
Entrevista com o ex-general paraguaio, líder da Unace Lino Oviedo
Assunção - Mesmo derrotado nas eleições presidenciais, o ex-general Lino César Oviedo, de 64 anos, líder do partido União Nacional de Cidadãos Éticos (Unace), voltou à cena política paraguaia. Depois de ter sido apontado como um dos líderes de uma conspiração para derrubar o presidente Fernando Lugo, no início do mês, ele também está sendo acusado de receber terras distribuídas ilegalmente na ditadura de Alfredo Stroessner (19541989).
Apesar de não possuir um cargo político, Oviedo continua influente nos rumos do país. Seu partido é o terceiro maior do Paraguai e o fiel da balança no Congresso. Em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo, concedida na última sexta-feira, em sua residência, em Assunção, ele defendeu a necessidade de o Paraguai respeitar leis e tratados, inclusive o de Itaipu. Ele não vê no governo brasileiro disposição para rever o acordo. O ex-general também criticou a interferência do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, no governo de Lugo, que, segundo ele, é "total".
Gazeta do Povo Logo após a posse do presidente Fernando Lugo, no dia 15 de agosto, o senhor foi acusado de tentativa de golpe de estado. O que aconteceu?
Lino Oviedo Eu disse a Lugo e toda sua equipe para que usem todos os meios de que disponham para me denunciar. Estou à disposição da Justiça. Isso são formas de difundir ao povo informações que não são verdadeiras. Ao invés de eles se preocuparem com a fome, fontes de trabalho e com os camponeses, criam fato de um suposto golpe do estado. É a mesma coisa na Bolívia. O que existe é um problema social e a instabilidade política prejudica o país.
De onde partiram as acusações de golpe?
Eu havia anunciado que o governo fez um golpe de estado no parlamento, nomeando senadores que não foram eleitos e nem proclamados. Nomearam substitutos de senadores que não correspondiam. Violaram o regulamento do parlamento, leis eleitorais e a própria Constituição nacional. E eu falei que isso era um golpe.
Qual seria o interesse das pessoas em prejudicá-lo no atual momento político, já que o senhor não ocupa cargo algum e foi derrotado nas eleições?
Eu sou contra a corrupção e as pessoas que não querem respeitar as regras do jogo. Quem vai vir para o Paraguai se não há garantias jurídicas e segurança? Nós temos que respeitar as regras do jogo que estabelece a Constituição nacional, os Tratados de Itaipu e Yacyreta (hidrelétrica com a Argentina).
Lugo vai se encontrar com Lula em Brasília, o senhor acha que ele tem chances de conseguir reverter o Tratado de Itaipu?
O Jorge Samek (diretor brasileiro de Itaipu), o Celso Amorim (ministro das Relações Exteriores), o Marco Aurélio (Garcia, assessor especial da Presidência) e até o Senado brasileiro já se pronunciaram contra a mudança do tratado. Sem a menor dúvida, o Brasil vai manter a posição.
Como está a relação da Unace com Lugo?
Nunca deixamos de apoiá-lo. Os que não o apóiam são os que estão ao seu lado. Eu não estou de acordo com a equipe ao redor de Lugo: o Senador Tito Saguier, o Ministro do Interior, Rafael Filizzola, e o ministro da Indústria e Comércio, Blas lIano. Eles são os conspiradores e até hoje não apresentaram provas contra mim.
Recentemente, o Instituto Nacional de Desenvolvimento Rural e da Terra (Indert) divulgou uma lista com mais de 3 mil nomes de pessoas beneficiadas ilegalmente com terras doadas pelo ditador Alfredo Stroessner. O nome do senhor está nessa lista...
Eu nunca tive terras do Estado paraguaio. Eles fazem isso por perseguição política. Em 1977, figura meu nome com 20 hectares. Eu gostaria que eles dissessem que a terra é minha para eu doar a qualquer campesino e organização. Eu faria uma doação imediata.
A medida do Indert é uma das ações para fazer uma reforma agrária no país que passa por uma onda de invasões de terra. Os brasiguaios, por exemplo, estão tendo terras invadidas e pedem socorro. Como o senhor vê esta situação?
Muitos brasiguaios já são paraguaios. Vieram de boa-fé, trouxeram tecnologia, capital, famílias. Assim como todos os países do mundo cresceram com imigrantes, o Paraguai também. Nosso partido não irá apoiar nenhuma coisa que viole a Constituição. A ocupação de terra não é uma forma de solucionar os problemas. Isso não é uma maneira de ter terra. O governo tem várias maneiras de titular e oferecer terra às pessoas. O Paraguai tem 406 mil quilômetros quadrados e 6 milhões de habitantes. Aqui não pode faltar terra. Em Taiwan não falta terra, e o país é seis vezes menor e tem 10 vezes mais habitantes do que aqui. Nós temos parlamentares que vão impedir que se ocupem terras privadas, legalmente estabelecidas.
Se o senhor fosse presidente hoje, o que faria em relação ao conflito de terras?
Imediatamente tomaria duas medidas: conversar com campesinos e agroprodutores. Vou entregar um projeto feito por todos os agroprodutores de seis estados. Vou apresentar no parlamento e para o presidente Lugo para que ele possa saber que isso tem solução, e também que há pessoas conscientes dos problemas sócio-econômicos do país. É preciso conversar com as partes e não fomentar os conflitos para dividir mais a sociedade paraguaia.
Qual é a idéia do projeto?
O projeto, chamado "Conselho Nacional Para a Paz Social" começou a ser feito antes mesmo de o Lugo assumir e agora está completo. Serão apresentadas propostas para solucionar o desemprego e a demanda por terra. Inclusive pedimos ao governador do Paraná, Roberto Requião, experiências baseadas em um projeto da cidade de Chopinzinho e também nos fundamentamos na criação de gado do Mato Grosso do Sul. Tenho muito boa relação com o governador André Pucinelli (MS), Blairo Maggi (MT), com prefeitos paranaenses e também com cooperativas brasileiras. Temos que trazer experiências que deram bons resultados. O projeto foi feito por agroprodutores e técnicos brasileiros para os campesinos sem-terra. Às vezes os campesinos têm terra, mas estão abandonados, eles não têm infra-estrutura. O que vão fazer com enxada? Não têm educação, maquinário. Entre as ações está a criação de um sistema informatizado para o meio rural, um Conselho Nacional para a Paz Social e capacitação técnica aos agricultores.
Mas o governo alega que está dialogando com campesinos e produtores?
Eu não escutei isso. Eu que falei com todos eles.
O que faltou para o senhor ganhar as eleições?
É o destino. Na democracia o povo é soberano. Me roubaram 41% das mesas com o dinheiro e falam que foi de Hugo Chavéz. Pode ser verdade.
Na opinião do senhor, Chávez está tendo influência no governo paraguaio?
Total. A mídia até foi impedida de saber o que um chanceler da Venezuela esteve fazendo aqui. Isso nunca aconteceu no país. Amanhã vão querer fazer como na Bolívia. Os helicópteros que Evo Morales usa são da Força Aérea da Venezuela.
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