Há mais de dois anos, os britânicos votaram a favor da saída do país da União Europeia. Foram 52% votos a favor do processo que ficou conhecido como Brexit. Respeitando este resultado, a primeira-ministra do Reino Unido, Theresa May, invocou o artigo 50 do Tratado da União Europeia e formalmente deu início ao divórcio, que está programado para acontecer 29 de março. Mas a pouco mais de três meses desta data, uma questão permanece em aberto: o Reino Unido realmente deixará a UE?
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Um elemento que surgiu nesta segunda-feira (10) torna a resposta ainda mais complexa - e imprevisível. O Tribunal Europeu de Justiça decidiu que o Reino Unido pode interromper unilateralmente seu processo de desligamento da União Europeia até a data em que, segundo o script atual, ele deve se materializar.
A sentença dá novo fôlego ao movimento anti-Brexit, que defende a organização de uma nova consulta popular caso o plano de May seja rechaçado pelo parlamento britânico - e há fortes indícios de que isso aconteça. O acordo para o divórcio, já aprovado pelos 27 líderes de países-membros da União Europeia, seria apreciado nesta terça-feira (11) pelos parlamentares britânicos, mas May resolveu adiar a votação, já prevendo uma derrota.
Ela disse a seu gabinete que viajará a Bruxelas para conversas com líderes da UE na quinta-feira para pedir melhores condições para o Reino Unido. Uma nova data para a votação no parlamento britânico não foi definida, mas o prazo máximo, segundo a primeira-ministra, será 21 de janeiro.
O que divide o parlamento britânico
O plano para a saída do Reino Unido da União Europeia, com suas 585 páginas, provou ser politicamente tóxico em Westminster. Ele não agradou nem os defensores mais árduos do Brexit e nem os anti-Brexit, mesmo com a insistência de May e da União Europeia de que o acordo apresentado é o melhor possível, dados os limites demarcados pelos dois lados da mesa de negociações.
Para a ala “brexiters”, a questão mais delicada é a incerteza das disposições do acordo sobre a fronteira entre a Irlanda do Norte (território britânico) e a Irlanda (que pertence à UE). O acordo de May com a União Europeia prevê o “backstop”, um mecanismo para garantir que não haverá uma fronteira rígida entre as duas nações durante um período de transição de 21 meses. Caso não haja entendimento sobre a questão ao fim deste prazo, a Irlanda do Norte continuaria fazendo parte da União Aduaneira da UE, o que desagrada os defensores do Brexit, porque deixaria o Reino Unido preso às leis comerciais da UE, forçando-o a respeitar muitos regulamentos e inviabilizando-o de fechar acordos comerciais com outros países. Uma fronteira rígida entre as duas nações, entretanto, poderia comprometer o processo de paz da Irlanda do Norte e, provavelmente, ter um impacto significativo no comércio.
Ativistas pró-UE dizem que o acordo apresentado pela primeira-ministra resultaria em grandes prejuízos à economia britânica e tiraria a voz do Reino Unido na tomada de decisões na Europa, ao mesmo tempo em que oferece pouco benefício ao país.
May adiou a votação do seu plano no parlamento britânico justamente para buscar condições que agradem a ala conservadora de seu partido quanto à questão da fronteira entre as Irlandas, embora o bloco tenha deixado claro que não reabrirá as negociações. Mas ao fazer isso, novamente ela voltou a ser alvo de críticas entre os eurocéticos, que a acusam de postergar a apreciação do acordo até o último minuto para que só existam duas opções: o plano de May ou uma saída da União Europeia sem acordo nenhum, o que seria traumático para a economia britânica, que voltaria a se relacionar com outros países do bloco de acordo com as regras da Organização Mundial do Comércio.
Os efeitos da decisão da justiça europeia
O governo britânico disse que o veredito do Tribunal Europeu de Justiça não tem efeito prático, porque, seja como for, o Reino Unido vai deixar a União Europeia daqui a pouco mais do que cem dias. Mas curiosamente, o posicionamento do tribunal pode acabar ajudando May, que sempre martelou que seu país não voltaria às urnas.
Ao abrir a porta para outro plebiscito, a sentença da corte cria uma saia justa para os parlamentares que desejam a separação da Europa, mas não nos termos obtidos pela primeira-ministra — que julgam ser uma afronta à soberania britânica. Essa ala de "brexiters" pode se ver constrangida a endossar o acordo de May, por medo de que uma nova consulta termine com resultado diferente da de 2016.
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Na semana passada, ao aprovarem uma resolução que aumentava seus poderes sobre a condução do Brexit caso o acordo desenhado pelo governo fosse reprovado, os legisladores britânicos já tinham dado um primeiro alento ao grupo que deseja suspender o divórcio.
A ação foi impetrada na Justiça da Escócia em 2017 por oito parlamentares locais favoráveis à manutenção na UE. Um deles, Alyn Smith, deputado no Parlamento Europeu, classificou a sentença como "dinamite".
"Isso manda uma mensagem clara aos parlamentares britânicos: há um jeito de sair desta bagunça, uma luz no fim do túnel para a economia, os empregos e para a permanência britânica no palco global. Agora depende deles".
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