Três semanas depois da destruição provocada pelo Katrina, os moradores de Houston temem ver a cidade do Texas tomada pelo caos que se seguiu à passagem do furacão por Nova Orleans, na Louisiana. A poucas horas da chegada do Rita ao território texano, muitos ainda tentam fuigr para regiões mais seguras. Entretanto milhares de outros decidiram se abrigar em Houston, temendo abandonar as casas à ação de possíveis saqueadores, contou ao GLOBO ONLINE por telefone a carioca Camila Cardoso, de 23 anos, que mora há um mês na cidade, que recebeu muitos desabrigados do Katrina.
- Tenho medo da violência, de saques, estupros, assalto depois da passagem do furacão. Isso aconteceu em Nova Orleans, acho que pode acontecer aqui também. Todos estão muito temerosos, esperando o pior. Resolvi vir para o abrigo pois aqui me sinto mais segura - disse a engenheira, que faz doutorado na Rice University, onde está abrigada. - A minha orientadora comprou até uma arma esta semana para se proteger. Ela está desesperada, tem uma casa enorme, com vidros grandes, e acha que podem invadi-la. Mas não sabe atirar.
Antes de optar por ficar em Houston, Camila, com outras duas brasileiras e uma argentina, pegou a estrada na quinta-feira rumo à Flórida, onde tem parentes. Depois de passar cinco horas na rodovia e só andar cerca de 90 quilômetros, o grupo resolveu regressar. Em seguida, elas tentaram seguir pela Interestadual 10 ao norte da Louisiana, mas o plano foi abortado.
- Estavam ameaçando abrir a pista em um só sentido, aí não teríamos como voltar. Ficamos com medo de ficar paradas na estrada sem combustível e então voltamos. Vi vários carros com crianças e idosos estacionados sem gasolina. Vi também pessoas passando mal. Muitos tiveram que dormir no carro, pois não tinham para onde ir - relatou Camila.
Em outro ponto de Houston, a professora Marisa Colbert, de 42 anos, ficou desconfiada com o céu azul e a brisa suave da manhã na cidade. Nada combinava com uma localidade à espera de um furacão. Mas à sua volta - janelas das casas protegidas por placas de madeira, milhares de carros em uma fuga vagarosa pelas rodovias congestionadas que rumam ao norte, prateleiras dos supermercados vazias - tudo fazia lembrar o que estava por vir. Em poucas horas, o tempo mudou, com as primeiras rajadas de vento.
- Sempre vem a calmaria antes da tempestade - disse Marisa, que se prepara para enfrentar o seu primeiro furacão nos EUA, para onde se mudou há três anos. - Houve uma mudança na rota do furacão e se prevê que agora toque a terra na divisa entre o Texas e a Louisiana. Entrando no território, a tendência é que a velocidade do furacão diminua e não deverá ser suficiente para levar os telhados das casas da região em que moro (West Thase). Nossa preocupação era que o Rita batesse de frente em Houston. Ainda bem que parece que isso não vai acontecer.
Marisa acredita estar segura na casa em que vive com o marido, americano. Mas teme pela sorte de outros moradores, em residências mais vulneráveis:
- Muitas casas no Sul dos EUA são como uma caixinha de fósforo, parecem cenográficas. É só madeira pregada em madeira. Elas não têm a estrutura de vigas e as fundações que nós temos no Brasil. Por isso as casas não resistiram e houve aquela tragédia em Nova Orleans. Deveria haver um tipo de construção para cada área, observando a vulnerabilidade e o que a força da natureza pode proporcionar.
Grávida de sete meses, Alessandra Commans, de 21 anos, também acredita que a casa em que vive com o marido em Woodlands, a cerca de 30 quilômetros do centro de Houston, resistirá à força dos ventos.
- Meu esposo, que é corretor de imóveis, disse que a casa é preparada para suportar o impacto. Os moradores estão dizendo que nunca viram algi tão poderoso ameaçando a cidade. Esperamos sair ilesos, mas estamos nos preparando para o pior possível - declarou a fisioterapeuta, que estocou água, alimentos e combustível em sua casa, localizada em uma região mais alta de Houston.
Já a jornalista Marilia Marques, de 46 anos, resolveu deixar tudo para trás em Houston e foi para a casa de um amigo em Alvin, 45 quilômetros a sudoeste da cidade em que mora.
- Pelo que falam, teremos aqui ventos com força de furacão de categoria 1 ou 2, com chuvas torrenciais até terça-feira. Mas isso não diminui minha apreensão. Estou em pânico, tomando remédio para poder dormir. Cheguei a pensar em sair daqui, mas estar nas estradas poderia ser bem pior - desabafou a paulista de Santos. - Abriguei-me numa casa de 150 anos que já resistiu a alguns furacões e que acho que consegue resistir ao que está vindo. Mas, como tudo isso é novo para mim, não tem como ficar com medo - emendou.
BRASILEIRO ESCAPOU A TEMPO - O biólogo brasileiro Guarani de Hollanda Cavalcanti viveu momentos de tensão antes de conseguir sair de Houston, na noite de quinta-feira, em um dos últimos vôos que deixaram a cidade antes de o aeroporto ser fechado devido à passagem do furacão Rita. O carioca estava nos Estados Unidos a trabalho, contou que na tarde de quinta-feira não havia mais lojas abertas para a compra de comida e água nem táxis na cidade.
Segundo ele, o trajeto até o aeroporto, normalmente feito em meia hora, estava demorando até 9 horas devido aos congestionamentos causados pelas pessoas que tentavam deixar o local, que está na rota do furacão. Guarani tentou conseguir um táxi desde as 6 horas da manhã de quinta-feira e, no início da tarde, chegou a se preparar para esperar no hotel a passagem do furacão, mas conseguiu uma carona com outros brasileiros que tinham alugado um carro na última hora.
Na preparação para enfrentar o furacão, Guarani não conseguiu mais encontrar lojas abertas na cidade e contou com a sorte para conseguir armazenar no hotel seis latas de refrigerante e duas pizzas. O biólogo contou que comprou as pizzas de um entregador que perambulava pela rua sem encontrar os clientes que tinham feito o pedido.
Os brasileiros ainda tiveram de pegar um caminho alternativo para driblar o engarrafamento da estrada principal de acesso ao aeroporto e chegar a tempo de pegar o vôo para o Brasil.
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