Durante a campanha eleitoral, Joe Biden prometeu reverter várias políticas de Donald Trump caso fosse eleito – desde aumentar o número de solicitações de asilos de imigrantes ilegais até reinserir o país em organizações e acordos internacionais que Trump abandonou nos últimos quatro anos. Mas o mesmo não pode ser dito sobre as políticas comerciais.
A agenda econômica de Biden tem a sua própria versão do America First do republicano, com propostas muito mais protecionistas do que as que integraram as gestões democratas anteriores, geralmente baseadas na defesa do livre comércio.
Em seu plano para “garantir que o futuro seja feito em toda a América”, duas propostas protecionistas se destacam. A primeira delas é o Buy American, que promete “garantir que o dinheiro dos impostos americanos não acabe indo parar em outros países”.
“Buy American” é o nome de uma lei americana de 1933, criada para incentivar a indústria do país após a Grande Depressão de 1929. O democrata, porém, afirma que é preciso fechar brechas na lei que resultam em “dezenas de bilhões de dólares a cada ano que apoiam empregos estrangeiros e estimulam indústrias estrangeiras”. Sua plataforma cita, como exemplo, que em 2018 o Departamento de Defesa americano gastou US$ 3 bilhões em contratos com empresas estrangeiras, em detrimento da indústria local de aço e ferro.
Para “consertar” isso, Biden prometeu tornar mais rígidas as regras para que as empresas possam etiquetar seus produtos como “Made in America”, limitar as exceções para que as agências do governo americano possam contornar a lei “Buy American” e investir US$ 400 bilhões em compras federais de produtos feitos por trabalhadores americanos – em projetos de infraestrutura e de desenvolvimento da indústria de energia limpa americana.
Segundo Edward Alden, professor e autor de Failure to Adjust: How Americans Got Left Behind in the Global Economy, o problema é que o que Biden chama de brechas “inclui compromissos de longa data feitos pelos Estados Unidos e outros países sob as regras da OMC”, além de obrigações do país em acordos comerciais, principalmente com os vizinhos Canadá e México. As medidas também podem encarecer produtos para os consumidores americanos.
Ainda dentro deste programa, o democrata quer reforçar a Lei Jones, que prevê que apenas os navios de bandeira dos EUA transportem carga entre os portos do país. Segundo seu plano, isso resultará em uma demanda adicional por navios de fabricação americana e marinheiros mercantes dos EUA. Na prática, porém, a lei de mais de 100 anos já mostrou seus revezes, como o custo maior de operação logística e um grande peso sobre a economia de Porto Rico, já que estabelece taxas e impostos para navios estrangeiros que atraquem no território, encarecendo os insumos que chegam na ilha.
O “Buy American” foi desenhado para reconquistar os votos dos trabalhadores da indústria, especialmente no “Cinturão da Ferrugem”, uma área que abrange partes de Wisconsin, Pensilvânia, Michigan, Ohio, Indiana e Iowa, estados onde Trump venceu na eleição presidencial de quatro anos atrás. Aparentemente funcionou, pois os democratas reconquistaram Wisconsin, Michigan e Pensilvânia. No plano, também há promessas de criação de empregos de qualidade para a classe média, com salários melhores e mais facilidade para a criação de sindicatos.
Cadeia de suprimentos
A segunda proposta protecionista que se destaca na agenda do democrata foi batizada de “Supply America”. Ela tem o objetivo de levar de volta aos Estados Unidos cadeias de suprimentos cruciais que hoje estão no exterior para o que o país não fique dependente da China e de outros países para a produção de bens essenciais durante uma crise. Esses produtos essenciais variam de equipamentos e suprimentos médicos a semicondutores e tecnologia de comunicações.
Segundo Alden, essa postura poderia levar a uma escalada da guerra comercial dos Estados Unidos com a China e com aliados, mas é algo que democratas, assim como republicanos, parecem estar dispostos a levar adiante. Isso porque a escassez de medicamentos e equipamentos de proteção individual para trabalhadores da saúde surgiu como uma fragilidade dos Estados Unidos durante a pandemia de Covid-19, e a proposta de nacionalizar cadeias de produção críticas ganhou apoio bipartidário. “Um americano que está doente em uma pandemia não deve depender de medicamentos da China ou respiradores mecânicos que Trump comprou da Rússia”, afirmou Biden em seu plano de governo.
Como constatou o jornal Washington Post em editorial em julho deste ano, o centro da política dos EUA está se afastando da defesa do livre comércio para promover uma política industrial liderada pelo governo: Biden “está ajustando suas posições políticas anteriores para dar conta do clima populista cético em relação ao comércio que impulsionou Trump”.
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