Sindicalistas brigaram com pedradas perto do novo mausoléu construído para o presidente argentino Juan Domingo Perón (1895-1974), perturbando o sepultamento do corpo dele em Buenos Aires.
A violência aconteceu horas depois de milhares de argentinos lotarem as ruas, com lágrimas nos olhos, para homenagear Perón, cujo caixão era levado ao novo mausoléu para o terceiro enterro desde sua morte, em 1974.
Dezenas de sindicalistas trocaram pedradas, e a TV mostrou pelo menos um homem dando tiros durante a briga, aparentemente provocadas por uma disputa pelos melhores lugares para assistir à cerimônia, na antiga casa de campo de Perón, nos arredores da capital.
Policiais com capacetes e escudos montaram guarda no portão de madeira da propriedade depois de restaurarem a ordem, mas o local continuou fechado.
Um funcionário do governo disse que o presidente Néstor Kirchner cancelou sua presença no enterro depois da briga, iniciada enquanto o cortejo passava por uma avenida em direção ao novo túmulo, que custou US$ 1,3 milhão.
O caixão acabou chegando, sob forte segurança, e a cerimônia prosseguiu. Ainda não há informações sobre feridos.
Centenas de argentinos haviam abandonado a chácara no subúrbio de San Vicente antes da hora marcada para o enterro.
A violência de terça-feira representa mais um capítulo dramático na saga do cadáver de Perón, que já foi profanado e teve as mãos serradas por ladrões. Além disso, uma mulher há anos tenta provar que é filha ilegítima do presidente.
Preocupado com a devoção popular a Perón, o regime militar argentino da década de 1970 determinou que o caixão fosse retirado de um mausoléu presidencial e levado para a cripta da família, mais modesta.
As autoridades disseram que queriam transferir os restos para um local mais adequado a uma das principais figuras da história argentina.
- Espero ver outro patriota como ele um dia - disse Americo Armada, 75 anos, que esperava para ver o caixão.
Gritos de "Viva Perón" foram ouvidos quando a comitiva do marido de Evita parou diante da sede da maior central sindical do país, a caminho do mausoléu.
As cerimônias da terça-feira são recheadas de simbolismo político e de algumas alusões à eleição presidencial de 2007. Décadas após a morte do presidente, o Partido Peronista (oficialmente chamado Justicialista) continua sendo o maior do país.
Ex-coronel do Exército, Perón foi eleito presidente pela primeira vez em 1946, um ano depois de ser preso por liderar uma tentativa de golpe militar -- foi solto graças a enormes manifestações de seus seguidores.
Ao lado da esfuziante e idolatrada Evita, Perón nacionalizou as ferrovias e o setor elétrico e ampliou benefícios trabalhistas, tornando-se um herói da classe operária local. Foi reeleito em 1951.
Mas também foi criticado como autoritário e, em meio a turbulências econômicas, foi derrubado por um golpe em 1955, três anos após a morte de Evita.
Após passar 18 anos exilado na Espanha, Perón voltou em 1971. Dois anos depois, foi eleito presidente pela terceira vez, tendo a nova esposa, Isabel, como vice. Morreu dois anos depois, e Isabel ocupou a Presidência até ser derrubada pelos militares, em 1976.
Em 1987, ladrões invadiram a cripta de Perón e usaram uma serra elétrica para tirar suas mãos. O caso continua sendo um dos maiores mistérios do país.
As autoridades argentinas passaram anos tentando transferir o corpo de Perón, mas enfrentaram obstáculos jurídicos, inclusive a contestação de uma mulher que há mais de uma década tenta provar ser a filha única dele.
Um acordo autorizando legistas a extraírem tecidos do cadáver para um possível exame de DNA, na semana passada, permitiu que a transferência se concretizasse.