da Bolívia "para fazê-los respeitar [as eleições] vamos ver se ele aguentam".

Os acontecimentos, de certa forma, se assemelham à sequência de eventos que levaram ao impasse atual na Venezuela. O ditador venezuelano Nicolás Maduro, aliado de Morales, reivindicou vitória no ano passado em eleições amplamente consideradas fraudulentas. Brasil, Estados Unidos e vários outros países não reconheceram Maduro e declararam o líder da oposição Juan Guaidó como líder legítimo da Venezuela. Os EUA ainda impuseram sanções econômicas à nação.

Uma diferença fundamental é que Morales, que foi presidente durante um crescimento histórico em um dos países mais pobres da região, permanece popular na Bolívia. Maduro, herdeiro de Hugo Chávez na Venezuela, tem pouco apoio em seu país.

"Morales ainda tem popularidade e força, e ainda é possível que ele concorde em ir para o segundo turno", disse o cientista político do Amherst College, Javier Corrales. "Ele ainda pode mobilizar sua base e tem uma boa chance".

Morales, o primeiro presidente indígena da Bolívia, adotou uma abordagem mais pragmática em política econômica e externa, mantendo boas relações com a maior parte do Ocidente e mantendo o país aberto a investimentos estrangeiros.

Apuração controversa

O tribunal eleitoral diz que ele derrotou Mesa com mais de 10 pontos percentuais na votação da semana passada, o suficiente para evitar um segundo turno em dezembro. Mas isso ocorreu depois de uma interrupção inexplicável na publicação dos resultados que durou quase 24 horas.

Os resultados preliminares após o fechamento das urnas em 20 de outubro sugeriam que a disputa estava indo para um segundo turno, o qual Mesa tinha uma grande chance de vencer, segundo analistas. Quando novos resultados foram publicados no dia seguinte, a contagem tinha oscilado a favor de Morales.

A própria candidatura de Morales era controversa: depois de perder um referendo em 2016 que decidiu que ele não poderia ultrapassar os limites de mandato, ele garantiu uma decisão judicial que lhe permitiu concorrer novamente.

Manifestantes em La Paz e outras cidades na semana passada incendiaram, saquearam os escritórios eleitorais e derrubaram uma estátua de Chávez.

As autoridades bolivianas dizem que a auditoria da OEA deve começar nos próximos dias. Brasil, Argentina, Colômbia e Estados Unidos se abstiveram de reconhecer Morales e não o farão se a OEA "não puder verificar os resultados do primeiro turno", disseram os países em comunicado conjunto.

"Estamos profundamente preocupados com as irregularidades no processo de contagem de votos das eleições da Bolívia em 20 de outubro", tuitou o secretário de Estado americano Mike Pompeo no domingo. "Apelamos à Bolívia para restaurar a integridade eleitoral, procedendo a um segundo turno de eleições livres, justas, transparentes e confiáveis com os dois principais vencedores".

A Organização das Nações Unidas (ONU) apoiou a auditoria da OEA; a União Europeia pediu um segundo turno.

Ainda não foram anunciados observadores para a auditoria. Morales mencionou os Estados Unidos, Argentina, Brasil e Colômbia. Mas manifestantes da oposição dizem que não estarão vinculados pelos resultados.

"As pessoas veem a auditoria da OEA apenas como um slogan", disse Pablo Solón, ex-embaixador de Morales que se voltou contra o presidente, ao Washington Post. "Ninguém nem entende como isso funciona ou quando começará ou terminará."

O Coordenador Nacional de Defesa da Democracia, um comitê de partidos da oposição e grupos da sociedade civil, disse que um segundo turno não interromperá o que chamou de "mãe de todas as batalhas" para pressionar por uma nova eleição.

Mesa, falando a jornalistas em Santa Cruz na terça-feira, disse que "novas eleições seriam o ideal", mas que a oposição está "aberta a todas as opções".

Solón, o embaixador que virou crítico, disse que a estratégia do governo era clara. "Eles estão instigando o medo fazendo com que seus apoiadores entrem em confronto com os manifestantes, enquanto eles também apostam que a força do movimento se desgastará nas próximas semanas".

"Mas, por enquanto, o governo não está nem de perto conseguindo controlar o caos", disse ele. "O maior desafio para Evo é que a magnitude desse movimento de protesto é simplesmente sem precedentes".

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